A esquerda vai continuar crescendo? Tendências e incógnitas

Por Bernardo Joffily*

Enquanto a eleição presidencial de outubro polariza a maioria das atenções, os observadores políticos mais atentos querem saber o que vai acontecer com o Congresso, particularmente com a C&acirc

O gráfico e a tabela acima espelham as votações dos 11 maiores partidos brasileiros nas cinco eleições para a Câmara desde o fim da ditadura. A tabela dá os números percentuais de cada sigla, em cada eleição, dentro do total de votos válidos. O gráfico apresenta visualmente a mesma evolução.

As siglas foram agrupadas conforme um critério objetivo, seu engajamento na eleição presidencial deste ano: o bloco pró-Lula, o bloco pró-Alckmin e o campo internediário, onde apenas o PDT lança candidato próprio à Presidência (o Psol só foi fundado no ano passado).

20 anos de ascenção da esquerda

A grosso modo, ele mostra um crescimento sustentado das forças de esquerda na Câmara ao longo destas duas décadas. PT, PCdoB e PSB somavam 8,5% dos votos válidos para deputado federal em 1986; vinte anos depois, chegavam a 25,9%. Caso se inclua o PDT e o PPS, que não apóiam Lula mas reivindicam a filiação de esquerda, a evolução é de 15,9% para 34,1%.

A “área intermediária”, composta basicamente por forças de centro, inicia o gráfico com estrondosos 70,4% da votação válida para a Câmara, sobretudo graças aos 47,8% do PMDB. Vai porém emagrecendo eleição a eleição, embora ainda some 35,2%, mais que os partidos do campo pró-Lula. Na verdade, em grande parte, a começar pelo PMDB, ela se inclina para apoiar a reeleição do presidente, mas este seria um fenômeno dificilmente retratável no gráfico acima.

Por fim, o bloco conservador pró-Alckmin, formado pelo PSDB-PFL e reforçado no último dia 19 com o apoio informal do PPS. Ele vai crescendo, de 18,6% em 1986 até 36,1% no seu auge, na reeleição de Fernando Henrique em 1998, e cai para 30,8% em 2002. Sem o recém-acoplado PPS, os números são 17,7%, 34,8% e 27,7%.

Previsões: para todos os gostos

Que destino os eleitores darão a estas forças nas urnas de outubro? Há previsões para todos os gostos.

O PT, que elegeu a maior bancada partidária em 2002 (91 deputados, hoje reduzidos a 83) deverá pagar um preço pelo seu envolvimento nas denúncias do “mensalão”, fartamente divulgadas pela mídia nos últimos 13 meses. Cálculos petistas, porém, acreditam que o baque deve se circunscrever a São Paulo e Minas Gerais. E esperam que ele seja compensado por um crescimento no Nordeste e Rio Grande do Sul.

O PSB colocou como prioridade absoluta nesta eleição atingir a cláusula de barreira de 5% e para tanto forçou a candidatura de seu maior capital eleitoral, Ciro Gomes, a deputado federal. Espera com isto chegar a 30 ou até 40 deputados, contra 22 em 2002. Também sob ameaça da cláusula, o PCdoB calcula poder passar de 12 para até 20 eleitos.

PMDB quer voltar a ser o maior

O PMDB, que se mantém como o grande partido do centro, passou a ser a noiva cortejada por todos nesta eleição presidencial. Sem candidato a presidente e priorizando projetos locais, tende a eleger mais deputados que os 74 de 2002. As previsões alcançam até 110. Outros partidos da “área intermediária”, em especial o PL, PTB e PP, tendem a perder votos e cadeiras, inclusive com uma migração pós-eleição, possivelmente para o PMDB. Este tem chances portanto de voltar a ter a maior bancada da Câmara, como teve em 1990 e em 1994, embora distante da apoteose de 1986 (200 deputados).

O PFL e o PSDB, que em 1998 chegaram a eleger as duas maiores bancadas da Câmara (com 105 e 99 deputados, respectivamente), têm andado ladeira abaixo. Em 2002 elegeram 84 e 75 deputados. Com a erosão advinda da peda do governo central, passaram para 65 e 58. Esperam uma recuperação, graças à sua contra-ofensiva durante a crise de 2005. O PFL, sem candidato presidencial, concentrou-se em projetos locais e almeja chegar a 90 deputados. O PSDB faz fé em fortes bancadas vindas de Minas e São Paulo para atingir até 85 cadeiras.

O Psol, em contraste com a preformance da senadora Heloísa Helena (AL) nas pesquisas presidenciais, tem grande dificuldade para eleger deputados. Por isso concentrou-se no Rio de Janeiro, para onde se transferiu o deputado Babá, e onde espera eleger dois federais. Tem alguma chance também no Rio Grande do Sul e Pará.

Soma que não dá 513

Estes números somam muito mais que as 513 cadeiras da Câmara. O eleitor se encarregará de podá-los.

Mas a poda será forçosamente desigual: poderá manter a tendência das últimas duas décadas, de crescimento da esquerda às custas do centro e da direita, ou, ao contrário, revertê-la. Em 1º de outubro veremos.

A ascenção eleitoral da esquerda no Brasil, porém, não se limita às duas últimas décadas. No interessante livro “Eleições no Brasil pós-64” (Global Editora, 1984), Raimundo Oliveira, José Carlos Ruy e Álvaro Caropreso demonstram, com profusão de dados, que ela vem de bem antes, desde a democratização de 1945. Truncada pelo golpe militar, ressurgiu em seguida, até o fim da ditadura – o que soma uma linha do tempo de quase três gerações…

Nota: a fonte usada para o gráfico e a tabela é o sítio de Jairo Nicolau, professor do Iuperj, de longe a melhor sinopse estatística disponivel na internet sobre eleições no Brasil; visite-o em http://jaironicolau.iuperj.br/