Clareza na avaliação, para enfrentar novos desafios

A fala presidencial do último dia 23 em cadeia nacional de rádio e televisão foi tida por muitos como a […]

A fala presidencial do último dia 23 em cadeia nacional de rádio e televisão foi tida por muitos como a despedida do cargo de presidente da República, que exerceu ao longo de oito anos. Mesmo assim, tendo em vista o temperamento e a espontaneidade de Lula, é possível que ainda venha a público com algo a acrescentar.

É natural que o presidente estivesse emocionado e exultante com os resultados do seu governo. Lula deixa a Presidência com incrível popularidade e o índice jamais alcançado por qualquer antecessor de mais de 80 por cento de aprovação da obra realizada sob sua liderança política.

Lula despede-se politicamente vitorioso. Fez a sua sucessora, a presidente eleita Dilma Roussef e costurou uma folgada maioria política, suficiente, senão para ousar mais na realização de transformações radicais e profundas, ao menos para isolar os neoliberais e conservadores e assegurar governabilidade no período inicial do novo governo.

Sob qualquer aspecto que se analise, o Brasil da chamada era Lula é um país melhor – mais democrático, soberano em sua ação externa, empenhado na promoção do desenvolvimento econômico e da justiça social.

Os balanços setoriais e globais do desempenho do seu governo são eloqüentes em dados estatísticos sobre as mudanças que o Brasil experimentou ao longo dos dois mandatos presidenciais de Lula – progresso econômico,malgrado o hibridismo da política econômica, combate à pobreza extrema, melhoria na distribuição da renda, valorização do salário mínimo, ampliação do mercado interno, melhorias na educação, crescimento econômico, mobilidade social, incremento da infra-estrutura do país, inserção soberana do país no mundo globalizado e papel progressista ante um quadro internacional carregado de ameaças aos povos e às nações que lutam por sua soberania.

Este é um inegável saldo positivo que constitui a base sobre a qual se apoiará a nova presidente, Dilma Rousseff, e a partir da qual poderá, conforme o rumo que escolha, liderar o país em seus esforços para se firmar como nação soberana, democrática, socialmente justa e progressista, orientada para a realização de transformações políticas e sociais.

Sem ânimo de crítica nem de polêmica, falta na avaliação dos oito anos do governo Lula apontar de maneira mais enfática, nítida e frontal, a constatação de que o Brasil vive impasses estruturais e uma encruzilhada histórica, que só serão superados através da mobilização do povo e das forças políticas efetivamente progressistas no sentido da ruptura com o sistema político e econômico ainda vigente.

É certo que trilhar este caminho de luta por transformações profundas no país não é um ato de vontade presidencial, nem a mobilização popular ocorre ao sinal de uma quimérica vanguarda iluminada. O próprio povo precisa fazer seu próprio aprendizado do qual a experiência atual faz parte.

Sem baixar o tom das comemorações dos incontrastáveis êxitos do governo Lula, é necessário fazer, para preparar um novo avanço,uma abordagem multilateral. Ainda não foi claramente formulado no âmbito governamental, nem do conjunto das forças que respaldaram os dois mandatos de Lula e continuam a fazer parte da base de sustentação do governo, a partir do dia 1º de janeiro sob a liderança de Dilma Rousseff, um programa de reformas estruturais cuja realização represente efetivamente a superação dos entraves a que o Brasil se transforme num país política e socialmente avançado. Este é o grande desafio para as forças de esquerda no momento presente