No Brasil, 30 crianças e adolescentes são assassinados a cada dia

Em 15 anos, número de homicídios de menores de 19 anos dobrou, alerta relatório sobre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.

Adolescentes - .

Um em cada seis homicídios registrados em 2015 vitimou brasileiros com até 19 anos de idade. O número de mortes violentas nessa faixa etária mais que dobrou desde 1990, passando de 5 mil para 10,9 mil. Os dados, extraídos do Sistema de Informações sobre Mortalidade do Ministério da Saúde, figuram em um relatório da Fundação Abrinq sobre a situação das crianças e adolescentes frente aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas, divulgado nesta terça-feira 12.

O objetivo 16 prevê a promoção de “sociedades pacíficas e inclusivas para o desenvolvimento sustentável, proporcionar o acesso à justiça para todos e construir instituições eficazes, responsáveis e inclusivas em todos os níveis”.

Entre as metas que impactam os indivíduos menores de idade, figura a redução de "todas as formas de violência e as taxas de mortalidade relacionadas", bem como o fim do "abuso, exploração, tráfico e todas as formas de violência e tortura contra crianças".

O maior número de vítimas de zero a 19 anos de idade está no Nordeste (4.691 homicídios). Vale observar que esta região possui uma população menor do que a verificada na Sudeste, segundo colocada em quantidade absoluta de assassinatos de crianças e adolescentes.

Entre os locais com pior desempenho, a Bahia lidera com 1.223 casos de mortes violentas de menores de 19 anos, ou 20,3% dos homicídios registrados no estado em 2015. Na sequência estão Rio de Janeiro (1.002) e Ceará (900), números que representam, respectivamente, 19,8% e 21,6% dos assassinatos contabilizados naquele ano.

Quando se analisa especificamente os homicídios por arma de fogo, o cenário é ainda mais grave. Em média, crianças e adolescentes representam 20,7 % do total de vítimas no País. Isso significa que um em cada cinco brasileiros assassinados por disparos de arma de fogo em 2015 tinham menos de 19 anos. O percentual é ainda maior que a média nacional nas regiões Nordeste (21,8% sobre o total) e Sudeste (21,2%).

"A nível nacional, 93,4% dos assassinatos cometidos por armas de fogo contra a população de zero a 19 anos de idade, em 2015, tiveram como alvo indivíduos entre 15 e 19 anos, enquanto 5,3% são referentes a indivíduos de 10 e 14 anos e 1,2% a menores de nove anos", pontua o relatório A Criança e o Adolescente nos ODS, terceiro estudo da Fundação Abrinq a retratar o cenário da infância e adolescência desde que o Brasil se tornou signatário dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável.


A violência é apenas a face mais cruel do problema

Documento subscrito por 193 países, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável elencam 169 metas a serem cumpridos até 2030, em prol de um mundo mais justo e sem desigualdade. A nova análise da Fundação Abrinq contempla os indicadores sociais que impactam a vida de crianças e adolescentes, relacionados aos ODS 6 (Água Potável e Saneamento), 11 (Cidades e Comunidades Sustentáveis) e 16 (Paz, Justiça e Instituições Eficazes), no ano de 2015, quando teve início a agenda mundial.

Se mantido o atual ritmo para a melhoria desses indicadores, o Brasil dificilmente cumprirá os objetivos do acordo no prazo estipulado pela ONU. Mais de 34 milhões de pessoas, ou 17% da população, não têm acesso à água potável. A rede coletora de esgoto é um privilégio de apenas 65,3% dos lares brasileiros. Cerca de 15% das crianças e adolescentes vivem em favelas, sendo que na região Norte um quarto dos brasileiros com até 17 anos de idade vivem em habitações precárias.

“O objetivo deste estudo é construir um ‘marco zero’ para facilitar o monitoramento dos avanços do Brasil diante das metas da Agenda 2030”, explica Carlos Tilkian, presidente da Abrinq. “Os ODS são uma grande oportunidade para a efetivação de políticas públicas visando a qualidade de vida e da cidadania das crianças e dos adolescentes no Brasil”, acrescenta Heloisa Oliveira, administradora-executiva da organização.

Maioridade Penal

A discussão sobre a possibilidade da redução da maioridade penal de 18 para 16 anos para crimes graves continua rondando os debates. A Comissão de Constituição e Justiça tentou, mais de uma vez, emplacar a votação da Proposta de Constituição de Justiça (PEC 33/2012) durante 2017, mas a pauta deve ser votada em 2018.

Os dados da Abrinq reforçam que a redução será ineficiente para o comabte á criminalidade. Apenas 9,5% dos atos infracionais cometidos por adolescentes são homicídios, o registro total foi de 2.481 ocorrências. As outras infrações totalizam 90,5%, sendo roubo (44,4%), tráfico (24,2%), e outros.

A Abrinq destacou também no relatório que uma nota técnica publicada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), em 2015, O Adolescente em Conflito com a Lei e o Debate sobre a Redução da Maioridade Penal, no auge dos debates sobre essas questões, foi abordado que 95% dos adolescentes em conflito com a lei e cumprindo pena de restrição de liberdade eram do sexo masculino, sendo que 60% deles tinham idade entre 16 e 18 anos.

Dados de 2013, reportados nessa nota, ainda indicam que mais de 60% dos adolescentes cumprindo pena nesse ano eram negros, 51% não frequentavam a escola e 49% não trabalhavam quando cometeram o delito. Entre o perfil desses adolescentes, estima-se que 66% deles viviam em famílias consideradas extremamente pobres.

De acordo com o relatório, "diversas pesquisas têm trabalhado com a categoria de “sujeição criminal” (MISSE, 2010) para explicitar que, embora esses fatores socioeconômicos estejam relacionados à entrada de adolescentes no “mundo do crime”, não são eles que determinam o envolvimento de jovens com a criminalidade".

"Nessa perspectiva, o SJC passa a operar seletivamente, seja por meio da abordagem majoritária das forças de segurança pública a esses adolescentes pobres e negros, à condenação desses ao cumprimento de medidas socioeducativas mais rigorosas, como de internação e restrição de liberdade. Cria-se, assim, a ideia difundida na sociedade brasileira de criminalizar indivíduos previamente, classificando-os como “potencialmente criminosos” ou “sujeitos previamente suspeitos” rotulados e acusados pela sociedade mesmo antes de cometer qualquer infração criminal. Como indica Santibanez (2016), a forma como esses adolescentes são rotulados nesse processo de acusação social transparece nas condições físicas dos centros de internação que os recebem, bastante precários e que operam de forma similar à lógica dos presídios convencionais", diz o relatório da Abrinq.

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