Reinauguração da casa de Patativa marca centenário

Programação do centenário de Patativa do Assaré, aberta no dia 1°, terminou ontem com show em frente à Matriz

A reinauguração da casa onde nasceu o poeta Patativa do Assaré, no dia 5 de março de 1909, quebrou o silêncio, ontem, na Serra de Santana. Cerca de 500 pessoas, entre elas o vice-governador do Ceará, Francisco Pinheiro, o secretário da Cultura do Estado, Auto Filho, e o prefeito de Assaré, Evanberto Almeida, participaram da solenidade, parte da programação em homenagem ao centenário de Patativa.


 


A restauração, feita pela Prefeitura Municipal com o apoio da Secretaria de Cultura do Estado, manteve a mesma estrutura do antigo casarão. Até o fogão à lenha permanece, guardando as lembranças dos tempos difíceis, quando a família Gonçalves se alimentava à base de feijão e milho. Na sala da frente, ainda está o velho oratório, onde o poeta, devoto de Nossa Senhora Aparecida, rezava o terço diariamente.


 


Uma cantoria de violeiros abriu a solenidade de reinauguração da casa. Eles subiram a serra para prestar solidariedade ao companheiro de desafios à viola, nas madrugadas sertanejas. A interpretação da poesia “A Morte de Nanã”, pela atriz Cícera Carmo, emocionou a todos, ao descrever a história de uma jovem que morreu por falta de assistência médica.


 


Entre a multidão, a neta de Patativa, Antônia Gonçalves, encheu os olhos de lágrimas. Aquele quadro dramático era a lembrança mais forte de uma família pobre e honrada criada enfrentando as adversidades da vida aperreada da zona rural. O poema, explica o filho mais velho do poeta, Geraldo Gonçalves, foi inspirado no sofrimento de uma das filhas de Patativa, chamada Ana, que morreu naquela situação.


 


Em Assaré, o clima era de festa. O palanque armado em frente à Igreja Matriz serviu de palco para a programação de shows, aberta no último dia 1º e encerrada na madrugada de hoje, com shows de Raimundo Fagner, Waldonys, Dominguinhos e Forró Sacode. As ruas foram interrompidas com bancas de bebidas e comidas. A TV Diário deslocou um “link” para transmissão de flashes ao vivo. No meio da rua, o artesão José Belarmino vendia estátuas de madeira do poeta.


 


A casa onde morreu Patativa, ao lado da Matriz, continua a respirar poesia. O poeta Geraldo Alencar, sobrinho de Patativa e apontado como o um dos seus seguidores, saudou o centenário do tio: “Partiu, mas deixou o nome / gravado em cada memória/ sua vida e sua história/ estão gravados na fome/da pessoa que não come/ sujeita ao podre regime/ de assalto de droga e crime. Num viver desesperado/ a onde o pobre coitado/ se espreme, mas não se exprime”.


 


Os filhos


 


João Gonçalves, filho mais novo de Patativa, que veio de São Paulo para assistir as homenagens ao pai, recordou a preocupação de Patativa com a educação da família. Em memória ao pai, João recitou um soneto inédito de Patativa: “O Amanhã”, que diz “Amanhã, ilusão doce e fagueira”. Enquanto o mais tímido dos filhos do poeta, Afonso Gonçalves, que vive na serra, trabalhando na agricultura e como carpinteiro, recitou “Chico Forte”, outro poema inédito de Patativa.


 


Parque temático


 


Segundo o secretário da Cultura, Auto Filho, conterrâneo e parente do poeta, a restauração da casa de Patativa do Assaré é o ponto de partida para a criação de um parque temático na Serra de Santana, com o objetivo de mostrar o poeta também agricultor. Uma parte da história de Patativa que, segundo o secretário, falta ser contada em toda sua dimensão.


 


Auto Filho informou, ainda, que o Governo já garantiu os recursos para dar continuidade à festa do centenário, a ser estendida a todo o Brasil. Além da publicação de toda a obra, a Secretaria pretende circular os filmes sobre o poeta em todo o País. Será instalado dentro de um ônibus um teatro móvel que visitará todos os municípios do Ceará e de outros estados.


 


Culturas do Cariri


 


O vice-governador do Ceará, Francisco Pinheiro, acrescentou que aquela festa era uma forma de reviver e reverenciar a memória do poeta em sua cidade e no Brasil. Pinheiro definiu que era um momento singular para a cultura cearense. O projeto do parque temático, segundo o vice-governador, vai complementar outros valores culturas do Cariri , como o Museu de Paleontologia de Santana do Cariri e o Geopark, o maior da América.


 


O AMANHÃ


 


“Amanhã, ilusão doce e fagueira/ Linda rosa molhada pelo orvalho/ Amanhã findarei o meu trabalho/ Amanhã, muito cedo, irei à feira


 


Desta forma, na vida passageira/ Como aquele que vive do baralho/ Um espera melhora no agasalho/ E o outro a cura feliz de uma cegueira


 


Com aquele amanhã que ilude a gente/ Cada um vai alegre e sorridente/ Como quem vai atrás de um talismã


 


Um peito repleto de esperança/ Porém nunca temos a lembrança/ De que a morte também chega amanhã”


 


CHICO FORTE


 


“O Chico Forte era um sujeito duro/ Ladrão malvado que matava gente/ Tinha o instinto da cruel serpente/ Deixava o claro para andar no escuro


 


Roubava casa e pulava muro/ Vil assassino, traidor valente/ Ninguém podia lhe tomar a frente/ Era um assombro seu viver impuro


 


Mas disse um dia o cemitério a morte:/ Você procure o cabra Chico Forte/ Eu quero este e não dispenso aquele


 


Que abraça os filhos e não despreza os pais/ Na minha mesa todos são iguais/ Traga o Francisco que eu preciso dele”