Na despedida, lágrimas

Por Silvia Bessa

No último discurso em Pernambuco antes de deixar a Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) chorou por três vezes e soluçou numa delas.

´Se eu falhasse, quem falharia era a classe trabalhadora, os pobres que iriam provar que não teriam competência para governar`, disse Lula em festa promovida no Centro do Recife, enquanto enxugava as lágrimas e justificava a cobrança que se impôs após vencer a eleição de 2002. O momento de maior emoção de Lula se deu ao lembrar do seguinte episódio narrado por ele: ´Eu lembro que um dia, aqui, uma mulher falou que não ia votar em mim porque eu ia tirar tudo dela. O que eu ia tirar dessa mulher? Eu falei: 'Marisa, estou assustado, que eu fui num barraco e uma pessoa que não tinha nada, tinha medo de mim. Marisa (a primeira-dama) me dizia: 'Não desiste que um dia você vai convencer' e isso aconteceu em 2002`.

Em seguida, ouvia-se pelo microfone Lula contendo o choro. Na plateia, dezenas de ouvintes o copiavam. A fala deLula durou 33 minutos. Cerca de oitenta mil pessoas estavam no Marco Zero, segundo o coronel Eden Vespaziano, da Polícia Militar; 300 policiais participaram do esquema de segurança. Ao escutar a rima do jovem poeta Antônio Marinho, um pouco antes, Lula já havia lacrimejado, passado a mão no rosto várias vezes e franzido a testa. Logo no início do discurso, mencionou a vergonha de chorar. ´Uma coisa que admiro no povo é que o povo chora para fora, o povo 'cafunga', lacrimeja e político chora para dentro com vergonha`. Com um rasgo de tempo, foi ele a 'cafungar'.

Lula cumpriu agenda longa em Pernambuco, durante todo o dia. À noite, anunciou o início das obras do Cais do Sertão-Memorial Luiz Gonzaga e a cessão de uso gratuito de um terreno para a Orquestra Cidadã Meninos do Coque. Recebeu como homenagem do governador Eduardo Campos (PSB) uma faixa da Comenda Ordem dos Guararapes. Vestindo-a, brincou, afirmando que irá dormir com a faixa da comenda depois que entregar a faixa presidencial sábado, 1º de janeiro.O presidente fez uma retrospectiva de sua trajetória pessoal ao sair do município de Caetés (Agreste do estado) em 1952 e das lembranças políticas. Relembrou as campanhas derrotadas de 1989, de 1994 e 1998 e afirmou que os insucessos permitiram a percepção que ´não era possível governar o país sem conhecer o Brasil na totalidade`. Lula disse que é agradecido a Deus porque, ´sem o dedo de Deus`, não teria chegado à Presidência. ´Não era normal que um retirante de Caetés, que saiu do Sertão para fugir da fome, se transformasse em presidente do Brasil`.

Duas frases marcaram o trecho final do discurso: ´Aprendemos a gostar de nós, conseguimos nos respeitar, acreditar em nós e quem acredita em si próprio nunca será derrotado`. Era uma avaliação emocional de quem chega ao fim de um ciclo de oito anos de administração tendo como marca a perseverança. A outra: ´A palavra de ordem é apoiar a companheira Dilma (Rousseff) porque ela fará mais e melhor por Pernambuco`. Apesar de pedir apoio para a presidenta eleita, elefrisou que permanecerá nas ruas (´Nem pensem que vocês vão se livrar de mim`).

Ele aproveitou a despedida para mencionar obras, entre elas da Transposição do São Francisco e da ferrovia Transnodestina. Ao destacar esta, fez menção a Miguel Arraes – ex-governador e avô de Eduardo Campos. Citou também o nome do ex-governador, senador da bancada de oposição a Lula, Jarbas Vasconcelos (PMDB). Rápido, o tempo foi suficiente para uma vaia ganhar corpo.

Fonte Diario de Pernambuco