MST culpa Governo do Estado e Incra após ataque a acampamento no PA

Após o ataque a tiros ocorrido nesta segunda-feira (11) no acampamento Hugo Chaves, no sul do Pará, há um clima de pânico instalado entre as 300 famílias de trabalhadores rurais acampadas na fazenda Santa Teresa. Segundo relatos, os atiradores ocupavam duas camionetes e usaram espingardas. Foram identificados pelos sem-terra como capangas do fazendeiro Rafael Saldanha. No momento do ataque, estavam sendo desmontadas as barracas e a escola que atende 180 crianças.

Por Railídia Carvalho

Entrada do acampamento Hugo Chávez, sem-terra construíram uma trincheira, medida, segundo eles, para se protegerem dos tiros - Lilian Campelo

Em entrevista ao Portal Vermelho por telefone, na manhã desta terça-feira (12), Ulisses Manaças, dirigente nacional do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), confirmou o ataque. Ele responsabilizou o governo do Estado do Pará e o Instituto Nacional de Regularização Fundiária (Incra) pela explosão dos conflitos na região. De acordo com ele, está provado que as terras onde está a fazenda Santa Teresa são terras públicas griladas. “É terra pública grilada mas o governo do Estado não faz o levantamento da situação e o Incra não se manifestou. Não há interesse”, completou Ulisses.
                                                                   
“Encontramos cartuchos calibre 12 no acampamento. Poderia ter sido uma nova chacina no sul do Pará”, declarou referindo-se a outros episódios. No dia 24 de maio deste ano, 10 trabalhadores rurais foram assassinados na fazenda Santa Lúcia, no município de Pau D’Arco, também no sudeste do Pará. Policiais militares foram denunciados pela morte dos trabalhadores rurais. Não houve até o momento responsabilização dos mandantes que, segundo o movimento, é formado por um consórcio de fazendeiros. As mortes resultaram de uma ação de reintegração de posse na fazenda.

Ulisses contou que as famílias do acampamento Hugo Chaves estão abandonadas à própria sorte. O ataque a tiros aconteceu no momento em que as famílias se preparavam para deixar o local, onde ocorrerá reintegração de posse a partir desta quinta-feira (14). Sem alternativas do judiciário, as famílias iriam para o assentamento 26 de março, também na região, que é regularizado. “Agora o pessoal paralisou. Não vai mais sair por conta dessa intransigência do poder judiciário”, afirmou Ulisses. O prazo dado pela Justiça para as famílias ficarem no local se encerra nesta quarta-feira. Além desta, outras reintegrações de posse estão ocorrendo na região.

“O que gostaria de falar é pedir o engajamento das pessoas, dos defensores dos direitos humanos, das pessoas comprometidas com o Brasil que possam fazer a denúncia pública dessa situação. Da omissão do governo federal e do governo do estado, do PSDB. A violência no campo está em uma espiral crescente e o sudeste do Pará voltou a ser um barril de pólvora”, enfatizou Ulisses.

Pré-candidata do PCdoB à presidência da República, Manuela D,Ávila visitou o acampamento Hugo Chaves durante agenda da pré-campanha no Pará. A deputada se manifestou na noite de ontem pelas redes sociais sobre o ataque. “Agora, antes de dormir, recebi a informação que pistoleiros atacaram a tiros o acampamento Hugo Chaves mesmo com as famílias já se organizando para cumprir a reintegração de posse marcada para quarta. Providências dos governos federal e estadual são urgentes! Ajudem a denunciar!”, publicou Manuela.

Sobre a visita de Manuela, Ulisses comentou que foi uma manifestação importante de solidariedade de comitiva do PCdoB. “Almoçaram, viram a vida social em uma comunidade camponesa logo depois da turma sair acontece isso”, lamentou o dirigente. Manuela também lembrou no post que “as crianças brincaram com minha filha, dançaram, falaram sobre a vontade de seguir estudando. As mulheres falaram sobre seus barracos e tudo o que plantaram e colheram”.

O dirigente do MST destacou que o ataque sequer poupou as crianças. “Está não foi a primeira vez, ataques a tiros, bombas já aconteceram na escola, nas roças do acampamento Hugo Chaves. Temos pelo menos 10 boletins de ocorrência na Deca (Delegacia Especializada em Conflitos Agrários) com ataques dessa natureza”, relatou. Ainda de acordo com Ulisses, a Deca não tem “a imparcialidade necessária”. “A proteção através da Deca é pra intimidar os trabalhadores. Acabam fazendo conluio com fazendeiros”, denunciou Ulisses.

