Foi com uma platéia repleta de policiais e diante da cúpula da polícia de São Paulo que o Secretário de Segurança Pública, Saulo de Castro Abreu Filho, prestou depoimento na Comissão de Segurança Pública da casa nesta terça-feira (6). Na pauta inicial da convocação, dois temas: a redução de gastos na segurança escolar e os ataques do PCC de janeiro deste ano, que resultaram na morte de dois policiais e fizeram 10 feridos. O secretário foi convocado a partir de um requerimento do deputado petista Renato Simões, aprovado somente no dia 11 de maio, depois de cerca de quatro meses de postergação pela bancada governista. Porém, um dia após a aprovação, o estado de São Paulo se viu em meio à maior onda de violência dos últimos anos, que deixou um saldo de 174 mortes, entre agentes de segurança, suspeitos e civis. "Se o depoimento já tivesse acontecido, já poderiam ser conhecidas anteriormente as fragilidades na segurança, que só se tornaram evidentes com três dias de ataques do PCC", afirmou o deputado.

O secretário garantiu que todos os responsáveis pelos atentados de janeiro estão presos ou mortos. Apesar disso, não soube explicar a motivação dos crimes nem o resultado do inquérito. Diante da urgência da questão, no entanto, os questionamentos dos parlamentares foram centrados sobretudo nos ataques da semana de 12 a 19 de maio. Saulo de Castro, no entanto, se limitou a dizer que “as investigações ainda estão acontecendo” e que não podia falar sobre isso “senão as colocaria em risco”. Perguntado sobre quantas vezes ele teria se reunido com o até então secretário de Administração Penitenciária, Nagashi Furukawa, para discutir ações coordenadas de combate ao crime organizado dentro e fora dos presídios, Castro disse que não se recordava de quantas vezes tinha feito isso desde os ataques de janeiro. “Outros funcionários da Secretaria também podem cuidar deste assunto. As investigações são descentralizadas”, disse.

“Há, portanto, uma dualidade no combate ao crime em São Paulo, pela incapacidade do secretário de dialogar com o ex-secretário Furukawa sobre o crime organizado. Isso impediu a criação de forças-tarefa para combater o PCC”, avalia Renato Simões.

As questões do deputado Afanasio Jazadji, presidente da Comissão de Segurança Pública, também não foram respondidas. O deputado do PFL queria saber como as bases policiais tinham sido prevenidas dos possíveis ataques e a razão para o deslocamento dos oito presos que foram trazidos do interior para a capital no final de semana dos ataques. “Temos uma estrutura e ela se comunica. Mas não posso dizer como foi feita a comunicação. A decisão foi dividida com o Comandante Geral da PM, da Polícia Técnica e com o Delegado Geral da Polícia. Tenho que preservar essas pessoas que estão aqui, já que elas não podem falar”, disse o secretário, se referindo ao regimento que, em casos de convocação, permite que somente o interrogado se manifeste.

Estavam presentes ao depoimento o Delegado geral da Polícia, Marco Antônio Desgualdo, o comandante-geral da PM, coronel Elizeu Eclair Teixeira Borges, e o superintendente da Polícia Técnico-Científica, Celso Perioli. “Tenho a responsabilidade de não debater publicamente a forma de investigar da polícia de São Paulo”, afirmou Saulo de Castro.

A bancada de oposição ainda questionou o secretário sobre a redução nos gastos da pasta, um dos motivos originais da convocação. Entre 2001 e 2005, a diferença entre o orçado e o liquidado para a área de segurança e policiamento escolar foi de R$ 453 mil. Para 2006, a proposta orçamentária enviada ao Legislativo pelo governo Alckmin representava uma redução de 25,11% na segurança escolar, e de 63,11% no programa de prevenção às drogas. De acordo com os deputados petistas, apesar do aumento de R$ 18 bilhões na arrecadação do Estado, ao todo R$ 615 milhões deixaram de ser gastos com a segurança pública nos últimos quatro anos.

Castro explicou a redução com base na eficiência da gestão dos recursos – o estado teria, por exemplo, comprado viaturas a preços mais baixos do que o orçado – e comemorou as economias. No entanto, pelo menos R$ 174 milhões, deste total de R$ 615 milhões, foram investimentos não feitos no setor, o que, para a oposição, representa que a segurança pública deixou de ser prioritária para o governo tucano.

PREPOTÊNCIA
Com a postura que lhe é peculiar, o secretário Saulo de Castro Abreu Filho tratou o depoimento que prestou à Assembléia Legislativa com deboche. Ridicularizou seus inquiridores, zombou das questões colocadas e fez questão de exibir sua parca intelectualidade. Por diversas vezes, olhou para o relógio querendo ir embora, e por duas vezes disse ao presidente da Comissão que “tinha mais o que fazer”.

Ao deputado Vanderlei Siraque, disse: “Você só fica nessa macheza quando pega o microfone”. E, respondendo à acusação de se recusar a prestar esclarecimentos à população enquanto aceita receber em seu gabinete o dono da boate Bahamas (um conhecido prostíbulo de luxo da cidade), revidou: “Melhor receber dono de boate que seja essa do que receber dono de boate de outro tipo…”. Em outro momento, ofereceu um copo de água a Siraque, insinuando que ele estava exaltado.

Antes, já havia se levantado e erguido as mãos, como se estive em posição de revista policial, para ironizar o regimento da casa que não autoriza a presença de pessoas armadas no plenário. Cerca de 70 policiais militares e bombeiros fardados ocuparam as cadeiras do auditório para ouvir o depoimento de Castro. Do lado de fora, havia 40 viaturas paradas no estacionamento da Assembléia Legislativa. O secretário disse que os que estavam ali tinham comparecido para assessorá-lo, ou estavam de folga.

“Esta casa recebe ministros e governadores, mas só temos este aparato policial presente quando o secretário Saulo vem aqui. Isso é gasto do dinheiro público. Houve uma rebelião com fuga e lá fora está faltando gente pra proteger a população”, disse o deputado Enio Tatto, líder da bancada do PT, se referindo aos 61 presos que fugiram da Penitenciária Nilton Silva, de Franco da Rocha, na segunda-feira. Até o início da madrugada de terça, nenhum detento havia sido capturado. “Essa prepotência que vemos aqui é a forma com a qual o governo cuida da segurança pública de São Paulo”, criticou Tatto.

Saulo de Castro Abreu Filho foi repreendido diversas vezes pela Comissão de Segurança Pública, por desrespeitar os deputados e a Assembléia como um todo. Mas não baixou a crista: “Eu vim aqui para responder a fatos. E todos foram respondidos. Agora, opinião cada um fica com a sua e leva pra casa, distribui ou faz o que quer”, concluiu.

“Este debate nos frustra muito. Saímos daqui sem saber se houve acordo entre o governo e o PCC, se os policiais foram avisados corretamente ou não, se o que aconteceu em janeiro teve conseqüências e foi levado em conta para prevenir o que aconteceu agora. Acho que vamos ter que instalar uma CPI para que o secretário responda às perguntas que não quis responder hoje, para concluirmos se houve ou não crime de omissão, se as atitudes que o governo estadual deixou de tomar não contribuíram para o que aconteceu”, lamentou o deputado Sebastião Arcanjo.

No final, parte dos cerca de quinze apoiadores do secretário, que fizeram barulho durante todo o depoimento – aplaudindo cada frase de Castro e dos deputados governistas e vaiando qualquer colocação da oposição – declarou à imprensa que são membros da juventude do PSDB. A outra, abraçou efusivamente a deputada tucana Rosemary Correia no corredor.

Fonte: Agência Carta Maior