Há 30 Anos, a Vitória na Derrota das “Diretas Já”

A mudança da “distensão’ de Geisel para a “abertura” de Figueiredo, que tomará posse em 15 de março de 1979, não foi resultado de doações democráticas da Ditadura. Pelo contrário: foi desdobramento da resistência e da luta pelo retorno da democracia, resultando, num primeiro momento, no decreto que pôs fim ao bipartidarismo, ainda que a Ditadura tenha impedido a legalidade dos partidos comunistas, como o PCdoB.

Em 27 de novembro de 1983, ocorreu o primeiro comício pró-diretas, reunindo 10 mil pessoas no Estádio do Pacaembu, em São Paulo. Em 12 de janeiro do ano seguinte, em um comício que reuniu sessenta mil em Curitiba, oficialmente iniciou a Campanha das “Diretas-Já” e o uso do amarelo como sua cor-símbolo. A reação da Ditadura foi o lançamento da candidatura a presidente de Paulo Maluf. A resposta da oposição foi o comício que reuniu trezentas mil pessoas, na Praça da Sé, em São Paulo, em 25 de janeiro. São Paulo dará exemplo para o resto do Brasil. Outro comício pró-Diretas, reuniu duzentas e cinquenta mil pessoas em Belo Horizonte, em 2 de fevereiro; em 21 de março, uma passeata de trezentos mil se realizará no Rio de Janeiro; uma prévia para o 10 de abril, quando o comício de um milhão e duzentas mil pessoas pelas defenderão as “Diretas Já”, na Candelária; em 12 de abril, aconteceu o comício pró-Diretas, em Goiânia, reunindo duzentas e cinquenta mil pessoas; mas, o maior deles ainda viriam no mesmo mês: no dia 16, um milhão e setecentas mil pessoas se reuniram no Anhangabaú, em São Paulo. Era o auge do Movimento. Tanto que, dois dias depois, o ditador Figueiredo decretou Estado de Emergência no Distrito Federal.

A maior mobilização de rua desde o início da Ditadura, e que reuniu milhões de brasileiros (como no panelaço ocorrido em várias cidades na véspera da votação da emenda das Diretas, em 24 de abril), entretanto, não resultou em vitória da emenda das Diretas, a Emenda Dante de Oliveira, que não passou na Câmara dos Deputados, pois, com 298 votos a favor, 65 contra e 112 ausências, obteve 22 votos a menos que os dois terços exigidos. Dialeticamente, há trinta anos atrás, em 25 de abril, a Ditadura saía vencedora, pois impedia as eleições diretas para presidente, mas também saía derrotada politicamente do episódio.

A Ditadura, ao impedir as Diretas para Presidente, respondeu negativamente aos massivos movimentos políticos de rua iniciados em 1983. Em contraposição, à derrota da Emenda das “Diretas Já” que impediu de eleições para a Presidência da República em 1984 não impediu a vitória política dos que lutaram pelo final da Ditadura. E isto é o mais significativo naquele processo histórico de resistência, iniciado ainda nos primeiros dias de 1964. Coube papel decisivo nesse processo ao protagonismo dos movimentos sociais e políticos de oposição que foram se construindo ao longo dos anos, os quais se ampliaram na fase final da Ditadura, especialmente a partir de 1979.

Ainda em 27 de junho de 1984, um comício no Rio de Janeiro tentou relançar sem êxito a luta pelas “Diretas Já”, mas a Ditadura seria derrotada de forma indireta, com a vitória de Tancredo Neves, no Colégio Eleitoral, em 15 de janeiro de 1985, por 480 contra 180 votos para Paulo Maluf e 17 abstenções.

A derrota das “Diretas Já’, o maior movimento de massas desde o Golpe de 1964 no Brasil, foi um prenúncio que levou, em 15 de janeiro de 1985, a eleição indireta para a Presidência de Tancredo Neves e José Sarney (ex-líder do PDS, embrionário da ARENA, no Congresso e articulador do Golpe que depôs Jango) no Colégio Eleitoral, vencendo o candidato da Ditadura, Paulo Maluf.

A partir de então, os partidos comunistas, a União Nacional dos Estudantes (UNE) e as centrais sindicais como a Central Única dos Trabalhadores (CUT) e a Central Geral dos Trabalhadores (CGT) iriam conquistar a legalidade. Apesar disso tudo, e da resistência intensa, através da ação e mobilização dos movimentos sociais e populares de oposição à Ditadura, a correlação de forças da luta política impediu que naquela quadra histórica tais movimentos se transformassem em poder político para chegar ao Executivo do País, em 1985, bem como faltava ainda uma nova constituição para a Ditadura finalmente terminar no Brasil.

No processo de abertura lenta, gradual e segura, estratégia política das classes dominantes brasileiras, a eleição de Tancredo foi o possível depois da derrota da Emenda das “Diretas Já”, ainda em 1984.

