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Folha: Lewandowski afirma que ''imprensa acuou o Supremo''

 ''A imprensa acuou o Supremo'' e ''todo mundo votou com a faca no pescoço'', teria afirmado o ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Ricardo Lewandowski, em telefonema particular ''inteiramente testemunhado'' pelo jornal Folha de S.Paulo<

Conforme a Folha, Lewandowski conversava com um interlocutor não identificado, de nome ''Marcelo'', sobre o resultado do julgamento que aceitou as denúncias contra os 40 acusados no Caso ''Mensalão''. O ministro teria dito também que  ''a tendência era amaciar para o Dirceu''.



''Você não tenha dúvida''



O telefonema ocorreu por volta das 21h35 de terça-feira (28). Lewandowski jantava, acompanhado, no recém-inaugurado restaurante Expand Wine Store by Piantella, na Asa Sul, em Brasília. Conforme a Folha, a repórter Vera Magalhães, que assina a matéria, estava no jardim externo do restaurante e ouviu a conversa do ministro ao celular.



''Na conversa de cerca de dez minutos com Marcelo, opinou que a decisão da Corte poderia ter sido diferente, não fosse a exposição dos diálogos. 'Você não tenha dúvida', repetiu em seguidas ocasiões ao longo da conversa'', segundo relata a repórter.



O jornal recorda que ''Lewandowski foi o único a divergir do relator, Joaquim Barbosa, quanto à imputação do crime de formação de quadrilha para o ex-ministro da Casa Civil e deputado cassado José Dirceu''. A matéria especifica que ''Enrique Ricardo Lewandowski, 58, foi o quinto ministro do STF nomeado por Lula, em fevereiro do ano passado''. Uma nota ao lado, lembra ainda que a ''primeira-dama é amiga da mãe de Lewandowski'', dando a entender que Marisa, a mulher de Lula, teria tido influência na escolha.



Novo capítulo da pressão



A manchete da Folha de S.Paulo, depois daquela do Globo, dá a medida de como será o comportamento da mídia nos longos meses que se seguirão, de julgamento do processo no Supremo. Em seu principal editorial do dia, a mesma Folha, obtida a inclusão dos 40 ''quadrilheiros'' como réus, passa ao capítulo seguinte da cadeia de pressões.



Para o editorialista, ''a mais imediata preocupação'' agora é uma oitiva ''ágil'', para acelerar o julgamento, embora reconheça contristada que ''existe a expectativa de que ele se prolongue por mais de dois anos''. Transmite também o que julga ser a tarefa do procurador-geral da República: ''demonstrar de modo irrefutável os elos da cadeia de comando'' que ligariam ''chefes do calibre de José Dirceu'' aos ''operadores materiais dos delitos do mensalão, de maneira a instruir uma eventual condenação''.



Veja a íntegra da matéria da Folha de S.Paulo:




''Tendência era amaciar para Dirceu'', diz ministro do STF



Lewandowski afirma que ''imprensa acuou o Supremo'' no julgamento do mensalão
''Todo mundo votou com a faca no pescoço'', declara o autor do único voto contra a imputação do crime de quadrilha ao petista



Vera Magalhães, do Painel, em Brasília



Em conversa telefônica na noite de anteontem, o ministro Ricardo Lewandowski, do STF (Supremo Tribunal Federal), reclamou de suposta interferência da imprensa no resultado do julgamento que decidiu pela abertura de ação penal contra os 40 acusados de envolvimento no mensalão. ''A imprensa acuou o Supremo'', avaliou Lewandowski para um interlocutor de nome ''Marcelo''. ''Todo mundo votou com a faca no pescoço.'' Ainda segundo ele, ''a tendência era amaciar para o Dirceu''.
Lewandowski foi o único a divergir do relator, Joaquim Barbosa, quanto à imputação do crime de formação de quadrilha para o ex-ministro da Casa Civil e deputado cassado José Dirceu, descrito na denúncia do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, como o ''chefe da organização criminosa'' de 40 pessoas envolvidas de alguma forma no escândalo.



O telefonema de cerca de dez minutos, inteiramente testemunhado pela Folha, ocorreu por volta das 21h35. Lewandowski jantava, acompanhado, no recém-inaugurado Expand Wine Store by Piantella, na Asa Sul, em Brasília.



Apesar de ocupar uma mesa na parte interna do restaurante, o ministro preferiu falar ao celular caminhando pelo jardim externo, que fica na parte de trás do estabelecimento, onde existem algumas mesas -entre elas a ocupada pela repórter da Folha, a menos de cinco metros de Lewandowski.



A menção à imprensa se deve à divulgação na semana passada, pelo jornal ''O Globo'', do conteúdo de trocas de mensagens instantâneas pelo computador entre ministros do STF, sobretudo de uma conversa entre o próprio Lewandowski e a colega Cármen Lúcia.



