Tiro no próprio pé
Tem aparecido aqui e ali a ideia verbalizada por acadêmicos e comentaristas, por ativistas sindicais ou por trabalhadores comuns e endossada, às vezes, por votos de juízes trabalhistas bem intencionados, de que os aumentos reais e demais benefícios conquistados pelos sindicatos em suas negociações com os patrões ou na Justiça do Trabalho devem valer apenas para os associados.
Publicado 09/02/2018 10:46
Não se refere, obviamente, aos benefícios decorrentes dos vários serviços prestados aos associados pelos sindicatos.
Na maioria dos casos a justificativa ética para tal procedimento apoia-se na necessidade de luta para a conquista, ficando como corolário o não merecimento dos que não lutam e que não são associados ao sindicato.
Em casos extremos a prática sindical é comparada à prática das academias de ginástica ou de luta livre em que impera o ditado (obviamente norte-americano) no pain, no gain. Sem sacrifício não há prêmio.
Tais concepções, a princípio justiceiras, revelam-se na vida sindical real de extrema infelicidade e cortejam um liberalismo individualista que nada deixa a desejar à lei trabalhista celerada, transferindo – quer queira, quer não – ao patronato a última palavra nos conflitos trabalhistas, aproximando a prática sindical brasileira da norte-americana, em que os acordos só valem para os associados e o patronato pode aplicar o “union bust” contratando apenas trabalhadores não sindicalizados.
Além disso, desprezam o resultado histórico institucional das lutas que garantem nas convenções, nas leis e na Constituição direitos a todos os trabalhadores (principalmente o direito da representação sindical de toda a categoria).
É como se desprezássemos os avanços que garantem o salário mínimo e o destinássemos apenas aos que lutam por ele.
Na vida das empresas, em média, um em cada cinco trabalhadores é sindicalizado. Aplicando-se o mandamento liberal, à minoria seriam garantidas as vantagens negadas à maioria. Seria uma divisão grave entre as muitas que já infelicitam os trabalhadores e dificultam sua luta.
Na experiência sindical brasileira (válida também para inúmeros outros países) a representação plena da categoria e as responsabilidades decorrentes disso são uma grande vantagem histórica sindical; não devemos abrir mão delas. Seria um tiro no próprio pé.