Falta política industrial para o Brasil, afirmam especialistas

A crise na indústria brasileira segue se aprofundando mesmo diante de indicadores que apontam discreta melhora. Pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgada na quarta-feira (1º) apontou crescimento de 2,6% na produção industrial se comparado ao ano passado, mas o próprio IBGE confirma que o patamar da produção está 17,4% abaixo do pico registrado em 2013. Para especialistas, a falta de uma política industrial para o Brasil fez o país estagnar.

Trabalhador da indústria - Antonio Pinheiro

Em parceria com a Federação dos Metalúrgicos da Bahia, a Federação Interestadual dos Metalúrgicos e Metalúrgicas do Brasil (Fitmetal) realizou em Salvador, no final de outubro, o debate “Indústria e Desenvolvimento”. O objetivo é analisar o atual cenário da indústria nacional e apontar perspectivas para a retomada do crescimento econômico com geração de emprego, tendo a indústria como o instrumento que alavanque esse processo.

Durante sua intervenção no debate, o professor doutor em Desenvolvimento Econômico Uallace Moreira destacou que o Brasil perdeu o bonde do desenvolvimento. “Até os anos 1970, o Brasil estava acima da Coreia do Sul, em termos de indústria e exportação. Mas fomos ultrapassados, pois a política industrial deixou de ser discutida no país. Enquanto a Coreia do Sul, por exemplo, debatia como ingressar na indústria de tecnologia, o Brasil estava preocupado em controlar a inflação”, destacou Moreira.

Uallace ainda acrescentou que o investimento atual do Brasil em ciência e tecnologia é insuficiente para alavancar o setor. “Ou a gente repensa o modelo de desenvolvimento ou a gente vai perder ainda mais: e pior, desnacionalizar nosso parque industrial. Em momento algum o atual governo diz o que vai fazer com a indústria. Ao contrário, ele não se mobiliza e só coloca tudo na conta dos trabalhadores: PEC dos 20 anos sem investimento, reforma trabalhista, reforma previdenciária. Na verdade, a indústria deve ser o centro do desenvolvimento”, explica.

Papel do Estado

As discussões durante o debate apontaram para uma posição unânime: o papel fundamental do Estado para o desenvolvimento da economia e, por consequência, da indústria.

“É preciso construir parcerias com o setor privado. Gerir e orientar o mercado. A ideia de que a economia deve ser gerida pela iniciativa privada é um grande engano. Basta ver o exemplo da China, que se desenvolveu guiada pelo Estado, investindo e garantido a estruturação do seu parque industrial”, disse Aurino Pedreira.

A China também foi citada pelo presidente da Fitmetal, Marcelino da Rocha, como exemplo a ser seguido. “Pesquisadores indicam que países com mais de 25 milhões de habitantes que não tenham feito investimento na indústria não conseguem gerar emprego e distribuir renda. Por isso, a China tem um programa de governo para os próximos 20 anos que é revisto a cada cinco anos. Hoje ficou constatado que não temos política de governo no Brasil”, explica Marcelino.

A economista Ana Georgina, supervisora do Dieese, fez uma análise do processo de desindustrialização que atinge o país, consequência da falta de uma política industrial. “Nunca tivemos uma política de verdade. Sempre aconteceram ações isoladas, com protagonismo de alguns setores, que conseguem algum tipo de política, mas muito umbilical. A verdade é que as empresas brasileiras estão sendo vendidas. Estão vendendo a Petrobras por fatias. A mesma coisa a gente vê agora com a Eletrobras”, alerta Georgina. A representante do Dieese ainda destaca que não podemos descartar o papel dessas estatais no desenvolvimento do país. “Tudo o que temos de base e importante no país foi feito com investimento público. Por isso, discutir a situação da indústria é extremamente necessário. O que está em jogo é o desenvolvimento da nação”, ressalta.

Também foi criticado o fato de o governo federal priorizar apenas o setor mais endinheirado do país. “Parece que só tem indústria no Sudeste. É um absurdo”, disse Jonas Paulo, coordenador executivo do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social do Estado da Bahia.

Além dos metalúrgicos, participaram do debate representantes do Sindpetro, Sindcarne, Construção Pesada, Sindicato dos Engenheiros, Secretaria do Trabalho Emprego e Renda do Estado, entre outros.