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Collor: a Globo "ajudou bastante" a me colocar no poder

"Ajudou, sem dúvida nenhuma ajudou. Ajudou bastante." Dessa forma, o hoje senador pelo PTB-AL e ex-presidente da República Fernando Collor de Mello iniciou a resposta à pergunta se a relação com a Rede Globo o ajudou nas eleições de 1989. "Ajudou, sobretudo, a evitar armadilhas, algo que estivesse se tentando montar contra a minha candidatura", completou.

Há 20 anos, no dia 15 de novembro de 1989, ocorreu o primeiro turno das primeiras eleições presidenciais no Brasil após o fim da ditadura militar (1964-1985).

Numa longa entrevista ao UOL Notícias em Brasília, Collor tratou de vários dos tópicos mais difíceis da sua campanha de 1989 à Presidência, pelo PRN (Partido da Reconstrução Nacional).

Além da relação com a Globo, falou sobre as pesquisas e as conversas que teve antes de lançar-se candidato, inclusive com Silvio Santos, dos problemas que teve no governo de Alagoas, da decisão de pôr no ar o depoimento de Miriam Cordeiro na reta final da campanha, da edição do polêmico debate do segundo turno entre ele e Lula e do papel do tesoureiro Paulo César Farias, o PC, em sua campanha.

Em 1992, após uma série de denúncias de corrupção envolvendo seu governo e apontadas na CPI do PC, o Congresso aprovou o impeachment de Collor. Entre os que votaram pelo impeachment na Câmara estava o então deputado Cleto Falcão, um dos articuladores da candidatura de Collor – famoso por um brinde em Pequim que festejou o governador de Alagoas como futuro presidente do Brasil.

Collor afirmou também, na entrevista, que, na véspera do segundo turno, ao saber de uma pesquisa que o colocava apenas um ponto à frente de Lula, achou que perderia a eleição.

Globo

"Dr. Roberto [Marinho, 1904-2003, empresário, dono da Globo] era muito jornalista na sua essência", disse Collor. "Em algumas conversas, ele chegou a mim e disse, meu filho, acho que você está muito irritado, você não deve usar certos termos, isso está indo contra você", contou. Collor, no entanto, não quis repetir os termos que Marinho recomendou que ele deixasse de usar.

Na campanha de 1989, Collor ganhou projeção com a imagem de um candidato que combateria a corrupção e os altos salários do funcionalismo. Pare desta imagem foi construída ainda à frente do governo de Alagoas, quando Collor anunciou uma série de reformas acompanhadas por uma economista chamada Zélia Cardoso de Mello, indicada pelo ministro da Fazenda de José Sarney (PMDB), Dílson Funaro, segundo Collor. Zélia seria a ministra da Economia de Collor, responsável pela implantação do Plano Collor, para tentar controlar a inflação, e pelo "confisco da poupança" e de outras aplicações financeiras em 1990.

Além da relação com a Globo, Collor diz que sua candidatura foi vista como "simpática" por outros grupos de comunicação. "O que eu percebia é que havia um receio dos meios de comunicação mais importantes é que um eventual governo comunista" pudesse ter um efeito negativo sobre os meios de comunicação.

Na sua avaliação, esses grandes complexos de comunicação estavam à procura de um candidato – e o encontraram em Mario Covas (PSDB). Mas mesmo Covas era tido por alguns deles como "ligado aos comunistas", diz Collor, devido a posições que defendeu quando liderava a bancada do PMDB na Constituinte de 1988.

A saída para o tucano teria sido fazer o famoso discurso defendendo que o Brasil precisava passar por um "choque de capitalismo". "Quando fez o famoso discurso do choque de capitalismo, no Senado Federal, esse pronunciamento foi feito de um modo pré-determinado", para que os jornais televisivos entrassem ao vivo. As chamadas nas TVs coincidiam, acha Collor, "com o parágrafo mais pontiagudo do pronunciamento".

"Apesar disso, o candidato Mario Covas não conseguiu passar essa mensagem para o eleitorado e não decolou." Depois de Mario Covas, acha Collor, houve uma tentativa com Ulysses Guimarães (PMDB). "Minha candidatura foi de alguma maneira tida como simpática porque não havia outra alternativa."

Collor foi chamado, numa capa da revista "Veja", de "Caçador de Marajás". A "Veja", depois, seria um dos veículos de comunicação que publicariam uma série de denúncias, apuradas por uma Comissão Parlamentar de Inquérito, que levariam ao impeachment de Collor em 1992.

Segundo Collor, a palavra "marajá" veio de um "popular", num comício à noite no sertão. Ao referir-se a funcionários públicos que tinham "supersalários", ele teria gritado: "Não Fernando, é tudo marajá". "E aquela palavra me soou como uma palavra mágica."

O rol de "palavras mágicas" de Collor seria completado pela referência aos "descamisados" e "pés-descalços". Estas duas expressões já era usadas pelos peronistas argentinos para referir-se às parcelas mais pobres da população e foram recuperadas por Collor.

Ele, no entanto, afirma que essas palavras não eram estudadas. "Na minha campanha não houve marqueteiro", diz. Mas como, se Collor virou uma espécie de sinônimo de candidato construído pelo marketing? Com pausas entre cada uma das palavras, como se as estivesse medindo, ele responde: "Talvez por terem entendido que meus gestos e as minhas palavras fossem coisas estudadas, o que na realidade nunca foram."

Collor avalia que foi o candidato que melhor usou a mídia eletrônica. Na sua opinião, Lula fica, nesse quesito, com o segundo lugar. "Lula tinha uma música que era fantástica", lembra. "Dormia e acordava cantando a música do Lula."

Para Collor, os apoios que recebeu de grandes setores do PFL e do PMDB foram fundamentais para que, mesmo à frente de um pequeno partido, pudesse chegar à Presidência.

Segundo turno

Durante a entrevista, Collor defendeu que Brizola seria mais difícil de bater que Lula – em especial porque Brizola tinha mais penetração no empresariado. Por outro lado, "era notória a indisposição que havia entre o governador [do Rio] Brizola e Roberto Marinho".

Com relação ao uso de Miriam Cordeiro, ex-companheira de Lula que deu depoimento no horário eleitoral dizendo que o petista a pedira para fazer um aborto na década de 1970, Collor classificou de lamentável o episódio e chamou-o de "percalço de campanha".

Afirmou que ainda não faria novamente: "Nem teria feito na época": "O candidato é o que menos sabe do que vai no programa gratuito", disse. "Se alguém tiver de ser responsabilizado serei eu como candidato. O que eu digo é que eu não tomei conhecimento. Em última analise, tudo que de ruim acontece numa campanha é o candidato. Tudo que de bom acontece numa campanha, aí é a equipe.

Ouvido pelo UOL Notícias, o responsável pela campanha de Collor na TV, o publicitário Chico Santa Rita, afirmou que Collor participou da decisão de por o vídeo no ar.

Ainda sobre o segundo turno, Collor disse acreditar que a edição do segundo debate entre ele e Lula é fiel ao que aconteceu. "No primeiro debate eu não fui bem. E isso ficou explícito na edição que fizeram", para em seguida comparar a edição de debates à de partidas de futebol: é preciso refletir o resultado do jogo, argumenta. Depois da enorme polêmica em 1989, a Globo hoje tem a política de não mais editar debates.

Fonte: UOL

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