‘Médico tem que parar de fingir que trabalha’, diz ministro da Saúde

Por Verônica Lugarini

Esse ataque aos médicos aconteceu durante discurso do Ministro da Saúde, Ricardo Barros, na última quinta-feira (13). A frase refere-se a proposta de implantar um controle de frequência aos servidores nas unidades de saúde do País por meio de um sistema de biometria.

Ministro da Saúde, Ricardo Barros - Foto: Clauber Cleber Caetano/PR

“Quando o município implanta a biometria, metade dos médicos se desligam do serviço porque eles têm cinco, quatro empregos com quatro vínculos empregatícios e não dá* conta de cumprir o horário. Como ele ganha pouquinho, ele acha que trabalha pouquinho também e está tudo certo. Esse faz de conta não ajuda a saúde”, continuou o ministro em seu discurso.

O presidente do Conselho Nacional de Saúde (CNS), Ronald Ferreira dos Santos, rebateu a fala do ministro. “Mais do que apresentar uma crítica de forma torta, o ministro [da saúde] desmereceu toda uma categoria em sua fala. Foi desrespeitoso”, disse Ronald Santos em entrevista ao Portal Vermelho.

Para Julia Roland, da coordenação nacional de saúde do PCdoB e ex-diretora do Departamento de Gestão Participativa de 2011 a 2014, a declaração foi infeliz.

“Acho que esse é o ministro da Saúde que menos conhece o SUS e a realidade da saúde. Por isso, ele não tem condições de dirigir um sistema tão complexo como esse. Considero essa afirmação um absurdo, pois quase a totalidade de médicos que conheço, pelo menos em São Paulo, marcam o horário de chegada e saída no ponto eletrônico”, disse a ex-diretora.

Julia Roland ainda completa dizendo que se há problema com o controle de ponto de determinados médicos, isso é um problema de gestão ,que deve ser resolvido pontualmente e precisa ser corrigido para que haja um melhor atendimento aos brasileiros.

Para além das falas desastrosas de Barros, o sistema público de saúde passa por um período ainda mais crítico com a crise e o contingenciamento de recursos. As condições de atendimento precárias devem piorar ainda mais com a chegada de mais de 1,3 milhão de brasileiros que deixaram de ter planos de assistência médica, de março de 2016 até março deste ano, e devem passar a utilizar o SUS. Esse número foi divulgado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS).

Outras entidades de saúde também se manifestaram sobre o ocorrido, como o Conselho Federal de Medicina (CFM). Em nota, o CFM informou que essa postura revela desconhecimento da dedicação dos médicos brasileiros na assistência à população no âmbito do SUS e ignora os esforços dispendidos por estes profissionais, principalmente nos serviços de urgência e emergência.

Terceirização

A terceirização já acontece há algum tempo no sistema público de saúde, mas com a aprovação e apoio do ministro à Reforma Trabalhista, esse quadro deve se agravar, segundo  o presidente do CNS.

Histórico polêmico

O ministro – nomeado em 2016 – tem um histórico de declarações polêmicas, como: “Exames com resultados normais são desperdício para o SUS”, “É preciso rever o tamanho do SUS” e “homens trabalham mais, por isso, não acham tempo para cuidar da saúde”. Além de ser denunciado por corrupção passiva.

Veja a nota na íntegra:

Repúdio à declaração do ministro Ricardo Barros

O Conselho Federal de Medicina (CFM) repudia e lamenta a declaração atribuída ao Ministro da Saúde, Ricardo Barros, publicada nesta quarta-feira (15), na qual desqualifica o trabalho realizado pelos médicos brasileiros.

Trata-se de manifestação impertinente, que mostra desconhecimento da dedicação dos médicos brasileiros na assistência à população no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), nos diferentes níveis de atenção (baixa, média e alta complexidade), muitas vezes sem contar com adequadas condições de atendimento nos serviços públicos.

Ao afirmar que o médico brasileiro não demonstra disposição para o trabalho, o Ministro da Saúde ignora os esforços dispendidos por estes profissionais, principalmente nos serviços de urgência e emergência.

O compromisso dos médicos com a saúde pública é reconhecido em pesquisa recente do Datafolha que coloca o médico como o profissional de maior confiança e credibilidade entre os brasileiros.

Como a citada pesquisa revela, a população sabe que, entre outros pontos, as faltas de infraestrutura nos hospitais e nos postos de saúde, bem como de uma boa gestão, impedem a obtenção de melhores resultados.

Cabe ao Ministro Ricardo Barros a responsabilidade pela gestão da saúde pública como elemento fundamental aos direitos humanos, que não estão subordinados às leis de mercado e que exigem disponibilidade de meios ordinários imprescindíveis ao Princípio Constitucional do Mínimo Existencial.

Brasília, 15 de março de 2017.

CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA