Resolução contra colônias na Palestina deve ser implementada

O presidente estadunidense Barack Obama é vilão em parte da imprensa israelense. Aliado de Israel, mas não amigo do premiê Benjamin Netanyahu ou de sua corrida colonialista já demasiado aparente, Obama finalmente decidiu pela abstenção na votação da resolução contra as colônias no Conselho de Segurança da ONU, assim aprovada. Obama quis dar um sinal, ainda que de saldo devedor, ao deixar a Casa Branca. A resolução será mais um instrumento na luta dos palestinos.

Por Moara Crivelente* 

Kerry e Netanyahu - Foreign Policy

Nunca é demais lembrar que os Estados Unidos, sob a direção Obama, bateram recordes no seu apoio a um regime colonialista e agressivo, um recorde propagandeado pela Casa Branca em um documento emitido em 2014 (leia abaixo), ano da brutal ofensiva Margem Protetora que matou cerca de 2.200 palestinos na Faixa de Gaza. Era também o Ano Internacional de Solidariedade ao Povo Palestino, definido pela ONU.

Mesmo assim, na sexta-feira (23) a aprovação da Resolução 2334 graças à abstenção dos EUA – que abusa do seu poder de veto para proteger Israel – é digna de comemoração, ainda que comiserada devido aos precedentes e à eficácia ainda por constatar. Dos 15 membros do Conselho de Segurança, 14 votaram favoravelmente à resolução. Netanyahu reagiu classificando-a de “louca” e atacando Obama que, em setembro, havia incrementado a assistência militar bilionária a Israel.

O texto reafirma a ilegalidade da construção de colônias por Israel em territórios palestinos usurpados – são cerca de 120, com mais de 550 mil habitantes – e reconhece que esta política está minando as possibilidades de estabelecimento do Estado da Palestina, “enraizando uma realidade de um Estado”.

O mais ambicioso no texto é o apelo à “comunidade internacional” para que distinga, inclusive em acordos com Israel, entre os territórios israelenses e aqueles para além das fronteiras anteriores à guerra de junho de 1967, quando Israel estabeleceu a ocupação militar dos territórios palestinos da Faixa de Gaza, Cisjordânia e Jerusalém Oriental. 

Em um momento em que a empreitada israelense contra os movimentos de boicote a produtos israelenses produzidos nas colônias ganha força em todo o mundo – devido, precisamente, ao sucesso da campanha – a resolução fornece um apoio importante no esforço contra a normalização da colonização da Palestina.

O coordenador da campanha palestina Stop the Wall (“Detenham o Muro”), Jamal Juma, em artigo para o Middle East Eye, lembra que, em 1980, outra resolução do Conselho de Segurança apelava à comunidade internacional para que não oferecesse a Israel “qualquer assistência a ser usada especificamente em conexão com os colonatos nos territórios ocupados”. Juma cita ainda a resolução aprovada em 1982 – ano do massacre nos campos de refugiados palestinos de Sabra e Shatila, no Líbano – em que a Assembleia Geral da ONU apela por um embargo militar e por sanções econômicas e diplomáticas contra Israel.

Apenas em 2016, lembra o coordenador, a ONU aprovou 18 resoluções que reconheciam os direitos dos palestinos, mas nada demoveu o governo Netanyahu da expansão da colonização, usurpando terras palestinas. Este é, afinal, o seu legado histórico.

Em seu terceiro mandato como premiê – o segundo consecutivo – Netanyahu já expressou que sua intenção é impedir o estabelecimento do Estado da Palestina, assim como alguns membros de seu gabinete de governo. E ainda houve quem considerasse as inicitativas palestinas em apelo à ONU e ao direito internacional "contra-producentes" afastando Israel das negociações, como disse a própria gestão Obama durante a campanha palestina pelo reconhecimento do Estado ou pela responsabilização da liderança israelense no Tribunal Penal Internacional.

Embora parte considerável da mídia israelense tenha condenado a resolução – considerando até mesmo que Obama “finalmente mostra a sua cara” – também há análises responsabilizando Netanyahu pelo crescente isolamento de Israel. No jornal Haaretz, o articulista Amir Oren chegou a opinar que, com a resolução, “o mundo vem salvar Israel de si mesmo”, enquanto Aluf Benn indaga: “Obama, onde você esteve nesses oito anos desperdiçados?”, considerando que o presidente gastou sua gestão, “ao invés de justificar seu prêmio Nobel, em conversa fiada”.

 
Entre a reprodução das falas de autoridades atacando a iniciativa como um impulso aos movimentos de boicote – que grande parte da liderança israelense considera uma ofensiva e uma ameaça em considerações quase militares – e a crescente preocupação da esquerda liberal israelense com o isolamento nacional e o impacto da ocupação sobre a própria sociedade, o fato é que a resolução sacudiu as coisas.

Embora os EUA estejam no centro das análises devido à quebra de um padrão sustentado em sua política objetiva, abrindo mão do seu poder de veto, a aprovação da resolução evidencia mais uma vez o apoio massivo e generalizado ao fim da brutal e criminosa ocupação israelense e ao estabelecimento mais que tardio do Estado da Palestina.

Em 2017, os palestinos e os movimentos solidários marcarão o centenário do projeto imperialista e colonialista expresso na Declaração do secretário britânico dos Assuntos Estrangeiros Arthur James Balfour, em apoio ao estabelecimento de um Estado Judeu na Palestina à revelia da população local. Este será mais um ano de intensificada mobilização pelo fim da ocupação israelense e pela libertação da Palestina, fortalecida por instrumentos como a resolução aprovada.