Capistrano: Arthur Moreira Lima, Um Piano pela Estrada.

Fiquei comovido ao assistir, na Praça do Campus da UFRN, no último dia 23 de dezembro deste ano (2011), Arthur Moreira Lima, consagrado pianista brasileiro, reconhecido como um dos grandes intérpretes de Chopin.  

Arthur Moreira Lima
Eu, o meu amigo Mery Medeiros e Dorinha, sua esposa, ficamos extasiados com a beleza do momento e o entusiasmo da plateia presente ao concerto. Ele, nos seus 71 anos de vida, já tendo se apresentado nas principais capitais do mundo, demonstrava uma imensa satisfação. Para se ter uma ideia da importância de Arthur Moreira Lima como pianista, entre as orquestras com quem já se apresentou estão as Filarmônicas de Leningrado, de Moscou, de Varsóvia, de Berlin, de Viena, Praga, BBC de Londres, National da França, isso sob a regência de regentes como Kurt Sanderling, Kirill Kondrashin, Jesus Lopez-Cobos, Vladimir Fedosseyev, entre tantos outros. Sempre aplaudido de pé ao término dos seus concertos. Na Praça do Campus da UFRN, ele estava encerando o 11º concerto na temporada do RN 2011, parecia uma criança, empolgado com a realização do seu projeto e a aceitação do público.

Ele vem realizando, desde 2003, esse projeto denominado “Um Piano pela Estrada”, provando com isso que a nossa gente gosta do que é bom, que a cultura dita de elite é um mito. Portanto, o que afasta o povo do teatro, das livrarias, das óperas, dos grandes concertos musicais, do balé, do cinema e da boa música é a falta de acesso a essas expressões artísticas e culturais. Dê condição ao povo que ele participa e gosta do que é bom, melhore a programação das emissoras de rádio e televisão que teremos um grande público sempre lotando as livrarias, as salas de cinemas e de espetáculos.

O pianista Arthur Moreira Lima, com o apoiou do Ministério da Cultura e da Lei Rouanet, Lei de Incentivo a Cultura, montou um caminhão, transformando-o em um verdadeiro palco e, saiu com ele pelas estradas do Brasil levando o seu piano e a suas belíssimas interpretações. Ele já realizou, em diversas cidades de todas as regiões do país, mais de 400 concertos, tocando os nossos clássicos: Vilas Lobo, Pixinguinha, Carlos Gomes, Ernesto Nazaré, Chiquinha Gonzaga, Tom Jobim, Luiz Gonzaga, Vinicius de Morais, sem esquecer os clássicos da música internacional, Chopin, Bach, Beethoven, Mozart e tantos outros grandes compositores da musica universal.

O espírito dessa ação de Arthur Moreira Lima, que é um marxista, de levar às praças o que a população não tem acesso, é uma ideia genial e de uma magnitude que faz lembrar a proposta do CPC – Centro Popular de Cultura, que no inicio dos anos sessenta percorreu todo o Brasil com um projeto coordenado pela figura humana de Oduvaldo Viana Filho, o Vianinha, marcando com a UNE–Volante uma época, apresentando espetáculos culturais nas praças, nas ruas, nos teatros e em qualquer lugar, desde que o povo pudesse assistir, demonstrando que o nosso povo gosto do que é bom.

Aqui no Estado tivemos nesse mesmo período o Centro Popular de Cultura de Natal, do qual tenho orgulho de ter participado juntamente com figuras do quilate de Hélio Vasconcelos, Josemá Azevedo, Nathanias Von Shosten, Moacyr de Góes, Tereza Braga, Berenice Freitas, Danilo Bessa, Franklin Capistrano, Irma Chaves, Jansem Leiros, Eurico Reis, Carlos Vila, Carlos Tinoco, Luis Maranhão e outras figuras da esquerda natalense que participavam da proposta do prefeito Maranhão, Cultura na Praça.

Era a Prefeitura de Natal, sob a liderança de Djalma Maranhão, popularizando a cultura. O golpe militar de 1964 interrompeu esse processo que estava dando ao povo brasileiro os instrumentos de consciência política, de dignidade de vida, de cidadania. Foi um período de efervescência cultural e política que levaria o Brasil no caminho seguro do desenvolvimento pleno. Nesse período realizamos uma série de apresentações nas praças da capital potiguar. Levamos o trabalhador para dentro do teatro Alberto Maranhão, que até aquele momento era o teatro da elite, a classe trabalhadora não tinha acesso a ele, era praticamente proibida de entrar no maior teatro do Estado. O prefeito Djalma Maranhão, dentro do projeto Cultura na Praça, construiu, no bairro do Alecrim, o teatrinho do Povo.

Na apresentação do espetáculo “O Auto de Tiradentes”, texto de Luiz Maranhão e Newton Navarro, no dia 1º de Maio de 1963, lotamos o teatro Alberto Maranhão com ferroviários, estivadores, portuários, trabalhadores da Construção civil. O povo foi ver o espetáculo, gostou do que viu e aplaudiu de pé ao fim da encenação.

Fico feliz quando vejo gestos como esse do pianista Arthur Moreira Lima. Sua permanente inquietação e a valorização que dá à nossa cultura fazem dele o mais popular, versátil e completo dos intérpretes clássicos brasileiros. Nossos aplausos e incentivo a projeto como esse. Chega de bandas de forró desqualificado e de cantores sertanejos.

 

Antonio Capistrano é professor da UERN.