Parentes de vítimas da tragédia da TAM criarão associação
Para agilizar o reconhecimento de corpos, o pagamento de indenizações e acompanhar os desdobramentos sobre o maior acidente aéreo brasileiro – ocorrido há um mês (17 de julho), quando um avião da TAM chocou-se com um prédio da companhia deixando 199 morto
Publicado 17/08/2007 19:01
Segundo o jornalista Roberto Corrêa Gomes, irmão de Mário Gomes – uma das vítimas do acidente – a idéia de fundar a associação é para agilizar os processos de indenização as famílias. “Se precisássemos entrar com uma ação, teríamos de recolher procurações de todo mundo. Tem de ser uma pessoa jurídica representando todas as famílias”, disse. A entidade ainda não tem nome oficial.
A nova associação a ser criada será a segunda do mesmo tipo no Brasil. A primeira, chamada de Abravaa (Associação Brasileira de Parentes e Amigos de Vítimas de Acidentes Aéreos), foi fundada em 1996 por Sandra Assali, uma das lideranças do Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros, o “Cansei”.
Sandra criou a Abravaa quando perdeu seu marido no acidente do Fokker da TAM em 1996. A entidade está acompanhando mais de 30 casos de acidentes aéreos e defende o aumento do valor de indenização às famílias para R$ 150 mil por vítima – atualmente o valor previsto é R$ 14 mil para adultos e R$ 7 mil para crianças.
“Nós, como sociedade civil, não fazemos idéia da força que temos quando unidos. O que me leva a apoiar o movimento é a indignação. A indignação para buscar mudanças”, disse justificando a sua participação no Cansei, em recente atividade realizada na OAB-SP.
Possivelmente, em função da sua indignção, Sandra acabou sendo condenada pela 2º Vara Cível de Limeira (SP) em janeiro de 2006 a pagar R$ 9 mil reais ao advogado Renato Guimarães Junior por danos morais. No período, Guimarães Junior orientou as famílias das vítimas do acidente de 96 a não aceitar a indenização de uma companhia americana de U$ 40 milhões de dólares, a serem divididos entre 65 famílias. Sandra era favorável a proposta da empresa e passou a insultar o advogado durante o processo de negociação.
Apesar da denúncia de Ana Queiroz, mãe de Arthur Queiroz, vítima do acidente de julho de 2007, de que “as famílias estão sendo usadas pelo Cansei” nesta sexta – na manifestação do movimento em SP – Gomes não descarta pedir orientações a Abravva para a criação da nova associação.
Justiça lenta
Um mês depois da tragédia as famílias continuam lutando por seus direitos. A indenização prometida pela TAM tem tirado o sono dos familiares que não vencem as exigências burocráticas. Num gélido cálculo que estima o valor da vida, centenas de pessoas receberão, nos próximos anos, um valor que ainda será discutido na Justiça.
A veterinária de Santa Maria (RS) Liege Dembinski, filha da professora Elida Dembinski, uma das vítimas, passou 12 horas tentando viajar de avião a São Paulo, onde participaria de uma reunião com outras famílias e representantes da companhia aérea envolvida no acidente, mas não conseguiu. Apesar das despesas serem custeadas pela TAM não havia lugar no avião que saiu da cidade e Liege teve que viajar de ônibus. “Como se não bastasse todo o sofrimento, ainda temos de passar por isso”, lamentou.
As lágrimas derramadas pelo acidente com o avião da TAM não podem ser medidas, mas a dor da perda pode ter um preço. Deve demorar. Apesar de parte da indenização já ter sido paga na segunda-feira (13) a uma família de vítima do vôo 3054, cinco anos é o prazo mínimo estimado pelo advogado e especialista em responsabilidade civil Luiz Roberto de Arruda Sampaio.
Ele também orientou parentes de algumas das 99 vítimas do acidente da TAM em 1996, e afirma que passados 11 anos alguns deles ainda brigam na Justiça. Sampaio diz que a indenização pode variar de R$ 500 mil a R$ 3 milhões, dependendo da vítima e de onde o processo corre.
Velório sem corpo
Outras famílias, para além dos processos burocráticos pela indenização, ainda enfrentam outros problemas. Passados 30 dias do acidente, cinco corpos ainda não foram identificados pelo IML (Instituto Médico Legal). As famílias afirmam enfrentar um “velório constante sem corpo”.
“A gente fala com eles toda hora, telefona, tenta dar ajuda”, disse Roberto Corrêa Gomes. “Eu precisei esperar 20 dias para poder enterrar meu irmão. Você não imagina a dor de não poder dizer adeus.”
Enquanto isso, os médicos-legistas tentam acalmar os familiares. “A nossa responsabilidade é do tamanho dessa tragédia”, disse Celso Perioli, superintendente da Polícia Técnico-Científica. “A nossa missão só estará cumprida quando os 199 forem reconhecidos.”
Congresso Nacional
A Abravva, a partir do acidente do dia 17, organizou ações com familiares das vítimas do acidente de 1996 em julho. Eles tentaram promover um boicote às companhias e foram á CPI Aérea (Comissão Parlamentar de Inquérito), instalada no Congresso Nacional, pedir o aumento do valor obrigatório de indenização ás vítimas de acidentes aéreos.
A entidade sugere pelo menos cinco orientações a famílias que enfrentam tragédias envolvendo acidentes com companhias:
1) Fazer o inventário da vítima;
2) Procurar o seguro obrigatório embutido na passagem aérea, cerca de R$ 14 mil;
3) Contratar um advogado especializado em acidentes aéreos;
4) Ao calcular o valor da indenização, levar em conta principalmente valores como escola dos filhos, seguro-saúde, gastos com educação complementar (cursos, esportes), atendimento psicológico;
5) Solicitar à Justiça a indenização na forma de tutela antecipada, quando a companhia aérea faz um depósito mensal até que o processo seja julgado.