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Crescimento não alivia a barra pesada do operário em construção

Apesar de os índices dos últimos três anos apontarem para um significativo crescimento da Indústria da Construção Civil, dados divulgados por entidades sindicais e departamentos de pesquisas indicam que os milhões de trabalhadores do setor têm muito pouco a comemorar.

Por Mariana Viel

Os problemas que afetam os trabalhadores da construção incluem a informalidade, as longas jornadas de trabalho, a qualificação profissional, a falta de equipamentos de segurança e os baixos salários – considerados o maior desafio da categoria.

Precarização

Com base no Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), sindicalistas denunciam a precarização do mercado de trabalho da construção. Os números revelam que construtoras e empreiteiras contratam quase oito vezes mais serventes do que pedreiros.

As contratações irregulares são impulsionadas pelo interesse capitalista de reduzir os custos e aumentar os lucros advindos da exploração do trabalho. Em média, o salário de um servente chega a ser 25% menor do que o de um pedreiro. Segundo o Caged, de janeiro de 2009 a fevereiro deste ano, 153 mil serventes de pedreiros foram contratados. No mesmo período, as construtoras admitiram apenas 20 mil pedreiros.

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil (Sintracon), Antônio de Souza Ramalho admite que apesar de ilegal, a prática é bastante comum. “Desde 2005 estamos vivendo uma espécie de “apagão da mão da obra”. Para suprir esta demanda muitos encanadores, gesseiros, pintores e serventes têm atuado em áreas que não fazem parte de sua qualificação profissional”.

O eletricista Uilton Nunes Ferreira, que há oito anos atua no setor, diz que muitos profissionais qualificados recebem propostas para trabalhar em cargos que exigem menos conhecimento técnico e pagam salários menores.

“Há algum tempo atrás fui fazer uma entrevista de emprego e eles me disseram que a vaga era para auxiliar de eletricista. Na verdade eles queriam me pagar menos. Um auxiliar faz a mesma coisa que um eletricista. Não aceitei o emprego porque me considero um profissional”

Veja o vídeo da entrevista do eletricista Uilton para a TV Vermelho

Quem não aceita submeter-se a esse tipo de exploração é levado ao caminho da informalidade. O número de trabalhadores da construção que atuam como autônomos ou em pequenas obras e reformas particulares é grande. Muitos profissionais são atraídos pela ilusão de salários maiores, ou pela sensação de serem seus “próprios patrões”.

O pedreiro Valter Macedo Souza, assim como a grande maioria dos profissionais do setor, afirma que já atuou na informalidade. “Eu mesmo pegava os serviços com as pessoas e fazia. Como autônomo a gente ganha mais, mas não tem muita segurança e direitos. Hoje prefiro trabalhar em uma empresa, desde que ela ofereça os benefícios e pague tudo em dia”.

Contratações ilegais

Um estudo divulgado pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócios Econômicos (Dieese), em maio deste ano, revela que segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) – realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – em setembro de 2008 o setor da construção possuía 6,9 milhões de trabalhadores.

Deste total, apenas 28,5% ou seja, 1.944.908 tinham carteira assinada. Em entrevista ao Vermelho um empresário da Construção Civil, que prefere não se identificar, revela que muitas contratações irregulares são feitas através de sub-empreiteiras responsáveis por aliciar os trabalhadores e convencê-los a optar pela informalidade. A prática é bastante comum em obras de pequeno porte, que necessitam de mão de obra apenas por um curto período de tempo.

“Os proprietários dessas sub-empreiteiras são pedreiros, com um pouco mais de “visão”, que moram no mesmo bairro e mantêm uma relação íntima com esses trabalhadores. Eles os convencem a optar pelo trabalho sem registro através do argumento de que a obra irá durar pouco tempo e que o registro vai acabar “sujando” a carteira”, explica.

Outro argumento utilizado para ludibriar os trabalhadores são os salários, aparentemente, mais vantajosos. “Eles ganham mais quando não têm carteira assinada. Como as sub-empreiteiras não arcam com os custos dos impostos e benefícios da categoria, conseguem oferecer salários maiores. Muitos pedreiros escolhem ficar sem o registro”. Ele confessa que cerca de 80% dos trabalhadores que atuam nas obras executadas por sua empresa atuam na informalidade.

Quem insiste em descumprir a legislação trabalhista se vale do discurso de que os encargos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) inviabilizam as contratações formais. “O grande problema hoje no Brasil são os custos indiretos. Muitas vezes o trabalhador ganha pouco, mas as empresas pagam muito”.

O empresário revela ainda os subterfúgios utilizados para driblar a lei. Na tentativa de evitar denúncias e se proteger de possíveis implicações legais no caso de acidentes no canteiro de obras, as empresas retêm a documentação dos trabalhadores – o que configura uma nova irregularidade.

“Qualquer problema que aconteça na obra o escritório da administração é imediatamente contatado. Muitas vezes ao mesmo tempo em que o funcionário acidentado está a caminho do hospital, a empresa realiza o registro na carteira com 30 dias retroativos”.

Trabalhando na legalidade

Para o engenheiro civil e empresário do setor de construção, Ildelfonso Octavio Severino Garcia, o registro é uma questão fundamental para a segurança de trabalhadores e empresários. “Ao trabalhar com funcionários registrados você garante seus direitos e obrigações. Tentamos sempre trilhar pelo caminho certo, que é significa seguir a legislação vigente”.

Ildelfonso – que é imigrante português e comunista – explica que todos os gastos com funcionários precisam estar previstos no orçamento da obra. A concorrência entre as empresas que seguem as determinações legais e aquelas que a ignoram são consideradas desleais. A prática impossibilita que os empresários apresentem orçamentos competitivos em concorrências de pequeno e médio porte.

“Os prejuízos pelo descumprimento da lei não afetam apenas os trabalhadores, mas também atingem todo o setor da construção. Quem trabalha de acordo com a lei, recolhendo os impostos e pagando todos os direitos, não consegue concorrer com aquele empresário que age na ilegalidade”.