Em Cuba, intelectuais analisam a crise e condenam guerras

A terceira Conferência Internacional pelo Equilíbrio do Mundo, que se realiza desde a última segunda-feira (28) em Havana, conta com a presença de importantes intelectuais de todas as áreas do conhecimento. Desde o início são apresentados trabalhos políticos, filosóficos e culturais, que discutem os problemas históricos e a realidade do mundo contemporâneo à luz do pensamento de José Martí.

Ignacio Ramonet, Armando Hart Dávalos y Eduardo Torres Cuevas - Roberto Ruiz

“A Revolução cubana sempre defendeu que é necessário tomar como bandeira o pensamento de Martí, de conteúdo e força ética e humana”, assinalou Hector Hernandez, um estudioso da obra de Martí, ao fazer o principal pronunciamento na abertura do evento na última segunda-feira, em nome do Comitê Organizador.

Hernandez apresentou a figura de Martí em grandes traços: “Organizador da guerra, unificador dos patriotas, fundador do Partido Revolucionário Cubano, poeta, revelador das virtudes dos povos da América”.

Para ressaltar o significado de Martí para Cuba, disse que “a história cubana não poderia ser entendida sem o pensamento, a obra e o papel de Martí, que está na própria gênese do processo revolucionário cubano”.

Para Hernandez, Martí inspirou as grandes personalidades que estiveram à frente das lutas do povo cubano pela emancipação política, social e por sua identidade nacional, mencionando destacadamente Júlio Antonio Mella, fundador do Partido Comunista de Cuba, e Fidel Castro, “o mais extraordinário discípulo de Martí”.

Mas Martí não é só de Cuba, é patrimônio dos povos de Nossa América, é universal e pertence a toda a humanidade, assegura o estudioso, que lembrou uma das mais importantes frases do grande cubano: “Pátria é Humanidade”.

Por sua vez, Armando Hart Dávalos, presidente do Centro de Estudos Martianos, ao apresentar suas opiniões à Conferência, fez profundas reflexões sobre o mundo contemporâneo. “A humanidade está gravemente enferma e é nosso dever evitar a catástrofe que ameaça a sua existência”. Hart Dávalos assinalou que “todos os impérios empreendem ações para impedir o inevitável, ameaçam o uso da força, empreendem agressões para saquear as riquezas dos povos e destroem o meio ambiente”.

O intelectual cubano analisou a crise mundial atual: “É uma profunda crise do sistema capitalista, uma crise dos padrões de civilização, uma crise civilizacional, que afeta não só a economia, mas todos os aspectos da vida”. Mencionou as guerras de agressão e ocupação perpetradas pelo imperialismo – Iraque, Afeganistão, Líbia – e chamou a atenção para as ameaças de agressão à Síria, ao Irã e à Península Coreana.

Hart Dávalos terminou fazendo um apelo à luta “contra os que levam a humanidade a um beco sem saída” e pediu a união “para salvar a humanidade”.

Por sua vez, o cientista político argentino Atílio Borón lembrou que Martí dizia que “ser culto é o único modo de ser livre” e defendeu que a filosofia “deve ser uma arma da revolução”. “Se é uma filosofia séria, deve ser arma da revolução. Esta noção se opõe aos escolásticos”, ressaltou. Borón também fez uma aguda análise da crise do capitalismo e constatou que está em curso “a lenta e inexorável derrocada da civilização do capital”. E denunciou o imperialismo, que “é como a víbora: pode mudar de pele, mas não modifica sua essência”.

Eduardo Lorier, senador da República e secretário-geral do Partido Comunista do Uruguai, fez uma bem estruturada dissertação sobre a obra de Martí e suas interações com a de Karl Marx. Ao analisar as características do sistema capitalista hoje, ressaltou que este sistema tem três “deuses” – “o deus mercado, o deus investidor e o deus da especulação”.

O jornalista e escritor francês Ignacio Ramonet fez uma conferência intitulada “De José Martí ao Facebook, jornalismo e compromisso”. O editor do “Le Monde Diplomatique” iniciou condenando em termos veementes a publicação pelo diário espanhol “El País” de uma foto supostamente retratando o presidente venezuelano Hugo Chávez entubado. Dias depois da publicação, confrontado com a evidência de que se tratava de uma fraude, o jornal se retratou. Para Ramonet, a publicação demonstrou a prática de um “jornalismo miserável”.

O intelectual francês ressaltou as qualidades de Martí como jornalista e assegurou que se ele vivesse nos tempos atuais seria “blogueiro, tuiteiro e facebuqueiro”.

O Prêmio Nobel da Paz Adolfo Perez Esquivel, da Argentina, ocupou a tribuna da Conferência Internacional pelo Equilíbrio do Mundo para defender os esforços pela paz e em defesa dos direitos humanos, ao passo que o teólogo e escritor François Houtart afirmou que o bem comum da humanidade será encontrado em paradigmas “pós-capitalistas”.

A insustentabilidade do capitalismo foi constatada na intervenção de Pablo González Casanova, escritor mexicano e coordenador da Rede das Redes de Intelectuais e Artistas em Defesa da Humanidade.

Nesta quarta-feira (30), o ex-presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva faz uma intervenção especial, antes da sessão de encerramento, na qual estarão presentes altas autoridades do Estado e Governo cubano. O Conselho Mundial do Projeto José Martí de Solidariedade Mundial apresentará uma Declaração final.

De Havana,
José Reinaldo Carvalho