Dilma diz a Moro que tentou salvar empregos ameaçados pela Lava Jato

Em depoimento como testemunha de defesa do ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobras, Aldemir Bendine, a presidenta eleita Dilma Rousseff afirmou ao juiz federal Sérgio Moro que o seu governo tinha a preocupação de salvar as empresas e garantir os empregos nas empresas alvo da Operação Lava Jato. Ele reafirmou que as investigações deveriam punir os executivos, mas as "instituições são produtos sociais, elas não podem ser punidas".

Dilma e Moro - Reprodução

"Tinha uma questão que era muito grave. Uma delas era que as empresas que estavam sofrendo investigação da Lava Jato, elas necessariamente estavam tendo problemas na área de retomar seus financiamentos internos e externos. Isso dava, criava para o governo um grande problema. Por quê? Porque essas empresas estavam comprometendo seus empregos e seus financiamentos", destacou Dilma.

Somente na indústria naval, que estava em avançado processo de recuperação pelos governos de Lula e Dilma, o número de trabalhadores empregados caiu de 83 mil, no governo Dilma, para estimados 30 mil, atualmente.

A presidenta afirmou ainda que o seu governo tinha interesse no grupo Odebrecht em função da importância das suas empresas para o país e rebateu a afirmação de que o interesse era por conta das doações para campanhas políticas.

"Tínhamos uma relação de grande interesse não para que eles contribuíssem ou não para a campanha, mas pela importância que o grupo tinha e, acredito que ainda tem, na economia brasileira", afirmou.

A defesa de Bendine questionou Dilma sobre a atuação do então ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante. O MP acusa, com base em anotações de Marcelo Odebrecht, que o empreiteiro teria tratado com Mercadante sobre o "risco de as empreiteiras investigadas terem de reconhecer a prática de ilícitos para realização de acordos de leniência". Ele teria feito considerações "a respeito de bloqueio cautelar efetivado pela Petrobras contra as empresas do grupo" e também tratou de possível restrição de crédito do BNDES às empresas investigadas.

Segundo Dilma, a discussão sobre a leniência era um tema recorrente em seu governo. "Nós discutimos leniência, não apenas, através da CGU, da AGU, da Casa Civil, discutimos leniência no TCU com o Ministério Público também. Achávamos, e eu particularmente continuo achando, que nós temos que punir malfeitos. Punir executivos ou funcionários que pratiquem malfeitos. Punir quem quer que pratique malfeitos. Agora, as instituições são produtos sociais, elas não podem ser punidas, então, é uma forma como se pratica internacionalmente", relatou.

"Nós tínhamos de fato uma preocupação pública em relação a construir as condições de leniência para que o processo tivesse punição dos responsáveis, mas que se salvassem as empresas de engenharia desse país", reforçou Dilma

E completou: "Essas empresas elas tinham de ser preservadas, não através de seus processos de corrupção, mas através daquilo que é produto, do que uma empresa é produto, a empresa é um constructo social, ela não é pura e simplesmente a iniciativa de uma pessoa, são de vários, de um grupo de pessoas, portanto, elas têm também um know-how, um conhecimento que é importante para o País. Por isso, sinto que a avaliação desse episódio pelo dr Marcelo Odebrecht, isso é verdade, reduza a questão da leniência em si mesmo. É uma forma de interpretar o mundo, eu não concordo".

O depoimento a Moro foi feito via videoconferência. A presidente estava em Belo Horizonte, nesta sexta-feira (27). Assim que Moro deu início à audiência, o Ministério Público apresentou uma contradita (contestação feito contra uma testemunha), pedindo que o depoimento da presidenta não fosse ouvida como testemunha de defesa, pois, segundo o MP, teria interesse na investigação, já que foi quem indicou Bendine como presidente da Petrobras. O pedido foi negado.

Bendine, que está preso em Curitiba desde 27 de julho, é réu em ação penal por suposto recebimento de propina da Odebrecht.