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O Bloco de Esquerda precisa se transformar numa referência política importante

Falando na abertura da 8ª Reunião do Comitê Centrall, na sexta-feira, Renato Rabelo analisou as conjunturas mundial e nacional; para ele, é fundamental que, em 2008, o Bloco seja uma referência política.


Por José Carlos Ruy

Com uma análise da situação internacional, da conjuntura política brasileira e das tarefas atuais do PCdoB, o presidente nacional do Partido, Renato Rabelo abriu, nesta sexta-feira, em São Paulo, a 8ª Reunião do Comitê Central, que vai debater até domingo uma extensa pauta que inclui o projeto eleitoral para 2008, a estruturação partidária, o movimento social e a luta pela paz.



2008: um teste para o Bloco de Esquerda



Ao tratar do embate político, Renato Rabelo destacou a análise da luta da oposição contra o governo, que tentou alcançar a presidência do Senado através dos ataques contra Renan Calheiros, num confronto que ainda não está resolvido: a oposição, disse ele, quer a presidência do Senado. E tenta também investir contra o presidente da República no episódio da votação para a renovação da CPMF, e procura impor ao governo determinadas condições para aceitá-la.


O foco da oposição é a disputa presidencial de 2010, e ela vai embalada pela perspectiva de eleger o suicessor de Lula. Há dois polos de poder no país, lembrou Renato Rabelo. Um está em Brasília, no poder executivo, com Lula à frente. O outro está em São Paulo, centrado no governador José Serra, do PSDB, que aparece bem nas pesquisas de opinião.


Nessa conjuntura, o dirigente comunista destacou o papel importante exercido pelo Bloco de Esquerda, que não pode se esgotar e vai enfrentar seu grande teste na eleição municipal do ano que vem. Há ainda dificuldades na consolidação do Bloco, disse. Mas ele precisa se transformar numa referência importante, marcadamente em 2008.



Tensão crescente



A ação guerreira e unilateral dos EUA no Iraque fracassa, e esta é a causa principal da instabilidade na região. Mesmo nesse quadro, entretanto, a lógica do governo Bush é mais guerra, é a ampliação da agressão contra as nações e os povos, inclusive chegando à ameaça de uma conflagração geral, explícita na resposta do presidente dos EUA à posição da Rússia de apoiar o programa nuclear iraniano e declarar-se contra qualquer intervenção estrangeira no Irã. A evolução dos acontecimentos poderá levar a uma terceira guerra mundial, disse Bush. E esta é uma situação concreta de ameaça, pensa Renato Rabelo.


A marca principal do quadro mundial, segundo o dirigente do PCdoB, é essa tensão crescente, particularmente naquela região que ele denominou “Oriente Médio alargado”, incluindo a Turquia e o Irã. Na opinião da secretária de Estado do governo Bush, Condoleeza Rice, o Irã passa a ser o maior desafio para a segurança dos EUA, e há fortes sinais difundidos pela imprensa estadunidense de busca de um pretexto para a declaração de guerra contra o país dos aiatolás, num clima semelhante ao que precedeu à agressão contra o Iraque, em 2003. O imperialismo fabrica pretextos, lembrou Renato Rabelo, embora a situação, hoje, seja muito diferente da que existia quando ocorreu a invasão do Iraque. A oposição à guerra cresceu, inclusive entre o povo norte-americano. No Iraque ocupado, o país se desagrega; na região, a repercussão da ocupação e da resistência contra ela aumenta a tensão, inclusive com a ameaça de intervenção da Turquia para reprimir o movimento curdo pela autonomia.


Outro traço importante do quadro mundial, lembrado pelo dirigente do PCdoB, é a situação da economia. Há uma nova situação no mundo, disse ele. E ela tem alguns aspectos inéditos, aos quais um grande jornal dos financistas, o britânico Financial Times, referiu-se recentemente. Segundo aquele periódico, para o FMI o crescimento econômico mundial de nossos dias não tem paralelo nas útlimas décadas, e seu motor tem sido – pela primeira vez na história – o crescimento dos países chamados emergentes, com destaque para os asiáticos, principalmente a China. Hoje, os países emergentes crescem mais rapidamente do que os países ricos: suas economias evoluem a uma taxa anual média de 7,8% , enquanto os ricos patinam em cerca de 2,5% ao ano; nos EUA, o crescimento previsto para este ano é ainda menor, de 1,9%. Nunca antes, registrou o diário britânico, a taxa de crescimento mundial foi tão maior do que a dos países de alta renda.


