Paulo Moreira Leite: A prisão do preso e os direitos de Dirceu

O fato de ser esperada e temida por seus amigos e familiares não torna a prisão de José Dirceu uma medida natural, nem correta nem justa.

Por Paulo Moreira Leite, no Brasil 247

José Dirceu deixa a prisão em Brasília

Para Wadih Damous, deputado, advogado que foi presidente da Comissão de Direitos Humanos da OAB, a prisão de Dirceu é incompreensível.

"Por que prender quem já estava preso?", argumenta, lembrando uma realidade intransponível: Dirceu já estava em prisão domiciliar "e não ameaçava fugir".

"Ele estava cumprindo regularmente a pena".

Enumerando as três regras que poderiam justificar a prisão de José Dirceu, Wadih desmente uma a uma:

"Não praticou qualquer ato que constituísse risco à ordem pública, à instrução criminal ou a futura aplicação da lei penal".

Eu acho que a prisão de Dirceu constituiu mais uma entre tantas barbaridades que tem sido cometidas no país depois que, como sublinha o ministro Marco Aurélio Mello, a Lava Jato instituiu a regra pela qual “manda-se prender para depois apurar.”

As pessoas estão se acostumando com a ideia que de que suspeitos devem ir para a cadeia.

Se você estiver pensando em perguntar (“Mas não há provas contra Dirceu?”) é bom reconhecer que este raciocínio já contaminado pelo ambiente, condicionado por uma lógica autoritária que hoje é assumida como expressão de normalidade.

Num Estado Democrático de Direito, não basta haver prova – ou aquilo que o ministério público considera como prova, que o juiz classifica como tal – para uma pessoa ser presa. Se toda vez que a polícia encontrasse provas contra alguém, nem seria preciso fazer um julgamento, certo?

Vivemos sob um sistema jurídico no qual as pessoas têm direito a serem julgadas e só então, depois de condenadas, podem ser presas, se assim estiver previsto na lei. Isso porque num julgamento o réu tem o direito ao contraditório, pode apresentar sua defesa e argumentar. Se for condenado, tem direito a recurso, ao chamado segundo grau de jurisdição, porque os juízes também erram.

Em nossa sociedade, a liberdade é um direito assegurado a todos, como estado natural de homens e mulheres. A prisão não pode ser imposta pelo Estado, desde que cumpra determinadas condições, entre elas demonstrar a culpa além de qualquer dúvida razoável. Sabe por que? Porque em nossas democracias, vigora o princípio que já escrevi outras vezes por aqui, mas que não custa repetir: "é melhor ter um culpado solto do que um inocente preso".