Como o tucanato está destruindo trens e metrôs

Por Wagner Fajardo Pereira*

Está em curso no país um processo de liquidação dos transportes públicos sobre trilhos. Trens e metrôs viraram moeda de barganha, chantagem e de lucro fácil para "empreendedores privados&quot

1 – Tucanos históricos

Os históricos fazem uma verdadeira operação de guerra midiática para divulgar a Parceria Pública Privada (PPP) em torno da Linha 4 do metrô paulista. Esta operação vem sofrendo o questionamento e a oposição dos metroviários de São Paulo que denunciam a garantia de lucro sem risco do capital privado.

Na proposta tucana da PPP, o Estado de São Paulo paga 73% (US$ 922 milhões) de todo o custo da obra, enquanto o "concessionário" fará o grande sacrifício de "investir" 27% (US$ 340 milhões), podendo "explorar" todo o potencial lucrativo do transporte metroviário e todo o seu espaço físico, durante 30 anos.

Com a privatização do metrô, o tucanato paulista dá continuidade ao longo período (desde 1994) de política neoliberal no Estado, que privatizou a energia elétrica, o gás, as rodovias e tem metas ambiciosas de privatização do saneamento e outros serviços públicos.

Ainda é obra dos tucanos históricos o processo de busca de "parceiros privados" para a privatização do Expresso Aeroporto, que liga o metrô com o aeroporto de Guarulhos.

Nesta proposta, o que se pretende é desenvolver um transporte mais elitizado, que mesmo passando pela região leste do município de São Paulo e pelo município de Guarulhos não pretende construir estações para o povo pobre trabalhador desta região utilizar. A tarifa também deverá ser diferenciada para garantir a sustentabilidade — isto é, o operador privado não teria risco de prejuízo, mas o povo trabalhador será excluído por não ter condições de pagar.


2 – Tucanos reciclados

Nesta categoria se enquadram os tucanos que se "aproximaram" do governo Lula e passaram a operar e gerir a liberação dos recursos orçamentários. Entre os integrantes deste time estão o secretário-executivo Murilo Portugal e vários técnicos do Ministério da Fazenda, além do secretário do Tesouro Nacional, Joaquim Levy.

Nos últimos três meses, atropelando a Secretaria de Transporte e Mobilidade do Ministério das Cidades, a direção da CBTU e os trabalhadores que discutiam a viabilização de recursos para a ampliação e construção dos metrôs de Recife, Fortaleza, Salvador e Belo Horizonte, estabeleceram uma agenda de negociações com os governos municipais e estaduais, barganhando a liberação de recursos com o processo de desmonte dos trens urbanos e privatização dos sistemas.

Conseguiram viabilizar seus propósitos em Salvador — cujo secretário municipal de transporte é um tucano histórico — por emio de uma chantagem com o prefeito João Henrique, garantindo recursos do PPI para a construção de metade do metrô mediante a transferência para o município do sistema de trens urbanos, que transporta 20 mil usuários de uma das regiões mais pobres da cidade, sem a garantia dos recursos para a sua recuperação e continuidade.

Segundo os ferroviários baianos, essa medida vai simplesmente fechar os serviços ferroviários na capital baiana.

Outra operação semelhante está se realizando em Fortaleza. O Metrofor, empresa estadual dirigida pelo tucanato cearense, vai receber US$ 580 milhões de dólares para concluir as obras do metrô, com o compromisso de privatização dos serviços.

O Sindicato dos Metroviários de Fortaleza, que foi criado para se contrapor à pelegagem histórica do Sindicato dos Ferroviários do Ceará, já denunciou o processo, mas infelizmente a negociação feita pelos técnicos da Fazenda ignorou todas as opiniões técnicas e está liberando os recursos sem nenhuma garantia de que a obra será concluída e o serviço será, de fato, garantido à população.

Cabe ressaltar que esta turma não dá mole: quem não concorda com as suas condições não deve receber nenhum tostão no orçamento de 2006.

Estão nesta condição os metrôs de Recife e Belo Horizonte, cuja previsão orçamentária para o próximo ano é de Zero — pois não concordaram com as imposições dos técnicos da Fazenda de privatização e estadualização dos sistemas.

Os tucanos reciclados também estão desenvolvendo um movimento dentro dos ministérios da Fazenda e Planejamento para o desmonte dos serviços de trens urbanos operados pela CBTU em Natal, João Pessoa e Maceió.

Em um relatório do Ministério do Planejamento, o técnico Gustavo Teixeira Lino sugere "a adoção de uma estratégia que proponha a desmobilização dos sistemas ao invés de recuperações ou ampliações, pois os aludidos sistemas são de pequeno porte, obsoletos e situam-se em cidades médias.

Se os municípios receberem um valor para transformar os trilhos em uma avenida dotada de corredor de ônibus, por exemplo, estarão mais tendentes a aceitar a transferência do que se a proposta previr a operação de trens urbanos deficitários pelos mesmos."


3 – Tucanos enrustidos

Estes fazem os acordos "governamentais" com o tucanato histórico, prestigiam e dão total autonomia para os tucanos reciclados e fomentam a tese de que tudo isso é necessário para garantir a "estabilidade econômica" — prolongando o máximo possível o modelo neoliberal na macroeconomia, reprimindo todo o investimento produtivo.

Os capitães deste time, os ministros da Fazenda e do Planejamento, Antonio Palocci e Paulo Bernardo, simplesmente ignoram a situação caótica do transporte público nas grandes cidades brasileiras.

Nestes três anos de governo, contingenciaram todos os investimentos, paralisaram as obras de metrô, cortaram recursos de manutenção dos sistemas metroviários e ferroviários operados pela CBTU e agora autorizam a liberação, mas condicionam estes recursos à adoção de um modelo de estadualização e regionalização mais neoliberal que o proposto por FHC.

Além disso, priorizam os investimentos em transporte público nas cidades e Estados em que os sistemas são operados por tucanos históricos, como vimos acima.

O transporte público no Brasil nunca havia sido tratado como política de governo. O governo Lula deu um importante passo ao criar o Ministério das Cidades e deu prioridade para o transporte público urbano. O ministro Olívio Dutra tratou com prioridade os sistemas metro-ferroviários operados pela CBTU e, mesmo enfrentando a lógica neoliberal da Fazendo e do Planejamento, procurou garantir a viabilização e valorização dos serviços.

O atual Ministro das Cidades, Marcio Fortes, tem se mostrado uma pessoa bem distanciada de uma gestão popular e sintonizada com os movimentos sociais, principais impulsionadores da criação e viabilização deste Ministério.

Basta-se em cumprir as políticas dos tecnocratas do Planejamento e da Fazenda, ignorando inclusive as opiniões dos técnicos e gestores do seu próprio Ministério.

Na 2ª Conferência das Cidades temos que exigir a reorientação destas políticas, colocando o transporte urbano metro-ferroviário no lugar que ele merece, garantindo este importante instrumento de mobilidade e desenvolvimento dos grandes centros urbanos, que estrutura e permite um transporte de qualidade para o povo trabalhador.

* Metroviário de São Paulo, presidente da
Federação Nacional dos Metroviários

Fonte: www.sindmetro-pe.com.br/