Outro aspecto refere-se à crise econômica que, este ano, teve seu epicentro no próprio coração do imperialismo, repercutindo nos demais países, como ficou claro no recente episódio da crise imobiliária nos EUA. Ela representa, hoje, a maior ameaça à estabilidade econômica, segundo o próprio FMI. E, pela primeira vez também, os mercados emergentes constituem um refúgio seguro para os investidores ante a crise no centro do sistema, invertendo uma lógica secular onde a segurança estava nos países ricos, e não os países pobres. Hoje, os saldos externos que os países emergentes obtêm em suas transações comerciais e financeiras com o mundo alimentam a formação de reservas monetárias gigantes e somente a compra de títulos dos países centrais para a formação dessas reservas alcançou, apenas em 2007, a quantia de 1,085 trilhão de dólares.


Está ocorrendo uma mudança histórica nos pesos econômicos entre as nações, com destaque para países como a China, Índia, Rússia, Brasil e África do Sul, conclui o Financial Times. Num esforço de sistematização deste quadro, Renato Rabelo destacou algumas características importantes dos países da periferia: taxas de crescimento elevadas, controle de fontes de energia importantes, capitalismo de Estado para contrapor-se à lógica neolibeal, redução da vulnerabilidade externa com a redução da dívida externa, controle de reservas monetárias elevadas, criação de fundos de riqueza soberana, constituição de locos comeciais regionais, etc.


Também merece destaque, entre os fatos recentes do contexto internacional, foi o 17º Congresso do Partido Comunista da China, que acabou de se encerrar e demonstrou uma fase avançada do período de reformas iniciado em 1978. O Congresso demonstrou uma continuidade teórica que vem desde Mao Tse Tung, passou pela reforma e abertura de Deng Xiaoping, teve continuidade  com Jiang Zemin e avança sob Hu Jintao e sua proposta de desenvolvimento científico e sociedade harmônica, consagrada naquele encontro.


A fase atual, de desenvovimento científico e sociedade harmônica, pensa Renato Rabelo, significa a abertura para o enfrentamento de dois grandes desafios  para o socialismo à chinesa. O primeiro é passar do desenvolvimento extensivo existente até agora para o desenvolvimento intensivo, alcançando um novo patamar de crescimento. O segundo diz respeito à diminuição das desigualdades sociais e regionais. O Congresso enfrentou também a questão do avanço democrático na China, que não copia modelos ocidentais mas mantém as instituições jurídicas e políticas criadas desde 1949, que ampliam e aprofundam a democracia no país.


Concluindo, Renato Rabelo referiu-se à tendência de mudança no equilíbrio estratégico no sistema mundial, que emergiu e se fortaleceu principalmente na última década, destacando, entre outros aspectos: o declínio relativo da hegemonia dos EUA; a rápida ascensão da China; a nova situação da economia mundial, com o crescimento dos países emergentes e crise no coração do imperialismo; o crescimento da tendência democrática e antiimperialista na América Latina; a derrota dos EUA no Iraque.



Ministério da Fazenda versus Banco Central



Em relação ao quadro nacional, Renato Rabelo destacou principalmente a tendência que parece firmar-se cada vez mais, de confronto entre o Ministério da Fazenda e o Banco Central.


Neste momento, ainda no primeiro ano do segundo governo Lula, a coalisão política que sustenta o presidente tem funcionado bem, embora com margem apertada no Senado. Conseguiu-se constituir o Conselho Político do governo e ele tem funcionado de acordo com o esperado. Um exemplo, disse Renato Rabelo, foram as discussões ali ocorridas em torno da CPMF – o debate intenso não prejudicou o apoio ao governo e à busca de aprovação para sua renovação. Além disso Lula tem mantido um elevado prestígio popular, e o governo vai firmando a marca do desenvolvimento, numa situação em que a realidade externa é favorável para a economia nacional. A inflação está sob controle, o crescimento este ano alcançará a marca de 4,5% do PIB (havendo até quem pense que poderá chegar a 5%), o mercado interno vive um momento de expansão, o crescimento industrial é alto, há uma melhoria relativa no emprego,as reservas externas atingem um voume considerável (poderá chegar a 180 bilhões de dólares este ano), a dívida externa foi reduzida, o investimento direto estrangeiro é crescente.