Darci Frigo, presidente do Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), contou ao Portal Vermelho que passou a noite de segunda-feira acionando o Ministério Público Federal e o Ministério Público Estadual para que que busquem apurar o ocorrido no acampamento Hugo Chaves. “Acionamos o Ministério Público porque o controle externo da atividade policial cabe ao MP. O MP precisa saber se a polícia está atuando ou não nas milícias privadas”, afirmou Darci. O Conselho também cobra alternativas paras as famílias acampadas. “Essas famílias não podem ficar abandonadas na beira da estrada”.

Na opinião de Darci, a inércia do Incra tem colaborado para agravar os conflitos agrários no país. “Hoje você não tem mais nenhuma solução através da política. O Incra não está regularizando áreas públicas que são tomadas por grileiros. No sul do Pará há muitas áreas públicas. A tendência é que esses conflitos se intensifiquem em várias regiões do país porque tem interesse dos latifundiários e não tem nenhuma medida concreta de política pública que possa garantir os direitos a esses camponeses”, denunciou.

Ele criticou a omissão do governo federal que se transformou em uma “autorização tácita” para promover a violência no campo. “Toda a nossa avaliação ao que está acontecendo em termos de violência no campo é que não há sinalização dos agentes públicos como o Ministério da Justiça, Incra.; Não há nenhuma palavra tanto no sentido de que vai ter política pública ou de repressão aos grupos armados ou dessas organizaçõe criminosas contra indígenas, trabalhadores rurais e quilombolas. O que existe hoje é uma autorização ou palavra tácita que está no ar. Se não há força de contenção, portanto, cada uma faz o que quer no território”, concluiu Darci (foto).

Ulisses informou que nesta quarta-feira (13), às 8h, será realizada uma audiência pública no fórum de Marabá. “Foi marcada para discutir a situação do acampamento Dalcídio Jurandir mas vamos também denunciar para a sociedade a explosão brutal da violência no campo e a omissão dos governos e do judiciário”.

Confira nota do MST no Pará   

Prezados/as companheiros/as,

Estamos acompanhando todas as movimentações e os acontecimentos no Acampamento Hugo Chávez em Marabá.
Reunimos com todas as famílias e militantes que permanecem no local.
Como já é do conhecimento de todos/as, amanhã, dia 13/12, termina o prazo concedido pela justiça para permanecemos na área. Estávamos há dias nos preparando para sair de forma pacífica, desmontando barracos.
Ontem, por volta de 16:30h os acampados foram abordados na estrada que dá acesso ao acampamento por jagunços fortemente armados com espingardas e revólveres que atiraram contra os trabalhadores. Logo após , as camionetes avançaram sobre a portaria do acampamento atirando contra as pessoas indiscriminadamente, não respeitando mulheres e crianças que foram obrigadas a correr para se esconder, muitas das quais desmaiaram r foram socorridas.Os ataques duraram até as 18:30h gerando um clima de pânico e terror nas famílias. as pessoas passaram a noite sem dormir por conta do medo.
Hoje o clima é mais tranquilo, porém as pessoas estão muito apreensivas, mas com uma enorme disposição de lutar e srguir em frente.
Várias denúncias foram feitas aos órgãos e responsáveis pela srgurança pública do Pará, mas até o momento nenhuma autoridade se deslocou para tomar as providèncias.
Diante da gravidade da situação decidimos:
a) Suspender o desmonte do acampamento e resistir até a última possibilidade por falta de segurança âs familias Sem Terra.
b) Responsabilizar o Governo estadual e o Governo Federal pela tragédia que pode vir a ocorrer com as famílias.
c) Denunciar a omissão do ITERPA, INCRA, DECA, PM e polícia civil e o Poder Judiciário, responsáveis pelo estado de caos e barbárie em solo paraense.
d) Pedir o apoio e solidariedade de todas as pessoas e entidades que defendem a justiça social, os direitos humanos e a reforma agrária para se manifestar e protestar contra a violação dos direitos humanos no Brasil e na Amazônia.
e) Manifestação dia 13 as 08 horas da manhã em frente ao Fórum de Marabá contra a violência no campo e contra os despejos.

Marabá, 12 de dezembro de 2017.

Lutar. Construir Reforma Agrária Popular!

Direção Estadual do MST Pará