Entidades religiosas denunciam perseguições no RS

Quase R$ 10 mil reais em prejuízos. O valor econômico, no entanto, tem pouca importância em relação ao significado dos danos causados. Na madrugada de 16 de fevereiro, criminosos invadiram e vandalizaram a sede do Templo Africano Oxum e Ogum, localizado no bairro Pioneiro, em Caxias do Sul, na Serra Gaúcha..

Por Cristiano Goulart*

Audiência Pública - Guilherme Santos/Sul21

“Imagens foram quebradas, imagens antigas, imagens foram destruídas, fios de conta, guias foram arrebentados, búzios foram roubados, axés de orixás foram roubados. E o que eles não puderam roubar, eles destruíram. Quebraram várias imagens”, relata Pai Ademir de Oxum, de 58 anos.

A suspeita do religioso é de que três pessoas tenham pulado o muro de 3 metros do templo e invadido o local exclusivamente para vandalizá-lo. Por causa do crime, o terreiro ficou fechado entre os dias 17 de fevereiro e 8 de dezembro. Os suspeitos do crime ainda não foram localizados pela polícia.

Ações como esta, de intolerância religiosa, motivaram a realização de uma audiência pública, proposta pela deputada Manuela D’Ávila (PCdoB), na noite desta segunda-feira (11), na Assembleia Legislativa gaúcha. Por quase 1h30, representantes de crenças de matriz africana e cristã debateram a necessidade de políticas que reforcem a laicidade do Estado, como a criação de uma delegacia especializada em crimes de intolerância.

“O que nós temos, hoje, no Brasil, é pior do que a intolerância. (…) Respeitar o Estado laico é respeitar com que todos tenham suas crenças. É muito importante que tenhamos uma delegacia que trate de intolerância”, afirma Roberto Schneider Seitenfus, membro do Coletivo Independente em Defesa das Religiões de Matriz Africana (Cidrema).

Cristã praticante e integrante da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RS), a advogada Martina Rodrigues afirma que religiosos de todas as crenças sofrem perseguição no país: “Símbolos religiosos cristãos também estão sendo destruídos. Então está havendo um hiato neste país. Ninguém, neste país, tem direito a atacar um ateu, um povo de matriz africana, um cristão. Esta iniciativa da delegacia especializada, se for criada, vai ser um acalento para a religião e pelo respeito à laicidade do Estado”, destaca a advogada.

Delegacia de crimes raciais e delitos de intolerância

Reivindicado por entidades religiosas, já tramita na Assembleia Legislativa gaúcha, desde setembro deste ano, o PL 182/2017, de autoria do deputado Enio Bacci (PDT), que pretende criar a Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância Religiosa (Decradi). O PL também prevê a criação de um canal 0800 para que a população efetue denúncias contra as práticas criminosas. Atualmente, a proposta aguarda o parecer da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e não tem previsão de ir a votação em plenário.

SP e RJ contam com delegacias especializadas

Desde 2011, o Estado do Rio de Janeiro já conta com uma delegacia de polícia (DP) de crimes raciais e delitos de intolerância. A DP visa “combater todos os crimes praticados contra pessoas, entidades ou patrimônios públicos ou privados, cuja motivação seja preconceito ou a intolerância”. Em São Paulo, a delegacia especializada em crimes raciais e delitos de intolerância foi constituída, em março de 2006, com o objetivo de “reprimir e analisar os delitos de intolerância definidos por infrações originalmente motivados pelo posicionamento intransigente e divergente de pessoas ou grupos em relação a outra pessoa ou grupo e caracterizados por convicções ideológicas, religiosas, raciais, culturais, étnicas e esportivas, visando a exclusão social.”

Comissão promete levar reivindicações à SSP

No final da audiência presidida por Manuela D’Ávila, na Comissão de Cidadania e Direitos Humanos (CCDH) da Assembleia Legislativa, a deputada prometeu às entidades representativas tentar agendar uma reunião com o secretário da Segurança Pública (SSP), Cezar Schirmer, para discutir sobre a necessidade de criação de uma delegacia especializadas contra crimes de preconceito e intolerância religiosa. Manuela afirmou ainda que a CCDH irá envolver o deputado Enio Bacci no debate, tendo em vista que tramita na Casa uma proposta de autoria do deputado e que se aproxima das reivindicações apresentadas na audiência desta segunda.

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