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Em momento de retomada, debate aborda desafios do desenvolvimento

Em um momento em que o Brasil esboça reação à estagnação econômica, mantém certa liderança em relação aos vizinhos da América Latina e, aos poucos, consolida uma nova política de desenvolvimento, é preciso discutir que tipo de crescimento o país procura. A opinião é de Benedito Bizerril, representante da Fundação Maurício Grabois no Ceará. A entidade realiza o ciclo de debates “O Projeto Nacional de Desenvolvimento e as Desigualdades Regionais”.

A atividade está sendo promovida em parceria com a Universidade Federal do Ceará (UFC), o Banco do Nordeste (BNB) e Instituto da Cidade. No encontro temático desta sexta-feira (11 de setembro), realizado no auditório da Reitoria da UFC, foi discutida a “A essencialidade de um novo projeto nacional de desenvolvimento”. Para o debate, a participação do Prof. José Carlos Braga (Professor da Unicamp), José Renato Rabelo (Presidente do PCdoB) e João Sicsú (Diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA).

Benedito Bizerril, representante da Fundação Maurício Grabois no Ceará, fez a abertura do encontro e ressaltou que o objetivo é promover um debate sobre a temática do desenvolvimento local e nacional, visualizando as desigualdades regionais, com perspectiva a instigar a formulação de um novo projeto nacional de desenvolvimento para o Brasil.

Segundo o advogado, os encontros serão muito importantes devido à atualidade do tema. “Considerando que nas décadas de 80 e 90, o país ficou estagnado tanto socialmente quanto economicamente com a política neoliberal vigente no Brasil, hoje vemos uma retomada do crescimento de forma mais organizada e definida”. Bizerril cita o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) como um espelho deste novo pensamento implementado no Governo Lula.

Para o advogado, é preciso se definir para onde vai o Brasil principalmente neste momento em que o país esboça uma reação à estagnação, mantém certa liderança junto aos países da América Latina e aos poucos consolida uma nova política de desenvolvimento. “Temos o dever de discutir o novo Brasil que queremos, qual caminho tomar, sempre pensando no benefício da nação. Não podemos pensar em crescimento com concentração de renda”, afirma.

Áreas importantes para a implantação do novo projeto de desenvolvimento

João Sicsú, Diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), elogiou a iniciativa do debate, mas ressaltou que era preciso que estas discussões fossem multiplicadas para que mais pessoas tivessem acesso às informações. “É preciso que um público cada vez mais diversificado participe destes debates. A construção de um projeto de desenvolvimento não deve passar por economistas nem ser decidida em salas e gabinetes. Um verdadeiro projeto de desenvolvimento só existirá de fato com a participação efetiva da sociedade”, defende.

O projeto de desenvolvimento, segundo o economista, é um conjunto de políticas e programas desenvolvidos no âmbito da política e não da economia. Ele deve ser composto por amplas áreas a serem levadas em conta, estudadas e implementadas. Uma delas é a política de desenvolvimento e absorção de tecnologia. Sicsú acredita que a tecnologia representa o armazenamento do conhecimento com a qual a sociedade tem flexibilidade, autonomia e soberania.

Segundo o economista, é a tecnologia que aumenta a distância entre os países desenvolvidos e os subdesenvolvidos. “Não estou falando em tecnologia no sentido de ter um i-phone, tela de plasma ou coisa assim. Mas o sentido que dou é que não adianta ter o caminho sem ter como chegar lá. O que adianta termos a reserva de pré-sal, por exemplo, sem termos meios para explorá-la e desenvolvê-la?”, questiona.

Outra área importante para a implantação de um projeto de desenvolvimento sólido é a segurança social. Segundo o economista, é preciso que as pessoas tenham segurança de viver nos contratempos. “Os programas de assistência social existem no mundo todo e, ao contrário do que se pensa, são mais fortes nos países desenvolvidos. O Brasil dá apenas seus primeiros passos neste sentido”. Sicsú exemplifica a previdência social como um fator importante para este crescimento, pois estimula diretamente as economias locais.

A questão ambiental também tem papel preponderante nesta nova etapa de crescimento. “É imprescindível que se faça um planejamento ambiental. Ele tem que representar o equilíbrio entre os que querem devastar e os que querem preservar. Temos que ter em mente que é a preservação é crucial, mas ela não pode impedir o crescimento”, pondera Sicsú. Infraestrutura focada principalmente na questão do transporte público; saúde e educação de qualidade e com acesso universal são outras vertentes fundamentais para o novo projeto de desenvolvimento brasileiro.

A importância da Macroeconomia para o crescimento do Brasil

O economista considera que a Macroeconomia é decisiva para a realização de todo este caminho, pois, para isto, é preciso recursos e é ela quem determina. “Não adianta ter grandes projetos se a Macroeconomia não for adequada. Se não tiver recursos para implementação dos projetos, fecha-se o canal dos financiamentos”, avalia.

Sicsú afirma que é na Macroeconomia que se divide o orçamento público. “Esta é a questão central. É aqui onde se determina as fatias do investimento”. O diretor do IPEA cita a ainda elevada taxas de juros como um problema a ser enfrentado. “Há pouco mais de sete anos, nossa taxa anual de juros era 26,5%. Hoje, estamos com a taxa de juros em 8,75% ao ano. Conjunturalmente está bem melhor, mas ainda é muito alta. É ela quem faz o orçamento ficar estrangulado, não gerando emprego, investimentos nem arrecadação”.