As eleições de 15 de novembro de 1986 elegeram os futuros deputados constituintes, depois que a proposição de muitos movimentos sociais e políticos de oposição, por uma Constituinte Livre, Autônoma, Exclusiva e Soberana foi derrotada. A Constituinte, com uma maioria conservadora do chamado “Centrão” impediu maiores avanços na questão agrária enquanto que as Forças Armadas trouxe consigo o eixo autoritário da época da Ditadura. Mesmo assim, no que tange aos direitos sociais e individuais, a “Constituição Cidadã” representou avanços que têm garantido um dos mais longos períodos de democracia burguesa da História Republicana Brasileira.

Destacaram-se como conquistas democráticas da Carta de 1988, a sétima Carta Constitucional, depois de vinte meses de trabalhos, muitas garantias constitucionais e direitos políticos como a qualificação da tortura como crime inafiançável, a criação de mecanismos para bloquear golpes como o de 1964, o direito de voto para os analfabetos, o voto facultativo para jovens entre 16 e 18 anos e o fim à censura. Quanto ao acesso à cidadania, foram estabelecidos vários preceitos que garantiram, entre outros: a liberdade de organização sindical; a diminuição da jornada de trabalho de 48 para 44 horas semanais; a licença maternidade de 120 dias (sendo atualmente discutida a ampliação); a licença paternidade de 5 dias; o abono de férias; o décimo terceiro salário para os aposentados; o seguro desemprego; as férias remuneradas com acréscimo de 1/3 do salário e; os direitos trabalhistas aplicados, além de aos trabalhadores urbanos e rurais, também aos domésticos; o direito a greve;. Além disso, a Constituição de 1988 consolidou a eleição direta para os cargos de todos os níveis, do Presidente da República ao vereador do município, assim como, em relação aos partidos políticos, conferiu-lhes caráter de pessoa jurídica de direito privado, dando-lhes ampla autonomia do ponto de vista da sua auto-regulamentação e autogestão, sendo permitido livre a criação, a fusão e o cancelamento de registros dos mesmos.

Em 1989, uma forte campanha midiática patrocinada pelas classes dominantes, baseada em um discurso sobre combate à corrupção, tornava mais conhecido o então governador de Alagoas, Fernando Collor de Mello, alcunhado como “caçador de marajás”. Em outra dimensão política, a ascensão dos movimentos sociais e políticos mais a esquerda, haviam tornado Luiz Inácio “Lula” da Silva em um candidato em evidência para representar parte desse bloco político. Para levar adiante estes projetos, que chegariam ao segundo turno das eleições presidenciais daquele ano, a primeira desde a eleição de Jânio Quadros, em 1960, Collor liderou a organização do Partido da Reconstrução Nacional (PRN), enquanto Lula esteve a frente da formação da Frente Brasil Popular, reunindo o PT, o PCdoB e o PSB, embrião histórico do projeto vitorioso em 2001 e que iniciou a governar o Brasil no ano seguinte. Mais vinte candidaturas presidenciais foram lançadas em 1989, com destaque para Leonel Brizola (PDT), Mário Covas (PSDB), Paulo Maluf (PDS), Guilherme Afif Domingos (PL), Ulysses Guimarães (PMDB), Roberto Freire (PCB), Aureliano Chaves (PFL), Ronaldo Caiado (PSD), Afonso Camargo Neto (PTB), Enéas Carneiro (PRONA), Fernando Gabeira (PV), Celso Brant (PMN), sendo que concorreu no pleito de 15 de novembro apenas uma mulher (Lívia Maria, do Partido Nacionalista – PN), porém, a primeira candidata à Presidência na História do Brasil.

No segundo turno, ocorrido em segundo em 17 de dezembro do mesmo ano, Collor venceu Lula por 35.089.998 votos (49,94%) contra 31.076.364 (44,23%) dos votos válidos, assumindo o governo em 15 de março de 1990.

A derrota da Emenda Dante de Oliveira, em abril de 1984, mais um momento da luta de classes que tem perpassado as ruas e a institucionalidade da nossa formação social, foram conquistadas 5 anos depois, em 1989. Mesmo que, contraditoriamente, a vitória de Collor naquele pleito tenha consolidado a abertura das portas para a grande ofensiva do neoliberalismo em nosso País, cujas consequências econômicas e sociais têm desdobramento até a atualidade, exigindo um novo programa nacional de desenvolvimento que deve ser apresentado à população brasileira nas eleições diretas para presidente no pleito de 2014.

Eis a tarefa histórica da candidatura à reeleição da primeira mulher eleita Presidenta do Brasil, Dilma Roussef, e de sua base aliada, enfrentando a antiga tática das classes dominantes de denuncismo oportunista via grandes conglomerados de comunicação, vazios de conteúdo programático mudancista, já que somente têm a oferecer mais do mesmo com seu proselitismo conservador: o velho e surrado receituário neoliberal, rentista e privatista.

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