“Queda da inflação não é consequência da política monetária”

Em sua coluna na Folha de S. Paulo, a economista Laura Carvalho desconstrói o discurso do governo e do Banco Central de que a queda da inflação é fruto de mudanças na direção da política econômica.

Laura Carvalho

Texto divulgado no site do BC diz que, quando Ilan Goldfajn assumiu como presidente da instituição, em junho de 2016, “a inflação chegava a 9% no acumulado de 12 meses. Havia batido 11% em dezembro de 2015. (…) Um ano depois, a inflação acumulada em 12 meses chegou a 3,6%”.

De acordo com Laura, contudo, a queda da inflação acumulada em 12 meses não se iniciou após Goldfajn assumir o comando do Banco Central. “O índice atinge seu auge em dezembro de 2015 e vem caindo desde janeiro de 2016”, escreve.

A economista, que é professora da USP, utiliza dados dos próprios Relatórios de Inflação de 2015 e 2016 para mapear os principais fatores determinantes da queda da inflação no período.

Na sua análise, ela aponta entre as causas para os índices de inflação o reajuste dos preços administrados e a má administração das pressões cambiais.

“Segundo essa metodologia, o reajuste de preços administrados contribuiu para uma variação de 4,1 pontos percentuais do IPCA em 2015. Ou seja, 38,4% da inflação do ano, que foi de 10,67%, deveu-se diretamente ao reajuste em preços estabelecidos por contrato e que independem, portanto, de condições de oferta e demanda. Incluem, por exemplo, tarifas de energia elétrica, água, esgoto, transporte e preços de combustíveis. Em 2016, a contribuição do aumento desses preços caiu de 4,1 pontos para 0,64 ponto”, diz.

Em relação ao efeito do chamado “repasse cambial”, ela explica que o dólar também reverteu sua tendência de alta e passou a cair em janeiro de 2016. “Por afetar diretamente os preços de insumos importados, altas do dólar são repassadas para outros preços da economia. Permitem também que os produtores nacionais reajustem seus preços sem perder competitividade em relação aos estrangeiros.”

A professora continua, ressaltando que, em 2015, o efeito do repasse cambial foi de 1,57 ponto percentual, o que respondeu por 14,7% do total da inflação do ano. No ano seguinte, “esse componente passou a contribuir para uma redução no IPCA de 0,17 ponto percentual, ou seja, -2,6% do total”.

Ela destaca ainda que o efeito dos "choques de oferta” foi de 0,86 ponto percentual em 2015 e de 0,67 ponto em 2016. “Sobrou pouco, portanto, para fatores que poderiam estar ligados a uma suposta mudança de orientação de política econômica e maior credibilidade do BC”, conclui.

No texto, Laura Carvalho sublinha que o componente “expectativas de inflação” contribuiu com 0,73 ponto percentual da inflação em 2015 e 0,69 ponto em 2016. E outros fatores que afetam preços livres – como condições de demanda, desemprego e salários – contribuíram com 2,91 pontos percentuais para a inflação em 2015 e 2,62 pontos em 2016.

A economista avalia que, pelo tamanho da recessão durante esses dois anos, a queda na contribuição desse componente foi até baixa em 2016. Ela projeta que nesse ano, deve ser maior, já que a crise persiste e o desemprego só aumenta.

“Como se vê, está difícil encontrar algum motivo para comemorar a atuação do tal ‘dream team’ da política econômica. Ainda assim, o presidente do Banco Central utilizou-se dos supostos resultados positivos para reforçar sua tese”, afirma Laura.