Para Sicsú, com uma menor taxa de juros, o Banco Central tem como acumular mais reservas. “Os juros devem ser tratados de forma estratégica para que o país tenha maior flexibilidade para a implementação do projeto de desenvolvimento. Dados nos mostram que enquanto é investido entre 12 e 15 bilhões de reais por ano no Bolsa Família, projeto que gera renda o movimenta o mercado, os juros custam para o país entre 120 e 150 bilhões por ano”, contabiliza. Segundo o economista, é preciso sim manter os títulos públicos, mas eles não geram emprego. “Pagar juros promove a concentração de renda. É preciso rever esta conta”, defende.

Taxa de juros: um inimigo do crescimento

Para José Carlos Braga, doutor em Economia e Professor da Unicamp, este é o momento para a arrancada de desenvolvimento brasileiro. “A implantação deste novo projeto de desenvolvimento só se dará com a luta social. O desenvolvimento caminha junto com a distribuição de renda”.

Segundo o economista, o Brasil é um país industrializado, porém subdesenvolvido. “Precisamos acumular dólares porque nossa moeda ainda é fraca. Sabemos que hoje o Banco Central tem uma reserva de cerca de 215 bilhões de dólares. Não podemos abrir mão disso permitindo a fuga de capitais. O projeto de desenvolvimento deve enfrentar tarefas duras, e esta é uma delas”, enfatiza.

Braga afirma que o momento é de hiper sensibilidade para o Capitalismo que tenta se reerguer após uma dura crise. “Devemos aproveitar este momento para pensarmos numa reorganização da política econômica brasileira”. Segundo o professor, ela hoje é apoiada num “triângulo de ferro”: taxa de juros, câmbio flutuante e superávit primário. “O novo projeto de desenvolvimento não pode ser ancorado por este triângulo. Ele deve ser desmontado o mais rápido possível”, defende. De acordo com Braga, para se ter recursos é preciso ter uma base fiscal forte que só vai se consolidar com a baixa na taxa de juros.

O economista avalia que este é um momento privilegiado para isto. “Nunca antes vivemos um momento como este quando temos reservas, sem dívida externa e com certa estabilidade. Este é o momento ideal para montar o novo projeto de desenvolvimento. Para isso, é preciso que a sociedade trave uma luta para ampliar suas conquistas”, aposta Braga.

Brasil novo no pós-Lula

Renato Rabelo, Presidente Nacional do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), avalia que o Brasil, neste momento, busca alternativas de modelos de desenvolvimento com esforços político, teórico e intelectual no sentido de encontrar saídas para o país. “Nosso desafio é encontrar uma forma de crescimento acelerado, duradouro, sustentado e sustentável”, defende.

Segundo o comunista, a saída para o novo projeto de desenvolvimento é política, mas com visibilidade no plano econômico. “Vimemos duas décadas de semi-estagnação pois não tínhamos saídas com a política econômica apoiada no neoliberalismo. Em 2002, com a eleição do Presidente Lula, inicia-se um novo ciclo político e um novo pacto social é estabelecido”.

Rabelo analisa o primeiro mandado de Lula na Presidência. “Apesar da dualidade entre o enfrentar e o manter, ele consegue contornar a situação que era crítica, herança do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Vivíamos numa era de desemprego e vulnerabilidade, com déficit enorme. Lula consegue estabilizar e se reelege. O centro do segundo mandato passa a ser a retomada do desenvolvimento”, avalia.

O presidente do PCdoB cita o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) como exemplo de investimento no desenvolvimento. “O PAC recompõe a Infraestrutura do país que estava sucateada e paralisada”. O comunista destaca também a descoberta do pré-sal que trás consigo um lastro importante de riqueza com a possibilidade de investimentos e crescimento.

O caminho para um Brasil mais forte

Segundo Rabelo, o Novo Projeto Nacional de Desenvolvimento (NPND) proposto pelo PCdoB se fundamenta na soberania, afirmação e defesa nacional além da democratização da sociedade. “Se não há nação forte, não se constrói o desenvolvimento. Com saúde e educação universal; moradia digna; e política econômica expansiva, teremos uma sociedade forte”, considera. Para o comunista, o país tem todas as condições necessárias de se tornar um país auto-suficiente. “Temos totais condições de nos financiarmos. O capital estrangeiro deveria ser um acessório. Não precisamos de esmolas. Não somos vira-latas”.

Renato Rabelo avalia que é preciso dar passos além dos que já foram dados nos últimos anos. “A crise também abre oportunidades. Podemos ir adiante, enfrentar problemas buscando saídas com caminhos próprios”. O dirigente cita o projeto do PCdoB que leva em conta dois aspectos: o rumo e o caminho. “O rumo é o mais longo. Nele, a busca de uma sociedade mais avançada que a capitalista, dando passos civilizatórios, que denominamos Socialismo”.

O caminho, segundo Rabelo, é o NPND. “Estamos muito otimistas quanto ao futuro do Brasil. Temos grande potencial e a perspectiva da implementação do NPND se volta neste momento para a não retomada do poder pelos tucanos. 2010 será decisivo para, além de darmos continuidade no ciclo político iniciado por Lula, podermos ir além”, enfatiza.

Após as apresentações, foi iniciado o debate com a participação do público. O ciclo de debates terá mais dois encontros temáticos. No dia 18 de setembro, o tema central será “Um novo projeto nacional de desenvolvimento e as desigualdades regionais”, com foco no Nordeste. Já no dia 25 de setembro, irá ser discutido o tema “O Ceará na perspectiva de um novo projeto nacional de desenvolvimento”. Os encontros também serão realizados no auditório da Reitoria da UFC, sempre a partir das 9h.

De Fortaleza,
Carolina Campos