Redução da maioridade é ineficaz e afeta principalmente jovens negros

A discussão sobre a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos não chegou ao fim e terá sua continuidade este ano, após diversos adiamentos em 2017. As tentativas de votação foram apressadas e demonstraram a falta de análise do governo sobre o tema, já que, segundo pesquisas, os jovens mais pobres e negros seriam afetados por uma medida paliativa e ineficaz como esta.

Por Verônica Lugarini*

Maioridade penal - Agência Brasil

De acordo com informações do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (Infopen), em junho de 2016, o Brasil registrou a 3ª maior população carcerária do mundo, com 726 mil presos. Desse total, mais da metade é de jovens de 18 a 29 anos e 64% são negros.

Com isso, a redução da maioridade penal atingiria os jovens negros, pobres e da periferia. Esses mesmos meninos são as principais vítimas da violência policial no Brasil, como apontam os dados do 11º Anuário Brasileiro de Segurança Pública.

Em 2016, 4.222 pessoas foram mortas em decorrências de intervenções de policiais civis e militares. Dessas pessoas, 99,3% dos mortos são homens, sendo que 81,8% têm entre 12 e 29 anos e o mais alarmante é que 76,2% são negros.

Esses dados validam a afirmação de que os jovens negros são os mais afetados por uma mudança que não irá alterar o número de homicídios, conforme apontou o Núcleo de Produção de Informações Estratégicas da Fundação Casa.

Segundo a instituição, menos de 2,54% dos 9.340 menores internados, em setembro de 2017, na Fundação Casa (Centro de Atendimento Socioeducativo ao Adolescente) cometeram homicídio. Roubo e tráfico de drogas representavam a maior parte dos jovens, com 41% e 43,32% das detenções, respectivamente.

Ou seja, a redução agravaria o atual cenário, elevando ainda mais a população carcerária do Brasil e diminuindo a possibilidade de recuperação e reinserção social dos jovens.

De acordo com a Diretoria da Human Rights Watch no Brasil, Maria Laura Canineu, encaminhar adolescentes para serem julgados e condenados como adultos é profundamente prejudicial ao indivíduo.

Segundo ela, um estudo sobre adolescentes que foram transferidos para o sistema de adultos no Arizona (EUA) descobriu que os jovens são prejudicados em relação ao seu desenvolvimento social, formação de identidade, educação desenvolvimento de habilidades fundamentais e transição saudável para a idade adulta.

Além disso, os adolescentes encarcerados com adultos correm maior risco de abuso físico, incluindo agressão sexual. Nos EUA, mesmo considerando que crianças e adolescentes são uma proporção, uma em cada cinco vítimas de violência sexual entre presos são adolescentes.

Contra a redução da maioridade penal

Diversas organizações se manifestaram contra a mudança, entre elas a Human Rights Watch.

A instituição declarou que “reduzir a maioridade penal vai na contramão não apenas da tendência internacional, mas também da pesquisa mais atual sobre o desenvolvimento do cérebro na adolescência. A redução também viola as obrigações internacionais do Brasil e não tem nenhum impacto da redução da insegurança pública. Qualquer medida nesse sentido é um retrocesso imenso em relação ao que o Brasil representou para a comunidade internacional até o momento”, disse Maria Laura Canineu durante um debate sobre o tema na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ).

Já a Organização das Nações Unidas (ONU) informou:

“Atualmente, a juventude, em especial negra e pobre nas periferias das grandes cidades, é quem mais sofre os efeitos da violência: a cada 23 minutos, um jovem negro é assassinado. São mais de 60 jovens negros vítimas fatais da violência por dia no Brasil”, ressaltou a agência da ONU.

Até o momento não há previsão de data para a nova tentativa de votação da redução da maioridade penal.