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Saara Ocidental: o deserto de dez milhões de minas

O Saara Ocidental é um dos dez territórios mais minados do mundo. O conflito entre Marrocos e a Frente Polisário deixou este território fortemente contaminado com minas antipessoais terrestres e restos de outros engenhos explosivos.

Atualmente, estima-se que cerca de 10 milhões de minas, que têm agora como principal alvo as populações civis nômades, estejam enterradas neste extenso deserto.

Uma equipa de desminagem da Landmine Action, durante o processo de localização de minas antipessoais na província de Tifariti, no território liberado do Sahara Ocidental. Um processo lento e perigoso devido às condições do terreno.

O guia do museu da guerra perto do campo de refugiados de Rabouni, mostra uma mina antipessoal, desactivada, usada pelas tropas marroquinas.

A maioria destes engenhos foi semeada por Marrocos, aquando da construção de um muro defensivo de 2500 quilómetros – actualmente conhecido como a Berma – que divide o Saara Ocidental em duas partes. No lado oeste, que inclui a parte costeira e os campos de exploração de fosfato, fica o território dominado por Marrocos.

No leste, ficam o Saara profundo, controlado pela Frente Polisário, onde vivem os refugiados e os guerrilheiros. Esta fortificação de areia foi ao longo dos últimos 20 anos reforçada por minas terrestres, criando uma barreira que constitui hoje em dia o maior campo de minas existente em todo o mundo.

As Nações Unidas registaram neste território 35 tipos de minas antipessoal e 21 tipos de minas antitanque, todas elas produzidas em doze países diferentes, entre eles a Itália, Espanha, Rússia e Israel. De acordo com os dados obtidos, as minas existentes na região oscilam entre os 200 mil e os 10 milhões, sendo a maioria feitas do ferro ou de plástico, o que dificulta em muito a sua detecção.

Uma maquete da constituição do muro de 2.500 quilômetros, construído por Marrocos, que divide o território do Saara Ocidental de norte a Sul, em exposição no museu da guerra perto do campo de refugiados de Rabouni. Um corredor com cerca de 7 milhões de minas antipessoais foi plantado pelas forças militares marroquinas como forma de proteção do muro.

Um jovem Saaraui observa uma coleção de minas antipessoais e antitanque, expostas no museu da guerra perto do campo de refugiados de Rabouni.

Ahmed Mohamed Sidi Aly, responsável pelo trabalho da Landmine Action, a única organização não-governamental (ONG) especializada em minas terrestres no Saara Ocidental, afirma que cenário de localização e limpeza destes engenhos é uma tarefa lenta e extremamente difícil, devido à extensa área e aos poucos recursos que têm disponíveis.

A organização, que iniciou o trabalho nos territórios sob controlo da Frente Polisário há cerca de 5 anos, conta apenas com 10 elementos especializados no processo de desminagem. Um número totalmente insignificante, pelo facto da área afectada corresponder a cerca de 120 mil quilómetros quadrados, com 20 campos de minas. «Durante um dia de trabalho conseguimos garantir a monitorização de cerca de 50 metros quadrados», explica Sidi Aly. «Como vê, é um processo muito lento, especialmente quando temos unicamente duas equipas de cinco elementos cada no terreno», acrescenta.

O processo, para além de lento, é arriscado e em muito dificultado pelo facto das autoridades marroquinas recusarem divulgar o mapa com a localização exacta dos engenhos explosivos. O facto de a grande maioria das vítimas de rebentamentos de minas serem os refugiados e os nómadas Saharaui, faz com que a Frente Polisário colabore abertamente com a Landmine Action, e revele o local exacto onde as minas foram plantadas pelos guerrilheiros durante o conflito armado. No entanto, o número de engenhos usados pelos guerrilheiros é totalmente insignificante quando comparado com os plantados pelas tropas marroquinas.

Equipamento usado pela Landmine Action durante a localização de minas antipessoais.

Um conjunto de vários tipos de minas antipessoais e outros objectos explosivos, correctamente acondicionados, prontos a serem destruídos pela equipa de desminagem da Landmine Action, na província de Tifariti.

"É sem dúvida positivo ter o apoio da Frente Polisário", afirma o coordenador de operações no terreno, Karl Greenwood, acrescentando que "eles (a Frente Polisário) têm sempre demonstrado vontade em ajudar-nos a localizar as minas, mas a participação vai muito mais longe". "É de lamentar que Marrocos nada faça para nos ajudar. Aliás, muito pelo contrário, Marrocos mantém um secretismo sobre a localização das minas, e no entanto são eles os responsáveis por mais de 95% dos engenhos existentes em todo o território do Saara Ocidental", explica.

Os voluntários que trabalham no terreno juntamente com a Landmine Action são todos de origem Saaraui e vêm todos dos campos de refugiados na fronteira com a Argélia. É também a Frente Polisário que organiza campanhas de sensibilização junto dos refugiados e das famílias nômades que constantemente se deslocam pelo território minado, para que estejam conscientes dos perigos que as minas representam.

Um veterano da guerrilha da Frente Polisário e vítima de uma mina antipessoal junto ao campo de refugiados de Rabouni. Ao fundo a sua mulher, numa cadeira de rodas, também ela vitima do mesmo acidente.

Um homem vítima de uma mina antipessoal deitado numa cama de hospital do Centro Médico de apoio a vítimas de minas antipessoais e de guerra em Rabouni, um dos campos de refugiados na zona fronteiriça com a Argélia.

Aziz Haidar, Secretario Geral da Associação Saaraui para Vítimas de Minas Antipessoais, explica que "a maioria dos acidentes ocorre pelo fato das pessoas não saberem identificar objetos explosivos e não estarem cientes do perigo que o seu manuseamento implica". Aziz, que também perdeu os dois braços e grande parte das duas pernas como resultado da explosão de uma mina antipessoal, está convencido que, para além do suporte médico e psicológico às vítimas, "é fundamental apostar cada vez mais nas campanhas de sensibilização, especialmente junto das crianças" que, segundo afirma, têm nos últimos anos sido as grandes afetadas por este problema.

Vista de um pequeno quarto no Centro Médico de apoio a vítimas de minas antipessoais e de guerra em Rabouni, um dos campos de refugiados na zona fronteiriça com a Argélia.

Um homem vítima de uma mina antipessoal, junto ao Centro Médico de apoio a vítimas de minas antipessoais e de guerra em Rabouni.

Apesar das dificuldades, normais a uma zona de conflito, que o povo e as ONGs locais e estrangeiras enfrentam, Aziz acredita ser possível fazer do Saara Ocidental um local seguro para a população nômade que ali vive. "Com trabalho e dedicação, o nosso povo poderá um dia viver em paz na terra que nos pertence. Todos queremos que as próximas gerações possam voltar ao nosso típico estilo de vida nômade, sem o perigo eminente de pisar uma mina", conclui.

Um sinal de alerta para o perigo de explosão de minas antipessoais na província de Tifariti.

Fonte: Informação Alternativa