Lênin e o centenário da Revolução Russa

No ano do centenário da Revolução Russa, em que o mundo vive uma reviravolta política e econômica afetando em escala global diversos países e colocando em pauta novamente as saídas para o cenário de graves retrocessos, revisitar a trajetória política e a elaboração teórica do líder da de 1917, assim como o próprio legado da Revolução, deve ser uma investida permanente para reafirmar a importância histórica desse processo para a história da humanidade até os dias atuais.

Por Rafaela Elisiario*

Lenin

Filho de um inspetor escolar com mãe de origem burguesa rural, Lênin nasceu em 22 de Abril de 1870, na cidade de Simbirsk e morreu em 21 de janeiro de 1924 em Gorki (próximo a Moscou). Aos 19 anos de idade, aconteceu um episódio trágico em sua família que lhe causou grande trauma. Seu irmão mais velho foi executado pelas forças czaristas, acusado de participar de um golpe contra o czar Alexandre III. Posteriormente, Lênin começou suas atividades políticas na Universidade de Katan, onde dedicava-se demasiadamente ao estudo, sobretudo, a divulgação da obra de Karl Marx. O líder da Revolução Russa formou-se em Direito, porém não exerceu a profissão devido às atividades políticas. Em 1895, Lênin foi preso por participar de um movimento que propagava ideias marxistas entre trabalhadores de fábricas em São Petersburgo. Nessa ocasião foi enviado para cumprir pena na Sibéria.

Como consequência de sua postura crítica em relação às correntes de vertente reformista do socialismo na Europa, Lênin rapidamente obteve grande importância como um dos mais destacados teóricos do socialismo revolucionário russo. O líder Bolchevique elaborou escritos que pudessem exteriorizar suas análises em relação ao processo histórico no qual ele viveu e que se tornaram clássicos revisitados até os dias atuais. Entre suas principais obras estão: Estado e Revolução, na qual ele aborda diretamente a questão da supressão do Estado. O que é a forma do Estado? Por que deve ser suprimida no transcurso da transição ao comunismo? Quais condições necessárias para a supressão do Estado?

Imperialismo, etapa superior do capitalismo, obra em que Lênin analisa a natureza do capitalismo contemporâneo e do real conteúdo da sua atual “globalização” e reafirma o papel motor decisivo da luta de classes dos trabalhadores para a superação revolucionária do capitalismo. Esquerdismo, a doença infantil do comunismo, livro redigido em 1920 tendo em mente os puristas revolucionários do movimento comunista. Foi no sentido de criticar o “esquerdismo romântico” que essa obra foi elaborada, demarcando a posição do “realismo tático” defendida por Lênin.

Consolidação da teoria Marxista-Leninista

Sabemos que a linha de pensamento do líder russo encontra suas raízes na teoria de Karl Marx. Sendo assim, desde bem cedo ele procurou estudar sistematicamente os textos de Marx e Engels que pipocavam por toda a Europa.

Após a primeira publicação de Lênin, O desenvolvimento do capitalismo na Rússia, ficam claros três aspectos importantes: 1- O domínio crítico das teorias econômicas de Marx e do materialismo histórico; 2- A aplicação exclusiva dessas teorias em suas interpretações dos processos históricos; 3- Sua postura de encarar a elaboração teórica de Karl Marx como “fontes norteadoras”, mantendo-se livre de um dogmatismo estéril, provocando dessa forma,o trajeto em direção à investigação, pesquisa e elaboração própria.

Na sua caminhada como teórico do socialismo, fiel a sua norma na qual “um marxista deve, para julgar uma situação fundar-se sobre o real e não sobre o possível”, Lênin recomenda que “é preciso saber adaptar os esquemas à vida e não repetir mecanicamente fórmulas abstratas de suposto teor revolucionário.” A teoria marxista-leninista surge como uma continuação do marxismo, porém agora contemplado por doses generosas de atividade política prática. Todo o processo de investigação e elaboração teórica de Lênin girou em torno da sua efetiva participação na luta revolucionária. Portanto, expor o leninismo significa apresentar o que há de peculiar e de novo nas obras do seu autor e a sua contribuição ao marxismo. Assim, a teoria marxista-leninista se desenvolve a partir de três pontos estruturantes: O Imperialismo; O Partido e o Estado.

