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Legislação dá a Lula poder de negar extradição de Battisti

O tratado de extradição entre Brasil e Itália permite ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva negar a entrega do ex-ativista italiano Cesare Battisti ao seu país de origem, basta demonstrar que ele poderá correr o risco de ser submetido a "atos de perseguição e discriminação por motivo de opinião política", o que de fato acontece. O tratado foi assinado em Roma em 1989 e ratificado pelo Congresso em 1993.

O entendimento representa uma derrota do relator do caso, ministro Cezar Peluso, do presidente do tribunal, Gilmar Mendes, e de Ricardo Lewandowski e Ellen Gracie, para os quais o tratado obrigaria Lula a respeitar a decisão do STF. Eles argumentaram que nunca na história do Brasil um presidente da República deixou de extraditar alguém após decisão neste sentido do Supremo Tribunal Federal. Mas também não mostraram em quais circunstâncias isso aconteceu.

Por 5 votos a 4, porém, o STF afirmou que cabe a Lula a decisão final do caso. Como existe um tratado bilateral sobre processo de extradição assinado com a Itália ele deverá ser observado, segundo afirmaram alguns ministros ontem. Esse tratado afirma que o presidente pode "recusar" a entrega de um extraditando, mas essa recusa deve ser "motivada", ou seja, justificada.

Em seu artigo 3º, o tratado aponta sete opções para "casos de recusa de extradição". Apenas uma delas cabe ao caso de Cesare Battisti, que diz: "se a parte requerida tiver razões ponderáveis para supor que a pessoa reclamada será submetida a atos de perseguição e discriminação por motivo de raça, religião, sexo, nacionalidade, língua, opinião política, condição social ou pessoal; ou que sua situação possa ser agravada por um dos elementos antes mencionados".

Concordância

A discussão sobre o tema esquentou ao final da sessão de ontem, que terminou depois das 20h. Os ministros que optaram por deixar o presidente Lula livre para decidir foram Cármen Lúcia, Eros Grau, Carlos Ayres Britto, Joaquim Barbosa e Marco Aurélio Mello. Eles argumentaram que a competência de manter as relações internacionais entre os países, segundo a Constituição Federal, é do presidente da República e não do STF e por isso, Lula pode fazer o que bem entender, até mesmo desrespeitar o tratado. A discussão ocorreu porque os ministros vencidos argumentaram que o Supremo deveria já na decisão de ontem afirmar que Lula precisa necessariamente cumprir o tratado e as leis que tratam sobre o tema.
Os cinco ministros que saíram vencedores, porém, argumentavam que não cabe ao tribunal dizer isso neste momento a Lula. "O Judiciário aparece como um rito de passagem, uma passagem necessária como um rito. O processo extraditório começa e termina no Executivo", disse Carlos Ayres Britto.

Segundo Cármen Lúcia, o presidente da República tem respaldo constitucional para fechar a questão. "O governo poderá entregar o extraditando e o governo não é o Supremo. Ainda que o extraditando responda a outro processo ou esteja condenado por outra infração, a competência da entrega, em última instancia, é do presidente da República", disse.

A decisão dos ministros do STF segue a posição do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, que defendeu que Lula, como chefe de Estado e de governo, seria responsável pela condução das relações internacionais brasileiras e, portanto, teria o direito de escolher se envia ou não Battisti para a Itália. "Eu não posso prever se o presidente vai ou não vai cumprir o tratado, porque isso não está em jogo", afirmou Eros Grau. "O que estamos dizendo é que Lula não precisa seguir o que disse o Supremo", disse Marco Aurélio Mello.

Até mesmo a ministra Ellen Gracie, que votou pela imediata extradição, argumentou a favor do presidente. "É criar uma polêmica onde ela não há. O que se procura agora é criar uma situação de constrangimento de ordem política ao presidente da República", afirmou Ellen Gracie.

Defesa espera apoio de Lula

A defesa de Battisti espera que o presidente Lula mantenha o italiano no Brasil. Segundo o advogado Luís Roberto Barroso, o presidente não deve seguir o entendimento do STF devido ao tratamento que o ex-ativista deve ser submetido na Itália.

"Acho que diante de um tribunal dividido, diante das circunstâncias pessoais pelas quais esse homem [Battisti] vai ser submetido na Itália onde o ministro da Defesa [Ignazio La Russa] declarou sem reservas que se pudesse iria torturá-lo, quero confiar que o presidente da República vai decidir no sentido de não entregar Cesare [Battisti]. Não corresponde ao perfil do presidente Lula entregar uma pessoa a outro país para cumprir pena nessas condições, depois de um julgamento à revelia", afirmou Barroso.

Da redação,
com agências