Jurada passa mal e julgamento do Carandiru é adiado para dia 15

O júri popular de 26 policiais militares acusados pela morte de 15 detentos do antigo complexo penitenciário do Carandiru, que começou nesta segunda-feira (8) no Fórum Criminal da Barra Funda (zona oeste de SP), foi adiado para terça-feira (15), às 9h, no mesmo local. Uma das juradas teve problemas de saúde e precisou ser dispensada e, por isso, o corpo de jurados precisou ser dissolvidos.

Segundo o juiz, a equipe médica que dá suporte ao júri constatou "impossibilidade" da jurada de permanecer no tribunal.

A sessão estava suspensa desde as 12h20 para que os jurados pudessem ler peças do processo e almoçar. O retorno deveria ter ocorrido às 13h20.

Na retomada do júri na próxima segunda, um novo Conselho de Sentença será sorteado em um grupo de 43 convocados –os 50 convocados inicialmente, menos os sete que foram sorteados hoje e acabaram dispensados.

Foi o segundo adiamento do júri, que seria realizado em 28 de janeiro deste ano, mas foi adiado pela Justiça a pedido de Ministério Público e defesa dos réus para que nova perícia de confronto balístico pudesse ser feita. Em março, o Instituto de Criminalística respondeu que novo laudo era inviável por razões técnicas.

Adiamento não traz prejuízo, diz promotor

Para o promotor titular do caso, Fernando Pereira da Silva, o adiamento não vai prejudicar a tese da acusação –para a qual os policiais atiraram sem chance de defesa para as vítimas.

"Estamos preparados para esse julgamento, e agora teremos uma semana a mais para focar nele e aguardar – a previsão inicial era que ele durasse duas semanas, adiado, não sofrerá maior prejuízo", disse.

Se a presença de 24 PMs causaram algum tipo de desconforto nos jurados? "Não me pareceu que tenha sido isso. O jurado [da nova data] pode vir tranquilo para desempenhar bem sua função, que é o julgamento da causa", afirmou. Indagado sobre réus que riam no plenário, durante a leitura de peças por parte dos jurados, antes da suspensão para o almoço, Silva resumiu: "Não percebi isso, de onde estava sentado, não via o rosto deles", declarou.

Quanto à ausência de dois dos réus, o representante do MP evitou polemizar:"Foi uma opção deles faltar, não sei se houve alguma justificativa. Mas vamos ver se no próximo estarão presentes".

Como se trata de réus soltos, a lei faculta a eles a possibilidade de não comparecer ao próprio julgamento. Em entrevista coletiva na sexta (5), o outro promotor do caso, Márcio Friggi, adiantara: ""De fato, o comparecimento não é obrigatório. Mas me causaria muita perplexidade a pessoa que se diz inocente não querer se defender".

O julgamento

Serão julgados 26 policiais militares acusados pelo assassinato de 15 presos do complexo do Carandiru, em São Paulo, em outubro de 1992.

Segundo informações do TJ-SP (Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo), dos 26 intimados para o julgamento, dois não compareceram ao fórum. São eles: Argemiro Cândido e Reinaldo Henrique de Oliveira. Os demais réus compareceram ao fórum sem farda.

O júri deve durar ao menos dez dias e é o primeiro de uma série de quatro que devem ser realizados até o final do ano para julgar o massacre, considerado o mais trágico na história do sistema prisional brasileiro. Ao todo, 111 presos foram assassinados.
Advogada se irrita com falta de almoço a réus

Compareceram hoje ao fórum seis testemunhas: cinco da acusação (entre sobreviventes e o perito aposentado Osvaldo Negrini Neto) e uma da defesa, cuja qualificação não foi informada.

No intervalo da sessão de hoje, logo após o sorteio dos jurados, a advogada dos réus, Ieda Ribeiro de Souza, estava irritada e deu declarações a interlocutores, em voz alta, sobre uma representação que pretende enviar ao CNJ (Conselho Nacional de Justiça). O motivo: o TJ não providenciou alimentação para os réus, sob alegação de que, soltos, eles podem sair do fórum para almoçar. A advogada sugeriu que os PMs acabariam se deparando com jornalistas na lanchonete do prédio.

Para os jurados, a alimentação é por conta do TJ –cerca de R$ 8.000 para as duas semanas de júri.

84 PMs denunciados

No total, 84 policiais militares foram denunciados –destes, cinco já morreram, entre os quais o comandante da operação policial, o coronel da reserva Ubiratan Guimarães, assassinado em São Paulo em 2006, mesmo ano em que acabou sendo absolvido pelo Tribunal de Justiça de São Paulo de uma condenação a 623 anos que obtivera em 2001 pelas mortes no Carandiru.

Após a sentença, Marzagão –que em setembro de 2012 designou a data do júri– deverá definir a data do próximo júri: dessa vez, o de 28 PMs, da Rota, acusados pela morte de 73 presos do terceiro pavimento. O magistrado disse que espera julgar o caso todo até o final deste ano.

De todas a acusações, 86, de lesão corporal leve, já prescreveram. As de homicídio prescrevem em 2020.
Perícia prejudicada

O júri estava marcado para janeiro deste ano, mas foi adiado após pedido da defesa e da acusação para que a pericia de confronto balístico fosse refeita. Mês passado, o Instituto de Criminalística enviou ofício ao Judiciário informando que nova perícia seria inviável por razões técnicas.

De 28 projéteis para laudo, por exemplo, apenas três, segundo o IC, estão em condições de análise em função das mais de duas décadas decorridas. Dos 350 revólveres, 250 estão sem condições, e, no restante, ela não seria conclusiva.

Para o Ministério Público, no entanto, a impossibilidade técnica de se individualizar qual policial matou qual preso não deve dificultar os trabalhos da acusação.

"A imputação feita aos acusados nunca foi a de conduta individualizada, nem precisa, quando se fala em uma situação de concurso de pessoas para a prática de crime. O confronto balístico nunca foi imprescindível, nessa linha", disse um dos promotores do caso, Márcio Friggi.

"O importante é que não se trata de um julgamento da PM do Estado de São Paulo; não é a instituição, que sempre foi nossa parceira, sentada no banco dos réus: falamos de policiais e ex-policiais que violaram a lei, e, por isso, estão sendo julgados", completou o promotor titular, Fernando Pereira da Silva.

"Muita gente na sociedade ainda entende que bandido bom é bandido morto. De nada adianta vai adiantar todo um conjunto probatório se os jurados julgarem com base nessa linha", disse Friggi, nessa sexta (5), na entrevista coletiva em que o MP falou sobre os preparativos para o julgamento.

Fonte: UOL