Sobre o imperialismo Lênin o chama de “capitalismo agonizante” porque nesse estágio de desenvolvimento o capitalismo é levado ao seu nível máximo de contradições. A primeira contradição por ele apresentada está situada entre o trabalho e o capital: O imperialismo é, nos países industriais, a onipotência dos trastes e do monopólio, dos bancos e da oligarquia financeira. Na luta contra essa onipotência, os métodos habituais da classe operária se revelaram absolutamente insuficientes. A solução seria então, ou entregar-se à mercê do capital ou empunhar uma nova arma. Assim, o próprio imperialismo coloca o problema diante das massas de milhões de trabalhadores, aproximando a classe operária da necessidade da superação dessa condição de exploração.

A segunda contradição apresentada por Lênin é em relação aos interesses entre os diversos grupos financeiros e as diversas potências imperialistas na corrida pela detenção das fontes primárias de produção e pela conquista de territórios alheios. Essa luta enlouquecida entre os diversos grupos de capitalistas traz em seu bojo, como elemento inevitável, as guerras imperialistas e as guerras pela conquista de territórios enfraquecendo as próprias posições do capitalismo.

A terceira contradição está na questão de um punhado de nações “civilizadas” dominantes e centenas de milhões de homens colonizados e dependentes. O imperialismo é a exploração intensiva, a opressão mais desumana de centenas de milhões de habitantes dos imensos países colonizados e dependentes. Extrair super lucros é o único objetivo desse processo de exploração. Porém, para explorar esses países o imperialismo necessita construir a estrutura que lhe possibilite alavancar essa exploração. O surgimento da classe trabalhadora, a formação de uma intelectualidade nacional, assim como o despertar de uma consciência nacional, o fortalecimento do movimento de libertação, também se tornam efeitos da política imperialista. O incremento do movimento revolucionário ou de libertação em todas as colônias comprovam-no de forma evidente.

O segundo pilar da formação da teoria leninista se revela em sua concepção de organização do proletariado, e com isso a visão de partido. Lênin elabora uma estrutura de partido que vem a ser seguida mundialmente até os dias atuais. Segundo o líder bolchevique, a organização do partido deve se adaptar às condições e aos objetivos de sua atividade. O Partido Comunista deve ser a vanguarda, o exército dirigente da classe trabalhadora durante todas as fases da sua luta revolucionária. O centralismo democrático na organização do Partido deve ser uma síntese da centralização e da democracia operária. Essa fusão só pode ser obtida por uma atividade comum permanente do conjunto do Partido. Porém a centralização, isto é, o esforço para manter uma direção forte, não pode ter sucesso na tentativa de obtê-la no terreno da democracia formal. É então indispensável, antes de tudo, desenvolver e manter contato vivo e relação mútua entre o Partido e as massas trabalhadoras que lhe pertencem.

Por fim, a teoria leninista aborda a questão do Estado. Para ela, o Estado serve como órgão de dominação de classe, mais enfaticamente como opressão de uma classe sobre a outra. Assim, afirma que a necessidade da existência do Estado acontece pelo conflito de classes. Para Lênin, a concepção de Estado também está intimamente ligada com os conceitos de “ditadura” e “democracia”. Segundo ele, não é possível existir uma democracia pura enquanto existirem as classes sociais fundamentadas no capitalismo. Nesse caso, só podemos falar em democracia de classe.

No ano do centenário da Revolução Russa, em que o mundo vive uma reviravolta política e econômica afetando em escala global diversos países e colocando em pauta novamente as saídas para o cenário de graves retrocessos, revisitar a trajetória política e a elaboração teórica do líder da Revolução de 1917, assim como o próprio legado da Revolução Bolchevique, deve ser uma investida permanente para reafirmar a importância histórica desse processo para a história da humanidade até os dias atuais.

Bibliografia

FERNANDES, Florestan. Política, Lênin.
LÊNIN, Vladimir Ilitch. A doença Infantil do Comunismo.
LÊNIN, Vladimir Ilitch. O Estado e a Revolução.
Revista Marxismo Revolucionário. Artigo 6, 2004.