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Conferência de Comunicação: letargia de Serra atrasa convocação

O governador de São Paulo, José Serra (PSDB), tergiversou o quanto pode, empurrou com a barriga — até que, em 15 de setembro, deixou claro que não convocaria a 1ª Conferência Estadual de Comunicação.

Por José Carlos Ruy*

Trata-se da etapa de um processo que, desde abril, mobiliza a sociedade na construção do debate nacional por uma mídia moderna, que corresponda aos anseios de democratização mais profunda de nosso país. Processo que vai culminar, em dezembro, na 1ª Conferência Nacional de Comunicação (Confecom), que vai acontecer em Brasília.

Serra deixou estourar o prazo dado pelo Regimento Interno estabelecido pelo Ministério das Comunicações, que fixava 15 de setembro como data limite para os governos estaduais convocarem suas conferências. Como deixou de fazê-lo, a Assembleia Legislativa de São Paulo (segunda na ordem de precedência para essa convocação, com prazo até 20 de setembro) assumiu a tarefa e, em 19 de setembro, começaram oficialmente os trabalhos. Na verdade, uma corrida contra o tempo para cumprir os prazos legais, prejudicados pela letargia do governador.

Em São Paulo, depois de muita negociação, ficou estabelecido que a Comissão Organizadora da Conferência Estadual seria formada por 39 titulares e seus suplentes, divididos paritariamente entre os representantes do poder público (13), da sociedade civil (13) e da sociedade civil empresarial (13). As vagas daquele setor que não conseguisse preencher sua cota seriam divididas entre os outros dois. Foi o que ocorreu — a sociedade civil empresarial indicou nove representantes, e as quatro vagas que sobraram foram divididas entre os demais. No final, ficou assim: Poder Público, 15; sociedade civil, 15; sociedade civil empresarial, 9.

Foi nessa correria que a Comissão Organizadora paulista se instalou oficialmente em 5 de outubro, iniciando a discussão do regimento interno do evento — tudo a toque de caixa, para ganhar tempo para o debate mais substantivo, que envolve desde as providências materiais (infra-estrutura, propaganda, etc.) até o debate das teses que os delegados paulistas defenderão na Conferência Nacional.

Apesar do empenho das entidades da sociedade civil que, mobilizadas desde o início do ano, já acumularam uma extensa pauta de discussão, o estado de São Paulo, graças ao descaso de seu governador, está na rabeira do debate organizado e, principalmente, da organização da Confecom, processo em andamento em dezenove estados e no Distrito Federal. Mas São Paulo, onde estão as sedes das principais cadeias nacionais de comunicação — como a Editora Abril, as TVs Bandeirantes e Record, os jornais Folha de S.Paulo e O Estado de S. Paulo, e que detém 60% do faturamento brasileiro do setor —, claudicou, apesar das pressões feitas por quase uma centena de entidades da sociedade civil.

As protelações de José Serra não impediram, contudo, o início processo da Conferência, embora atrasado. Mesmo com tempo escasso, a Comissão Organizadora trabalha para definir as normas do debate do tema proposto pela portaria 667 (de 03/09/2009) do ministro das Comunicações, "Comunicação: Direito e Cidadania na Era Digital", organizado em torno de seus três eixos temáticos — "Produção de Conteúdo", "Meios de Distribuição" e "Cidadania: Direitos e Deveres".

A discussão será árdua mesmo porque vai envolver temas fundamentais para o fortalecimento e consolidação da democracia brasileira. Ela envolve uma série de abordagens, como a busca de uma mídia democrática, a defesa da cultura nacional (e da produção de conteúdos nacionais); a construção de uma rede pública de comunicação com finalidade educativa, cultural e artística e que estimule a produção independente e regional; a abertura da "caixa-preta" representada pela lei de concessões e o respeito às normas constitucionais vigentes, que proíbem a formação de monopólios; a revisão dos critérios de distribuição das verbas publicitárias das várias esferas de governo, democratizando-a e descentralizando-a; o estímulo à rádio difusão comunitária e o investimento no processo de inclusão digital; o fortalecimento das publicações alternativas (convencionais e eletrônicas) ligadas às forças progressistas e aos movimentos sociais, fomentando a difusão ampla e múltipla das correntes de opinião e de pensamento presentes na sociedade brasileira.

Este é o desafio da conferência. Em São Paulo, ele corre contra o tempo para ter na conferência nacional um papel que corresponda aos desafios apresentados pela centralidade do estado neste importante segmento responsável pela difusão cultural e política. Segmento que é a arena privilegiada onde ocorre a luta pela garantia, ampliação e consolidação da democracia brasileira.


* José Carlos Ruy é jornalista, editor da
Classe Operária e membro do Comitê Central do PCdoB

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