Zuenir Ventura: “Copa não dá votos, nem tira”

De que maneira a performance do Brasil na Copa do Mundo influenciará nas eleições de outubro? Como esse resultado afetará o projeto de reeleição de Lula? “A influência é zero”, garante Carlos Augus

Até conheço quem não gosta de futebol e que em dia de jogo da Seleção vai para o cinema, para a praia ou simplesmente passeia pelas ruas, aproveitando que as cidades ficam vazias inclusive dos bandidos, que nessas horas também preferem a televisão. A regra, porém, é gostar de futebol – gostar, não, ser fanático. Só que isso parecia ser apenas no Brasil, onde o antigamente chamado “esporte bretão” mistura várias emoções: cívica, religiosa, patriótica, carnavalesca. A síntese foi dada, pra variar, por Nelson Rodrigues: a seleção é “a pátria de chuteiras”. A Copa de 2006 provou que não acontece só com a nossa pátria, mas praticamente com todas.

A grande surpresa nesse quesito foi a Alemanha. Como imaginá-la se comportando tal qual o Brasil? Pessoas empunhando a bandeira nas ruas? Nem pensar. Ou pior, pensava-se, sim, mas em algo traumático, nas atrocidades cometidas pelo nazismo, acompanhadas da manipulação dos símbolos nacionais. “A Copa já mudou a Alemanha”, escreveu Graça Magalhães-Ruether, correspondente do “Globo” lá, no início da competição. “Mesmo quem não é fanático por futebol tem exibido a bandeira alemã na entrada de casa, nos carros ou nas bicicletas.”

O colunista Ancelmo Góis também se impressionou com o que viu logo depois da vitória alemã sobre o Equador por 3 x 0: “Acredite. Parecia um pouco – pela alegria, pelo entusiasmo e pelo patriotismo – as cidades brasileiras depois de uma vitória de nosso time.” Ele conclamava o “pessoal de ciências políticas” para refletir melhor sobre isso, concluindo que o futebol estava devolvendo ao povo alemão “um pouco de amor à pátria” e ajudando-o a enfrentar sua “crise de auto-estima e vergonha” em conseqüência de um passado altamente constrangedor. Mas por que isso não aconteceu em 1974, quando a Alemanha também sediou a Copa e, mais, foi campeã?

Preocupada com a possibilidade de que essas saudáveis manifestações de patriotismo pudessem se transformar em atos de xenofobia contra imigrantes, Graça entrevistou o grande filósofo Peter Sloterdijk, que desfez os temores: “O que vemos na Alemanha não é nacionalismo, mas patriotismo de lazer. O uso da bandeira não é político. É um símbolo da alegria pelo futebol”. A diferença entre 2006 e 1974, segundo ele, está na forma: a alegria seria a mesma, mas não sua manifestação. Naquela época, com o país dividido, ainda havia “bloqueio” em relação aos símbolos nacionais – um pouco como aconteceu quando a nossa seleção ganhou a Copa em 1970, em pleno governo Médici, auge do regime militar.

Se o primeiro semestre de 2006 foi do futebol, o segundo será da política. De que maneira o resultado da Copa influenciará nas eleições? Como afetará o projeto de reeleição de Lula? “A influência é zero”, me garantiu Carlos Augusto Montenegro, presidente do Ibope e que conhece como poucos o comportamento do eleitor brasileiro. Alguns exemplos para reforçar sua tese: em 98, a seleção perdeu e FH se elegeu; em 2002, ganhamos e o presidente não fez o sucessor. Assim, aquela história de que um astral pós-Copa pode favorecer ou prejudicar o governo não funciona. Quem decide eleição, garante Montenegro, não é Copa, mas a economia.

Fonte: No Mínimo