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Governo Yeda dispõe terreno para permuta sem garantias

Um terreno de 75 hectares, localizado na beira do lago Guaíba, em Porto Alegre (RS), está sendo proposto para troca ou escambo. O local onde funcionam as seis casas de ressocialização da Fundação de Atendimento Sócio-Educativo do RS (Fase) – a antiga Febem – possui considerável patrimônio histórico e ambiental, e está localizado junto a terrenos considerados nobres. O projeto, de apenas três artigos, é um verdadeiro cheque em branco, sem reservar nenhum tipo de garantia para o Estado.


- Regina Abrahão

Ao invés de venda, o projeto prevê a troca do terreno por nove unidades construídas. Além disso, nenhuma garantia foi oferecida para as famílias que lá habitam, algumas há quase um século, ocupando 16% de sua área. São cerca de dez mil moradores, distribuídos em cinco comunidades, a maioria sem saneamento básico, e com condições precárias de luz, água, sem serviços de saúde e educação próximos. Entretanto, o terreno é valorizado por causa da proximidade do centro, de shoppings, do Estádio Beira-Rio e de bela paisagem: cerca de 60% da área possui vista para o por do sol do Lago Guaíba, considerado dos mais belos do mundo e cartão postal da capital gaúcha

Última área de campo nativo

O trecho, na Av. Padre Cacique, abriga, entre os prédios e as vilas, uma área de vegetação nativa preservada, característica dos morros graníticos da região onde se localiza o município de Porto Alegre, um mosaico de campo seco, vassoural e matinha baixa. Parte das matinhas está em bom estado de conservação e abriga espécies comumente encontradas nos morros graníticos de Porto Alegre. Chama a atenção a área campestre, remanescente da vegetação do bioma Pampa, encravada na região central da cidade, com grande riqueza florística, que abriga várias espécies raras e endêmicas desta região.

Provavelmente é a última área de campo nativo que se encontra na região urbana da capital. Motivo importante para a preservação dessa área é a presença de várias espécies encontradas na lista oficial das espécies ameaçadas de extinção do Estado do Rio Grande do Sul, publicada pelo Decreto no. 42.099, em 31 de dezembro de 2002.

A permuta é justificada pela necessidade de descentralização do serviço sócio educativo. A Fase-RS, que já serviu de modelo para o país, amarga hoje altíssimos índices de superlotação e péssimas condições de habitabilidade para os internos. Os prédios receberam, em 2009, cerca de 11 milhões de reais, sendo 70% dos recursos originários do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci), e os 30% restantes do caixa do Estado. A falta de pessoal torna as jornadas extenuantes, de até 72 horas, aumentando as doenças ocupacionais. Desde 2002 a Fase não realiza concurso público. Este quadro, somado ao corte de custeios exigido para que o governo tucano alcançasse o proclamado e irreal déficit zero, faz com que os incides de reincidência sejam estimados em torno de 80%.

Entrega do patrimônio público

Os trabalhadores e o movimento sindical tem, sistematicamente, denunciado a falta de estrutura da Fundação, mas entendem que a permuta do terreno, nas atuais condições e sem explicitação de detalhes, pode significar a entrega de patrimônio público sem nenhuma garantia de melhorias ou resolução do problema da Fase. Existem divergências dentro do próprio governo sobre o preço inicial fixado, que varia, segundo as diversas fontes, de 70 a 160 milhões de reais. Segundo especialistas em avaliações imobiliárias consultados, o terreno poderia ser avaliado entre 500 milhões e dois bilhões de reais.

O projeto foi encaminhado ao legislativo gaúcho em dezembro de 2009, e só não foi à votação pelo veto do deputado estadual Raul Carrion (PCdoB). A partir da negativa de acordos de lideranças, Carrion busca agora, junto com moradores, trabalhadores e ambientalistas, garantir uma audiência pública que esclareça todos os pontos obscuros do projeto. Afinal, em ninhos tucanos, nunca o destinatário é realmente o beneficiado em negociações que envolvam a venda de patrimônio público.

Colaborou Regina Abrahão, Diretora do Sindicato SEMAPI-RS