Sociólogo acredita que uso politico do futebol não funciona

O sociólogo Ronaldo Helal publicou na edição de hoje (16) do jornal O Globo um artigo no qual traça um histórico da relação entre os últimos campeonatos mundiais de futebol e o processo eleitoral btrasileiro. a

Futebol, eleições e nação


RONALDO HELAL

Começa mais uma Copa do Mundo e uma velha pergunta vem à tona: uma conquista ou uma derrota do Brasil influencia o resultado das eleições presidenciais? Soa inteligente responder afirmativamente. No entanto, as últimas evidências demonstram justamente o contrário. Em 1998, o Brasil perdeu de 3 a 0 para a França na final e Fernando Henrique Cardoso se reelegeu facilmente ainda no primeiro turno. Em 2002, o Brasil venceu a Alemanha por 2 a 0 na final, sagrando-se pentacampeão, e o candidato da oposição, Luis Inácio Lula da Silva, ganhou as eleições.

Certamente alguns governos totalitários se utilizaram do futebol para fins políticos, como o Brasil em 1970 e a Argentina em 1978. Porém, o uso deste esporte com tais propósitos nem sempre foi eficaz. Mesmo após a conquista do tricampeonato em 1970, por exemplo, o partido da oposição — o então MDB — venceu as eleições de 1972 e 1974. A equação futebol-política não se sustenta com as evidências. O futebol é o “ópio do povo” porque paramos para ver o Brasil na Copa. Bem, então seria o ópio das elites também, já que elas também param neste período. Sem contar que em vários países o mesmo ocorre. Se seguirmos com a idéia de que este esporte “narcotiza” a população em tempos de Copa porque não se pensa em outra coisa por estes dias, temos que admitir então que o sexo, as novelas, o carnaval, a praia e o chope com os amigos também seriam o “ópio do povo”. Ou se pensa em política quando fazemos sexo?

Houve um tempo em que uma frase do genial dramaturgo e cronista esportivo, Nelson Rodrigues, possuía forte eficácia simbólica: “A seleção brasileira é a pátria de chuteiras.” A derrota da seleção em 1950 e a conquista do tricampeonato em 1970 foram vistas como derrota e vitória de um projeto de nação brasileira. No entanto, devido à globalização e à consolidação da democracia no país, as vitórias em 1994 e 2002 e a derrota em 1998 não transcenderam o terreno esportivo e foram comemoradas e sofridas como vitórias e derrotas esportivas.

Claro que a Copa do Mundo possui uma estrutura e narrativa que estimula os nacionalismos. O encanto desta competição se encontra justamente no fato de que acreditamos em uma “bobagem”: que as nações estão representadas por 11 jogadores. O futebol não é a nação, mas a crença de que ele o é move as paixões durante um Mundial. Isto não significa que o resultado final afeta as eleições presidenciais no Brasil. As evidências têm, freqüentemente, demonstrado o contrário.

RONALDO HELAL é sociólogo e professor da Faculdade de Comunicação Social da Uerj.