Colombianas se unem por filhos sumidos

Inspiradas por argentinas, mães cujos filhos foram seqüestrados por paramilitares se encontram semanalmente diante de igreja. As mães da Candelária se unem para cobrar pistas e exigir justiça; grupo, criado em 1999 em Medellín, ensaia ampliação para todo

No átrio da igreja de Nossa Senhora da Candelária, mulheres exibem camisetas com as fotos de parentes e empunham cartazes que condenam a violência e exigem justiça.
Embora a cena nos remeta aos protestos de familiares de vítimas da violência carioca, ela acontece todas as quartas-feiras em Medellín, na Colômbia, e guarda mais relações com Buenos Aires do que com o Rio.


 


A Candelária colombiana, fruto de ao menos 40 anos de conflito armado interno no país e, principalmente, dos enfrentamentos entre a guerrilha e grupos paramilitares, é uma espécie de “franquia” das Mães da Praça de Maio da Argentina.


 


Como as mães argentinas, que há 30 anos cobram o paradeiro dos filhos que sumiram durante a última ditadura militar (1976-83), as colombianas repetem, há oito anos e meio, o ritual na igreja para chamar a atenção para o seqüestro ou “desaparecimento” de filhos e parentes -90% dos episódios atribuídos às AUC (Autodefesas Unidas da Colômbia), a poderosa rede paramilitar que começou a entregar as armas em 2003, e 10% às guerrilhas de esquerda (Farc e ELN).


 


“As Mães da Praça de Maio foram o exemplo. Agora estamos sempre em contato com elas. Vimos que era preciso nos organizar como vítimas para sermos ouvidas”, conta a funcionária pública Teresita Gaviria, 55, que criou a “Associação Caminhos da Esperança Mães da Candelária”, em 1999.


 


No ano anterior, o filho de Teresita, Christian, então com 15 anos, havia sido levado por um grupo armado em Medellín. Nunca mais foi visto.


 


Segundo a mãe, que diz ter informações confiáveis de que o filho foi seqüestrado pelos paramilitares, o rapaz era um estudante comum, sem vinculações políticas ou com o tráfico.


 


A Teresita se juntou María Eugenia Cobaleda, cujos dois irmãos desapareceram também em 1998, e mais um punhado de pessoas com histórias parecidas. “Íamos à polícia e éramos vistas como velhas loucas, choronas.”


 


Naqueles anos, ela lembra, desapareceram muitos civis na Colômbia -atualmente, não se sabe o paradeiro de 4.177 pessoas no país, segundo a vice-presidência, e outros 2.000 estão seqüestrados pela guerrilha ou por quadrilhas comuns.


 


Prêmio e ameaças


 


No começo de 1999, o grupo resolveu colar cartazes no metrô de Medellín, mas foi impedido. Foi quando as mulheres resolveram tentar a Igreja de Nossa Senhora da Candelária.


 


A estratégia funcionou. Agora, a organização conta com 267 parentes de “desaparecidos” e seqüestrados e, em 2006, ganhou o Prêmio Nacional de Paz, conferido pela ONU e por um grupo de jornais e ONGs colombianos. Recebem verba da prefeitura de Medellín e até do governo espanhol para trabalhar com famílias de vítimas e de deslocados internos.


 


Mas os tormentos do grupo, espelho da situação colombiana, não acabaram. As AUC negociaram com o governo Álvaro Uribe e desmobilizaram seu exército paramilitar há quatro anos. Mas os depoimentos dos “paras” presos pouco contribuíram na busca das mães.


 


Além disso, há indícios de que, mesmo presos, os “paras” continuam articulando negócios e ameaçando pessoas. E o vácuo deixado pelas AUC é ocupado, em algumas áreas, por “herdeiros” ou por quadrilhas comuns.


 


Os tormentos de Teresita tampouco foram aliviados. Apesar do reconhecimento, ela passou a sofrer ameaças de morte: disseram que matariam seu outro filho. Há um mês, foi seu irmão quem desapareceu.


 


Agora, ela anda com escolta da polícia de Medellín, que a acompanha noite e dia e vigia a casa onde ela mora sozinha.


 


Há três meses, a escolta também viaja com a mãe da Candelária pelo país. Apoiada pela ONG Redepaz, agora a organização se prepara para virar um movimento nacional.


 


Na última quinta-feira (21), Teresita se reunia com 60 parentes de vítimas do oeste colombiano. Foi quando o movimento, homenageou, por acaso, suas inspiradoras: a cidade do Departamento de Cauca que viu nascer um embrião das Mães de Candelária chama-se Buenos Aires.