Nos diálogos, os dois partilhavam dúvidas e opiniões a respeito do julgamento, especulavam sobre o voto de colegas e aludiam a um suposto acordo envolvendo a aposentadoria do ex-ministro Sepúlveda Pertence e a nomeação -que veio a se confirmar- de Carlos Alberto Direito para seu lugar. Lewandowski chegou a relacionar o suposto acordo ao resultado do julgamento.



Ontem, na conversa de cerca de dez minutos com Marcelo, opinou que a decisão da Corte poderia ter sido diferente, não fosse a exposição dos diálogos. ''Você não tenha dúvida'', repetiu em seguidas ocasiões ao longo da conversa.



O fato de os 40 denunciados pelo procurador-geral terem virado réus da ação penal e o dilatado placar a favor do recebimento da denúncia em casos como o de Dirceu e de integrantes da cúpula do PT surpreenderam advogados de defesa e o governo. Na véspera do início dos trabalhos, os ministros tinham feito uma reunião para ''trocar impressões'' sobre o julgamento, inédito pelo número de denunciados e pela importância política do caso.



Em seu voto divergente no caso de Dirceu, Lewandowski disse que ''não ficou suficientemente comprovada'' a formação de quadrilha no que diz respeito ao ex-ministro. ''Está se potencializando o cargo ocupado [por Dirceu] exatamente para se imputar a ele a formação de quadrilha'', afirmou.



Enrique Ricardo Lewandowski, 58, foi o quinto ministro do STF nomeado por Lula, em fevereiro do ano passado, para o lugar de Carlos Velloso. Antes, era desembargador do Tribunal de Justiça de SP.



No geral, o ministro foi o que mais divergiu do voto de Barbosa: 12 ocasiões. Além de não acolher a denúncia contra Dirceu por formação de quadrilha, também se opôs ao enquadramento do deputado José Genoino nesse crime, no que foi acompanhado por Eros Grau.



No telefonema com Marcelo, ele deu a entender que poderia ter contrariado o relator em mais questões, não fosse a suposta pressão da mídia. Ao analisar o efeito da divulgação das conversas sobre o tribunal, disse que, para ele, não haveria maiores conseqüências: ''Para mim não ficou tão mal, todo mundo sabe que eu sou independente''. Ainda assim, logo em seguida deu a entender que, não fosse a divulgação dos diálogos, poderia ter divergido do relator em outros pontos: ''Não tenha dúvida. Eu estava tinindo nos cascos''.



Lewandowski fez ainda referência à nomeação de Carlos Alberto Direito, oficializada naquela manhã pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Negou ao interlocutor que fizesse parte de um grupo do STF contrário à escolha do ministro do Superior Tribunal de Justiça para a vaga de Pertence, como se depreende da conversa eletrônica entre ele e Cármen Lúcia. ''Sou amigo do Direito. Todo mundo sabia que ele era o próximo. Tinha uma campanha aberta para ele.''



Ainda em tom queixoso, gesticulando muito e passando várias vezes a mão livre pela vasta cabeleira branca enquanto falava ao celular, Lewandowski disse que a prática de trocar mensagens pelos computadores é corriqueira entre os ministros durante as sessões. ''Todo mundo faz isso. Todo mundo brinca.''



Já prestes a encerrar a conversa, o ministro, que ainda trajava o terno azul acinzentado e a gravata amarela usados horas antes, no último dia de sessão do mensalão, procurou resignar-se com a exposição inesperada e com o resultado do julgamento. ''Paciência'', disse, várias vezes. E ainda filosofou: ''Acidentes acontecem. Eu poderia estar naquele avião da TAM''.



Além dos trechos claramente identificados pela reportagem, a conversa teve outras considerações sobre o julgamento, cuja íntegra não pôde ser depreendida, uma vez que Lewandowski caminhou para um lado e para outro durante o telefonema.
Logo após desligar, ao voltar para o salão principal do restaurante, Lewandowski se deteve para cumprimentar um dos proprietários, o advogado Antonio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, figura muito conhecida em Brasília e amigo de vários advogados e políticos -entre eles o próprio Dirceu, citado na conversa.



Lewandowski ficou pouco mais de uma hora no restaurante. A Expand Wine Store by Piantella é um misto de loja de vinhos, restaurante e bar localizada na quadra 403 Sul, no Plano Piloto. Pertence ao mesmo grupo de proprietários do Piantella, o mais tradicional restaurante da capital federal, ponto de encontro de políticos.



Só depois da conversa com Marcelo é que Lewandowski sentou-se e fez os pedidos: uma garrafa de vinho argentino Santa Júlia, R$ 49 segundo o cardápio, uma porção mista de queijos e outra de presunto, cada uma ao preço de R$ 35. No telão localizado às costas do ministro, eram exibidos DVDs musicais -um show do grupo Simply Red e uma apresentação da cantora Ana Carolina.



Fonte: Folha de S.Paulo