Arnaldo Romero: "No está muerto quien pelea"

A história é feita por homens reais em circunstâncias concretas. Não há espaço para o “se”. No Paraguai real, perguntas do tipo: e se o presidente Lugo tivesse resistido ao golpe? E se a esquerda tivesse saído unida nas eleições? E se não houvesse o Exército do Povo Paraguaio – EPP fazendo das suas? etc., servem apenas para avivar as discussões, nada além disso. A história está posta. Só nos resta analisar o que aconteceu e avançar sobre as ruínas do que ficou.

Por Arnaldo Romero*

Paraguay

O que revelam as eleições gerais no Paraguai do último fim de semana? Em primeiro lugar a grande afluência dos eleitores ao pleito, quase 70% (2.391.790 votos) segundo as últimas notícias, é um dado positivo. Número significativo de eleitores em qualquer democracia, não revela, no entanto, a lisura do processo – fraudes grassaram em todos os departamentos do país. Mas, por outro lado, como as eleições ficaram polarizadas entre os Colorados e os Liberais, ambos se controlaram mutuamente. Tanto é assim que no Departamento de Amambay, situado ao norte do país, fronteira com o Brasil, até este momento (24 de abril), a recontagem dos votos ainda não foi concluída, por conta da diferença de 11 votos a favor dos colorados!

“O senhor Cartes é o vencedor destas eleições”, com essa frase o presidente do Tribunal Superior da Justiça Eleitoral (TSJE) do Paraguai anunciou a volta dos herdeiros do “stronismo” ao poder central no país. Das forças políticas mais importantes o grande derrotado foi o Partido Liberal Radical do atual Presidente da República, um dos autores do golpe parlamentar que tirou Fernando Lugo do poder. Tanto é assim que ao analisar os resultados da eleição o ex-presidente afirmou: “Difícil fazer interpretações rápidas, mas todos os indicadores nos dizem que o Partido Liberal perdeu as eleições em 22 de junho de 2012 (dia do golpe parlamentar),quando conspirou para fazer um julgamento político injusto e ilegítimo”.

Sem dúvida a Associação Nacional Republicana Partido Colorado foi a grande vencedora no pleito do fim de semana. Porém traz um fardo muito pesado em seus ombros. Com promessas populistas e em um discurso reacionário quer reavivar a cultura do clientelismo, do autoritarismo, do compadrio, e de perversão político-partidária – heranças da ditadura militar que se negam a morrer e que custará muito caro ao novo presidente.

Importante lembrar nessa vitória o apoio integral e descarado dos meios de comunicação, que fizeram campanha aberta e tendenciosa ao candidato colorado; cerceando as forças populares e partidos de esquerda o direito de divulgação de suas ideias e propostas. Mais uma vez, essa prática coloca na pauta de discussões para os democratas dos países latino-americanos o conluio que sempre se forma em defesa de seus interesses da grande imprensa com o capital e a necessidade do controle social da mídia.

Outra crise se antevê no partido do novo mandatário da nação:com uma candidatura imposta pela força do dinheiro, Horácio Cartes, que não é um colorado tradicional, deverá equacionar uma luta fratricida que se avizinha entre os colorados-novos e os colorados- históricos pelo comando do poder, o que poderá enfraquecer sua agremiação política.

Fato relevante foi a performance do Partido Unace (União Nacional de Colorados Éticos) de Lino Oviedo (falecido em plena campanha eleitoral), que na eleição de 2008 obteve quase 22% dos votos para a presidência, nestas eleições não conseguiu nem 1% dos votos, jogando uma pá de cal num projeto político que não consegui sobreviver ao seu mentor e líder. Outra força que, provavelmente, dá adeus nesse cenário político é o Partido Pátria Querida que no pleito passado recebeu quase 3%, nestas eleições seu candidato Miguel Carrizosa G. a presidente não recebeu nem a metade dos votos, garantindo apenas uma representação simbólica nos poderes do Estado paraguaio.

Segundo dados não definitivos Horácio Cartes, candidato colorado, obteve 45,8% dos votos; Efraín Alegre, candidato liberal, 36,9%; e os candidatos da esquerda Mário Ferreiro (Avanza País) e Aníbal Carrillo (Frente Guaçu), 5 e 3,4% respectivamente. Ainda segundo esses mesmos dados o Partido Liberal perdeu, além da presidência da República, 2 senadores, 6 governadores e 5 deputados.

Por outro lado as esquerdas se converteram na terceira força política do país. Com quase 220 mil votos, 140 mil obtidos por Mário Ferreiro e os 80 mil conseguidos por Aníbal Carrillo, além das 5 vagas no Senado e das 2 na Câmara de Deputados da Frente Guaçu (Carrillo); 3 senadores e 2 deputados do Avanza País (Ferreiro) essas agremiações à esquerda se colocam como a uma importante força política ficando atrás apenas dos colorados e dos liberais.

Relevante foi a reeleição de Ricardo Canese como deputado para o Parlamento do Mercosul, assim como a possível eleição do camarada Najeeb Amado do Partido Comunista do Paraguai como o primeiro deputado socialista eleito do Parlasul.

Importante lembrar a atuação de outras agremiações, que mesmo não obtendo significativa votação, se posicionaram contra o golpe e em favor das causas dos trabalhadores e das mulheres como foi o caso do Movimento Kuña Pyrenda e do Partido dos Trabalhadores.

As lições que ficam são as mesmas: que a disputa eleitoral deve estar vinculada à organização das massas, dos trabalhadores e do movimento social. Que nenhuma das duas frentes é mais importante que a outra e que não são excludentes. Que é necessário organizar os trabalhadores e lutar por espaços no parlamento e no Executivo, o que tem se mostrado útil e necessário para o avanço das conquistas do proletariado e das causas populares.

Que também é importante garantir as conquistas institucionalmente, e avançar nas reivindicações gerais da sociedade e das questões específicas das mulheres, direitos humanos, ecologia, juventude, cultura, etc. nas ruas. É que, é dessa conjunção de forças que resultará um novo patamar civilizatório para nossos povos e fará com que revezes do tipo que se avizinha no Paraguai, não possam se repetir em outros países de nossa América.

* Arnaldo Romero é diretor do núcleo do Cebrapaz no Mato Grosso do Sul