Qual será o tamanho da crise?
A Bolsa de Valores de São Paulo se recuperou no fim desta quinta-feira (16), acompanhando a moderação da queda na Bolsa de Nova York: 2,58%, para 48.015,6 pontos. No seu ponto mais baixo do dia, chegou a perder 8,82%. “É exatamente o efeito manada”,
Publicado 16/08/2007 20:27
No sexto dia útil de queda das bolsas do blaneta (veja o mapa), o Federal Reserve (ou Fed, banco central dos Estados Unidos) injetou mais US$ 17 bilhões no sistema bancário do país. E disse que se precisar põe mais dinheiro. Na quarta-feira foram US$ 7 bilhões, na sexta-feira passada US$ 24 bilhões e na véspera US$ 38 bilhões.
Countrywide, o susto do dia
Os outros bancos centrais das metrópoles financeiras (sobretudo o da União Européia) jogaram ainda mais pesado. Até se articularam, numa operação conjunta, exceto o britânico. É curioso ver como esses templos da “livre iniciativa” se comportam quando a mão invisível do mercado se atrapalha.
Ainda assim a Bolsa de Valores de Nova York fechou o dia com o índice Dow Jones em queda de 0,12%. A Bolsa Nasdaq fechou em queda de 0,32%. Só o S&P 500, depois de recuar mais de 2,3%, fechou em alta, de 0,32%. Na Bolsa de São Paulo, o sexto dia útil de perdas fez o Ibovespa acumular 18,6% de recuo, apesar da recuperação parcial do pregão de quinta-feira.
O susto do dia foi dado pelo maior banco de crédito à habitação dos Estados Unidos, a Countrywide Financial, que fez um empréstimo de emergência de US$ 11,5 bilhões para enfrentar um problema de liquidez (falta de dinheiro) e proteger sua divisão bancária, o Countrywide Bank. A notícia gerou a suspeita de que a Countrywide pode entrar em concordata.
Os analistas concordam que, se a crise infeccionar a economia real, será pela vertente do mercado imobiliário estadunidense. E as notícias nesse front são ruins. O Departamento do Comércio informou hoje que a construção de casas nos EUA teve queda de 6,1% em julho, em comparação com junho, e um tombo de 20,9% em relação ao número de 12 meses atrás.
O transatlântico de Mantega
Guido Mantega procurou apaziguar os ânimos. “Estamos, eu poderia dizer, no olho do furacão. E no olho do furacão as coisas parecem piores”, garantiu. “Quando tem uma queda de ativos, os computadores das mesas de operação acendem a luzinha do stop loss e aí vem a ordem de venda dos ativos. Quando esta se dá em grande escala, ocorre o efeito manada. O que estamos vendo hoje é exatamente o efeito manada”, disse ainda.
Mantega prefere chamar o que está acontecendo “turbulência”, embora às vezes deixe escapar a palavra “crise”. E é taxativo sobre as condições do Brasil para enfrentá-la: “Uma coisa é você enfrentar um mar revolto em um barquinho de madeira, fazendo água. Outra coisa é você enfrentar um mar revolto em um belo transatlântico. Nós estamos nesse momento em um transatlântico resistente, bem construído, com bastante lastro a bordo. Portanto, nós estamos sentindo menos o efeito das ondas”, asseverou.
Não só o Brasil mas “todos os países emergentes estão em uma situação bem robusta”, disse o ministro. E fez uma crítica ao FMI (Fundo Monetário Internacional), por não ter aprovado linhas de contingenciamento de fácil liberação em uma emergência. “Temos que trabalhar quando o tempo está bom. Quando chove, fica difícil consertar as goteiras do telhado”, argumentou.
Ministros são pagos para serem otimistas
É fato que o Brasil e os principais países em desenvolvimento reduziram sua vulnerabilidade externa da década passada. Têm reservas bem mais confortáveis e até superávits no balanço de transações correntes.
Mas os ministros da Fazenda são por dever de ofício maus comentaristas da área econômica. Afinal, são pagos para ver as coisas com os óculos do mais impenitente otimismo, até porque suas palavras pesam no estado de nervo dos investidores.
Um prolongamento da crise monetária pode sim afetar o Brasil. Boa parte dos investimentos externos que têm oxigenado a economia brasileira vem do carry trade – o artifício em que os investidores tomam empréstimos em moedas com juros baixos, como o yen japonês, para investir em moedas de retornos elevados. Em um cenário tempestuoso, esse fluxo pode virar, fazendo do Brasil uma vítima da fuga de capitais.
Ainda é difícil responder com segurança qual será a profundidade da crise – embora os não-ministros não precisem recorrer a metáforas como “turbulência”. Ela pode refluir e se revelar apenas mais um susto, sem comprometer a fundo o ciclo de crescimento econômico mundial que já dura há seis anos. Mas pode também fazer soar a hora da verdade para a exuberância consumista da maior economia da Terra, a norte-americana; e aí de pouco adiantará o Brasil alegar que fez o dever de casa.