"Quando a indústria vai mal, é difícil o resto da economia ir bem"

A produção industrial brasileira caiu 2,4% em janeiro deste ano, na comparação com dezembro, segundo dados do IBGE divulgados nesta terça (6). A queda, que ocorre após quatro meses de alta, foi a maior desde fevereiro de 2016 e anula boa parte do crescimento acumulado entre setembro e dezembro, que foi de 4,3%. Para Nelson Marconi, economista e professor da FGV, não é possível falar em retomada do setor. E quando a indústria vai mal, é difícil o resto da economia ir bem.

Indústria automobilítica no Brasil

Em janeiro, a atividade industrial apresentou queda generalizada. Dezenove dos 24 ramos pesquisados encolheram. Mas a produção de veículos automotores, reboques e carrocerias – que havia sido responsável por boa parte do crescimento do setor em dezembro, com um avanço de 9,1% -, foi a principal influência negativa, agora apresentando um recuo de 7,6% na comparação mensal.

Em relação a janeiro de 2017, auge da crise, a produção industrial cresceu 5,7%. E, nos últimos 12 meses, acumula alta de 2,8%. Vale destacar que a indústria terminou 2017 estagnada. Além disso, dados do IBGE também mostram que a participação do setor no PIB caiu para 11,8% e é hoje a menor desde os anos 1950.

De acordo com Nelson Marconi, o desempenho da indústria brasileira, hoje, está bastante dependente do ramo automobilístico, que puxou tanto a alta da produção industrial nos meses anteriores, quanto, agora, a baixa.

“Não dá para dizer que há uma retomada geral da indústria, porque, na verdade, o que há é um setor que está bem – a indústria automobilística -, por causa das exportações, principalmente para a Argentina, o que até desaqueceu um pouco agora”, disse, ao Portal Vermelho.

O economista lembrou que a produção automobilística nacional é beneficiada pelo aumento das alíquotas de importação, que diminuem a concorrência de produtos estrangeiros do ramo dentro do país.

Segundo ele, as exportações de bens de capital também ajudaram os resultados favoráveis da indústria dos meses anteriores. “Uma variável que o governo dá atenção mínima, que são as exportações, é o que está puxando esse crescimento da indústria. E isso está, na verdade, muito ligado ao desempenho das outras economias, aos acordos comerciais que existem no Mercosul”, completou.

O professor da FGV destacou que a indústria é o carro chefe da economia, porque gera encadeamento para os outros setores. Ademais, é ela que gera tecnologia e inovação.

“A indústria puxa os outros setores da economia, não só em relação à produção, mas à produtividade e à inovação. Então, quando a indústria vai mal, é difícil o resto da economia ir bem. Ela é que é o motor, de certa forma, do processo de recuperação. Quando ela está patinando, como está agora – tem mês que sobe e tem mês que cai -, fica difícil ter um crescimento consistente da economia”, afirmou.

Além disso, a indústria também é importante porque gera empregos para uma quantidade muito grande de pessoas. “Não necessariamente são empregos de elite, mas têm qualidade boa e incorporam muita gente ao mercado de trabalho”, detalhou o Marconi.

Em 2017, as importações cresceram 5%. A alta de 5,2% nas exportações permitiu ao país garantir superávit na balança comercial. Mas a chegada de muitos produtos estrangeiros ao país pode terminar por atrapalhar ainda mais o desempenho da combalida indústria brasileira.

“Normalmente, quando uma economia começa a crescer de novo, ela retoma um volume de importação. Mas não é o nossos caso ainda. Não estamos crescendo a ponto de gerar esse volume tão expressivo de importação. E, se você não está crescendo e começa a importar muito de novo, é sinal de que você pode prejudicar sua indústria. No cenário atual, isso é um problema, porque ainda não estamos retomando o crescimento de forma significativa, de maneira a justificar essas importações”, avaliou Marconi.

O professor apontou os caminhos que o Brasil deveria seguir para interromper o processo de desindustrialização. “A primeira coisa é que deveríamos estar colocando os preços macroeconômicos em ordem. Precisamos ter taxa de juros baixa e taxa de câmbio competitiva e recursos do setor público, que a gente chama de poupança pública, para poder o setor público investir. Essas são as primeiras coisas. De forma complementar, precisamos de políticas industrias e de inovação, que também vão ajudar nesse processo”.

Questionado se essas medidas estão no horizonte, respondeu, enfático: “No horizonte deste governo, em absoluto, não”.