José Cícero – Velhos 7 de Setembro: Uma saudade que não passa

Por *José Cícero

Quem será capaz de não sentir saudades das antigas ‘paradas’ dos memoráveis desfiles de 7 de setembro que tradicionalmente nos anos idos, grassavam por este Brasil inteiro, incluindo o nosso interior?

Quem acaso conseguirá no dia de hoje não rememorar intimamente as velhas imagens guardadas no âmbar das nossas memórias afetivas, daquele tempo densamente marcado pela alegria e o contentamento embalador dos nossos sonhos mais utópicos, juvenis e mirabolantes?

Grandes desfiles que ficaram para sempre em nós, como verdadeiras cicatrizes em carne viva. Marchas cansativas que adorávamos participar com o sol a pino. Formação marcial, execução de hinos intermináveis. Discursos maçantes e fisiológicos. Colorido cívico e emblemático do verde oliva como que a pintar os nossos anseios por dentro. Quanta alegria de se compor a bandinha – a charanga do velho educandário. Instrumentos de couro cru e depois de nylon. Ensaios prolongados e cansativos pelas ruas. Dobrados, som de cornetas, coreografias apresentações da nossa cultura latente e regional. As memórias dos antigos 7 de setembro também se misturam no mesmo caldeirão de reminiscências os educandários, os colegas, os professores, familiares, as ruas com um coloridos diferente para aquele dia especial… O zelo e a preocupação dos nossos pais para com o fardamento e o "despertar" sempre mais cedo.

Antigos 7 de setembro agora são, por assim dizer, sonhos espedaçados. Lembranças hidricamente a se derramar nos olhos e nos nossos sentimentos mais sentidos. Saudade apenas. Passado. Eterno retorno das nossas memórias no túnel fantasmagórico do tempo e dos antigos anos em que éramos felizes e não sabíamos.

O 7 de setembro era uma festa. Glória maior de todo o nosso interior provinciano. Que, por menor que fosse o município, o 7 de setembro era um acontecimento grandioso. Um momento auspicioso e afirmativo esperado com sofreguidão e entusiasmo o ano inteiro. Um dos nossos instantes mais fortes no qual se expressavam os nossos sentimentos cívicos e valentes de estudantes caririenses aspirando um novo mundo…

Tempos difíceis mais adoráveis e inesquecíveis foram aqueles… Anos dourados da nossa meninice e juventude adolescente. Tempos áureos da ditadura, se é que podemos chamá-los assim, por conta dos seus desdobramentos e outras descobertas que só ficamos sabendo doravante. Mas que decerto, para a gente destes rincões do mundo, o 7 de setembro era uma conquista. Um instante da mais pura autoafirmação em que colocávamos no lugar mais alto e seguro do nosso coração verde-amarelo a nossa condição de cidadão, movidos pelo civismo mais absoluto no qual se encarnava e se expressava o nosso amor maior à ‘pátria amada e idolatrada salve e salve’.

Quase nada sabíamos dos trágicos acontecimentos políticos que ocorriam lá pra cima nos bastidores e nas masmorras tenebrosas dos militares na sua perseguição ferrenha aos chamados recalcitrantes revolucionários do terrível sistema. Vivíamos aqui assim mesmo em cada 7 de setembro acreditando piamente a cada ano numa utopia possível…

Mas no fundo não há como não reconhecer ainda hoje que o 7 de setembro do nosso passado nos marcara o mais profundamente possível. Razão maior das nossas saudades. Motivo grandiloquente das nossas lembranças mais fortes e inesquecíveis. Contudo, ainda agora por mais que queiramos, nunca haveremos de presenciar outros desfiles como os daqueles anos. Ademais, todo momento é único. Por isso é necessário que se viva intensamente tudo.

Todavia, a despeito de todo o sentimento de românticos que há muito perdemos ou os deixamos para trás, nas brumas do tempo, o 7 de setembro que um dia vivemos nunca mais será possível revivê-los. Eis aí toda a motivação desta saudade inexorável que nos invade a alma tanto quanto o espírito.

Então, quem não sentirá saudades das antigas ‘paradas’ dos velhos desfiles de 7 de setembro? Quantas saudades! Quantas recordações. E o mais incrível é que, malgrado todos estes anos que nos separam das comemorações de outrora, olhamos para trás e temos a nítida sensação de que tudo aconteceu como se fosse ontem.

Meu Deus que saudade dos antigos 7 de setembro! Um passado que, ao que parece, nunca passa dentro da gente.

José Cícero é professor, poeta e escritor

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