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José Dirceu: Desaparecidos políticos, justiça e reconhecimento

Não adianta deixar o tempo passar, o assunto estará sempre ressurgindo enquanto o Brasil se mantiver como o último país do mundo a abrir seus arquivos militares e da repressão.

 


 
A Folha de S.Paulo publica nesta segunda-feira (2) reportagem sobre a morte de Pedro Alexandrino de Oliveira Filho, assassinado pelos militares, em 1974, na ocasião em que integrava a guerrilha rural do Araguaia, do PCdoB. O militante havia desaparecido em  Belo Horizonte, depois de sair para uma simples compra de cigarros e, desde então, a família sofre com mais uma pessoa que integra a lista dos desaparecidos políticos. O caso só foi esclarecido em abril deste ano, quando o mateiro Abel Honorato de Jesus prestou depoimento à Comissão de Anistia do Ministério da Justiça.



O mateiro contou à Comissão que viu o corpo de Pedro Alexandrino de Oliveira Filho ser retirado do local em que foi metralhado enquanto descansava, e levado para um helicóptero que o transportou para Xambioá (PA), onde militares que combatiam à guerrilha na região tinham uma base de operações.



De tempos em tempos, relatos como esse vêm à tona. E os militares ainda resistem a abrir os arquivos sobre esse conflito – a guerrilha do Araguaia – e sobre a repressão política comandada pela ditadura. É inútil. É certo que a verdade surgirá e os militares que praticaram crimes não se eximirão da condenação pública por tê-los praticado. O melhor – e o inevitável, o futuro mostrará – será contar de uma vez toda a verdade, mostrar a localização dos restos mortais de todos os desaparecidos para que as famílias possam dar-lhes sepultura digna segundo a tradição religiosa de cada um.



Reafirmo minha opinião, já expressa em outras notas deste blog: a questão não vai ser calada, voltará sempre enquanto os responsáveis não derem todas as informações que os familiares de mortos e desaparecidos reivindicam. Manter a situação atual, sem abrir os arquivos, é mais um erro que só agrava os cometidos no passado.



Não adianta deixar o tempo passar, o assunto estará sempre ressurgindo enquanto o Brasil se mantiver como o último país do mundo a abrir seus arquivos militares e da repressão.


 


Fonte: Blog do Dirceu


 


Leia, abaixo, a matéria da Folha sobre Pedro Alexandrino


 


Guia dá pista sobre sumiço de guerrilheiro no Araguaia


 


Mateiro conta a comissão que viu Pedro Oliveira Filho ser fuzilado por militares




Militante de esquerda saiu de casa em 1969 e não foi visto mais por familiares; segundo depoimentos, teria sido assassinado em 1974


 







Rafael Andrade/Folha Imagem
Diana Temporão, irmã de Oliveira Filho, em sua casa no Rio





SERGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO




Pedro Alexandrino de Oliveira Filho saiu de casa no dia de Natal de 1969 para visitar a família do amigo Hélio Garcia, 22 anos depois eleito governador de Minas Gerais. Lá chegando, conversou um pouco e avisou que sairia para comprar cigarros. Nunca mais foi visto em Belo Horizonte, onde morava com a mãe e duas irmãs. Desapareceu. Só agora, quase 39 anos depois, a família teve notícias dele.



O depoimento do mateiro e lavrador Abel Honorato de Jesus à Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, no último dia 26 de abril, pode ajudar os parentes a saber o que aconteceu com Pedrinho -apelido de infância ainda empregado pela família quando o cita.



Abel Jesus disse que Oliveira Filho, a quem conhecia como Peri, foi metralhado quando descansava na então densa selva amazônica que cobria o sudeste do Pará. Foi no início de 1974. Ele era um dos guerrilheiros rurais do PCdoB. Bancário de profissão, criado em ambiente urbano, estava na mata havia quatro anos.



O corpo do rapaz, à época com 26 anos, foi retirado da floresta em um helicóptero do Exército, segundo o mateiro. Teria sido levado para a então ativa base militar do município de Xambioá, à época Goiás, hoje Tocantins. Jamais foi localizado por aqueles, que desde a década de 80, vasculham as terras do Araguaia em busca das ossadas dos guerrilheiros.
A Folha revelou, em abril, o teor do depoimento de Abel Jesus, 63. Ele afirmou que o guerrilheiro estava doente, deitado em uma rede. Não reagiu nem a ele foi perguntado algo pelos pára-quedistas do Exército que o guia orientava na área chamada de Grota da Lima, ainda de acordo com seu relato. “Os militares pegaram o Peri, chegaram atirando”, disse Abel Jesus. A frase está reproduzida na ata de seu interrogatório pela Comissão de Anistia.



A família já sabia que Pedrinho havia passado pelo Araguaia, após deixar Belo Horizonte. O nome dele consta da relação de desaparecidos na região de 1972 a 1974, quando Exército, Marinha e Aeronáutica se uniram para aniquilar a guerrilha iniciada na década anterior pelo Partido Comunista do Brasil.



Antes do sumiço, Pedrinho já havia sido preso e torturado por cinco dias, sob a acusação de envolvimento em atividades subversivas. Em São Paulo, onde morara antes, tornara-se militante de organizações de esquerda, conforme a família tinha conhecimento. Mas a vinculação dele ao PCdoB e à guerrilha do Araguaia era desconhecida.



Além do registro oficial de desaparecido, a morte de Peri é citada no livro “A Ditadura Escancarada”, do jornalista Elio Gaspari (Companhia das Letras, 2002). A fonte do escritor foi um oficial cuja identidade não revelou.



“No dia de Natal de 69 Pedrinho almoçou em família. Depois saiu para encontrar Hélio Garcia, de quem era muito amigo. Foi para a casa do sogro dele. Mais tarde, saiu para comprar cigarro. Nunca mais o vimos. Na realidade, até agora a gente não sabia de nada”, disse à Folha a jornalista Diana Maria Temporão, 55, irmã caçula de Oliveira Filho.



Mãe de Pedrinho, a psicóloga Diana Piló Oliveira, 84, chegou a conversar, anos atrás, com o deputado federal José Genoino (PT-SP), sobrevivente da guerrilha. Ele confirmou que Peri era mesmo filho dela e que, no Araguaia, chegaram a morar juntos em uma cabana.



Na década de 90, ela percorreu a região, mas não encontrou pessoas que pudessem ajudá-la na busca ao filho. Emocionada com o relato do mateiro, Diana não se sentiu em condições de falar à Folha. “Sempre fica uma esperança, mesmo passados tantos anos, mais de 30. É muito difícil falar quando surge um relato como esse. Até agora ninguém tinha visto ele morrer”, disse a irmã.