Fora Collor: neoliberalismo, corrupção e a luta por um país justo

Há exatamente 20 anos, 441 Deputados Federais aprovaram o impeachment de Collor. Ouvindo o clamor da sociedade, particularmente os estudantes – denominados de caras-pintadas -, o parlamento brasileiro demonstrou maturidade e destituiu o primeiro presidente da República, que tinha sido eleito através do voto direto, após o fim da ditadura militar.

Por Christian Lindberg Nascimento, em seu Blog

Tive a satisfação de participar das inúmeras manifestações em Aracaju, na época estudante de química da antiga Escola Técnica Federal de Sergipe, e posso assegurar que o combate à corrupção, embora fosse o carro-chefe das manifestações, não era a única luta que estava em curso. Mais que destituir da presidência um governante corrupto, os caras-pintadas queriam mais verbas para a educação, reivindicação essa que confrontava com as políticas educacionais do presidente que prometeu caçar os marajás.

Liderados pela União Nacional dos Estudantes (UNE) e pela União Brasileira dos Estudantes Secundaristas (Ubes), milhares de estudantes brasileiros foram às ruas denunciar a corrupção vigente no Palácio do Planalto. Ancorados na denúncia feita pelo irmão do então presidente, o caráter combativo e alegre dos estudantes contagiou a sociedade que acabou aderindo ao pleito dos caras-pintadas. Mas a luta contra o neoliberalismo não cessou com o impeachment de Collor, pelo contrário, com a eleição do tucano Fernando Henrique Cardoso (FHC) esta luta entrou em um novo patamar.

O príncipe dos sociólogos, legitimado pela estabilização da economia, privatizou, demitiu servidores públicos, sucateou as universidades federais e submeteu o Brasil a um patamar de submissão no cenário político internacional. Somada a estes fatos, a corrupção deitava e rolava, a ponto de o procurador geral da República, o senhor Geraldo Brindeiro, receber o apelido de engavetador geral da República. Quem aqui não se lembra do escândalo Sivam? E a compra de votos de deputados para apoiar a reeleição de FHC? E as denúncias de favorecimento nas privatizações? São inúmeros os casos de corrupção que marcaram os oito anos de FHC na Presidência da República.

Com a eleição de Lula, a geração que derrubou Collor e resistiu à ofensiva neoliberal de FHC finaliza um ciclo político e começa outro. O desafio agora era iniciar um novo capítulo da história brasileira onde o crescimento econômico, a distribuição de riqueza e a inserção soberana no mundo globalizado fossem os eixos norteadores para a ação política.

Confesso que, em pleno 2012, 20 anos após o Fora Collor, o desejo daquela geração continua atuante. Hoje o Brasil não só abandonou a cartilha neoliberal, mas está se inserindo soberanamente nas relações internacionais. Do ponto de vista econômico, já somos a 6ª maior economia do mundo e mesmo convivendo com a maior crise do capitalismo, não nos deparamos com a recessão e o desemprego, diferenciando-nos dos países europeus e dos EUA. Quando o quesito é a inclusão social, mais de 23 milhões de pessoas saíram da linha de pobreza nos últimos 10 anos. Em estudo divulgado nesta semana o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicadas (Ipea) afirma categoricamente que tivemos a década inclusiva, entre os anos 2001 e 2011 – particularmente as regiões Norte e Nordeste -, contrariando uma tendência global.

Posso dizer que vivemos no melhor dos mundos possíveis? Confesso que não. Ainda há desafios para serem superados. Temos 10 milhões de brasileiros que vivem abaixo da linha de pobreza. Convivemos ainda com 9,6% dos brasileiros, com mais de 15 anos, que são analfabetos. O Sistema Único de Saúde não conseguiu prestar um serviço universal de qualidade. A corrupção persiste nos órgãos públicos e privados. O Estado brasileiro ainda não conseguiu constituir mecanismos democráticos de participação popular para a tomada de decisões. Estes e outros desafios precisam ser superados, afinal, a democracia requer não apenas a presença nas sessões eleitorais periodicamente, mas necessita que a cidadania seja exercida e estendida para todos.

Fonte: Blog do Christian