Este é o quadro de uma realidade mundial favorável. É nesse contexto que se dá, no plano da economia, a relação mais tensa entre o Ministério da Fazenda e o Banco Central, alimentada pela decisão recente do Copom de interromper o ciclo de reduçao de juros, dando um sinal contrário ao retono do crescimento, indicando uma verdadeira freada ao manter os juros elevados. São duas visões em confronto, diz RenatoRabelo, num quadro em que a exorbitância dos juros é cada vez mais nítida. Como lembrou recentemente o economista João Sicsú, somente entre 2003 e 2006 (em quatro anos, protanto) o governo pagou 600 bilhões de reais em juros. Esta é uma despesa inerte, diz aquele economista, que não gera emprego nem investimentos mas, ao contrário, agrava a já enorme concentração de rendas no país.


Há portanto, diz Renato Rabelo, duas variáveis estratégicas fora do lugar na busca do desenvolvimento: os juros altos e a taxa de câmbio que aumerna o valor do real frente ao dólar e, com isso, representa um risco para a economia, particularmente para a indústria. Elas são onerosas para o país e para o povo, e favorecem os muito ricos, que se tornam ainda mais ricos.


A política externa tem maior nitidez e coerência em relação a uma ação progressista, disse Renato Rabelo. Isso ficou claro no discurso do presidente Lula na abertura da Assembléia Geral da ONU, no dia 25 de setembro. Ele enfatizou a importância das relações Sul-Sul, a defesa da soberania da Amazônia, a busca de uma defesa do meio ambiente coerente com os anseios pelo desenvolvimento econômico, a justiça social e a busca pela paz. Esta política externa progressista ficou ainda mais nítida na declaração (no dia 8 de outubro) do embaixador Clodoaldo Hugueney, negociador brasileiro na OMC, que não tem dúvida sobre a Rodada Doha e o Mercosul: o Brasil escolhe o Mercosul, disse.



Um programa de reformas



Renato Rabelo lembrou as resoluções da última reunião do Comitê Central, realizada em julho de 2007, que definiram as tarefas do PCdoB nesta conjuntura. É preciso agregar a elas, disse, a luta pela democratização dos meios de comunicação, apoiar o esforço pela criação de uma tevê pública nacional. Além de reforçar a busca de uma reforma política democrática, baseada na ação mais incisiva também por um programa global de reformas que interessam aos setores progressistas, democráticos e patrióticos. Este é um dos esteios de um programa nacional de desenvolvimento sustentado, e que enfrenta problemas estruturais  necessários para resolver a contradição  essencial entre as necessidades materiais, políticas e culturais do povo e os obstáculos políticos e econômicos dominantes.


Nesse sentido, diz Renato Rabelo, o PCdoB defende, para a iniciativa e fortalecimento da luta democrática, a realização de cinco reformas:


– Uma reforma política para ampliar, e não restringir, a participação popular e a democracia; ela envolve mudanças no sistema de representação política e no sistema eleitoral e precisa assegurar o pluralismo partidário, fortalecer os partidos e ampliar a liberdade política.


– A reforma da educação, para assegurar a igualdade de acesso de todos ao ensino básico de qualidade, além de envolver também a reforma universitária para democratizar o acesso ao ensino superior e melhorar a qualidade do ensino.


– A reforma triburátia progressiva, tributando mais os mais ricos, a especulação e esteja comprometida com a redução das igualdades sociais e regionais.


– A reforma agrária, uma reforma de base, que envolva a eliminação da grande propriedade improdutiva e favorecendo a propriedade familiar, em regime cooperativo e com acesso ao crédito e ao seguro agrícola.


– A reforma urbana, com planos de segurança e inclusão social, contendo a especulação imobiliária e garantindo para a população o acesso à moradia decente e aos serviços essenciais, em especial o saenamento básico e o transporte coletivo de massa.


Finalmente, Renato Rabelo comemorou, em sua intervenção, o crescimento do PCdoB, nos últimos meses, com grande número de filiações não só de militantes com mandatos eletivos mas também de lideranças de movimentos sociais. E que se refletem no aumento das pré-candidaturas do PCdoB para 2008 – o partido já tem 361 pré-candidatos a prefeitos, sendo 17 somente em capitais.