Política do Egito para fronteira com Gaza precisa ser reavaliada

A passagem de Rafah tornou-se a principal linha vital conectando os residentes da Faixa de Gaza com o Egito e o mundo externo. A dependência de Gaza em Rafah aumentou depois de Israel ter destruído o único aeroporto no território, em 2002, durante a Segunda Intifada (levante palestino de resistência) e impôs restrições estritas sobre o movimento de indivíduos através da passagem de Erez, limitando o seu uso para casos humanitários e membros de organizações internacionais.

Passagem de Rafah entre Gaza e Egito - Rafah Today

O Hamas (partido de resistência islâmica que governa Gaza) vê na passagem uma chave para a sua legitimidade na Faixa de Gaza. Depois que Israel impôs o seu bloqueio, o Hamas foi impulsionado a exercer pressão sobre o regime egípcio anterior (do presidente Hosni Mubarak) para reabrir a passagem de Rafah e facilitar o movimento através dela, finamente conseguindo depois de um ataque naval israelense a um navio humanitário da Turquia em direção a Gaza, em 2010.

Desde que o Hamas chegou ao poder, em 2007, na Faixa de Gaza, a passagem de Rafah foi quase completamente fechada, depois da saída de observadores internacionais posicionados no local, como parte do suposto acordo alcançado quando Israel retirou-se de Gaza, em 2005.

Com a ascensão da Irmandade Muçulmana ao poder no Egito, após a "Revolução de 25 de Janeiro", os habitantes palestinos da Faixa de Gaza bloqueada esperavam uma melhoria no movimento de indivíduos entre Gaza e o Egito, mas nenhuma mudança significativa se materializou e as condições nunca foram restauradas para as anteriores à ascensão ao poder pelo Hamas.

De acordo com Maher Abu Sabha, diretor da Administração Geral das Passagens e Fronteiras no Ministério do Interior do Hamas, a passagem de Rafah está aberta durante a semana, com uma média de 800 indivíduos passando diariamente para o Egito, e um número similar entrando de volta a Gaza.

A situação securitária instável na Península do Sinai adjacente a Gaza afeta diretamente para facilitar ou dificultar a passagem dos viajantes pela passagem. Isso foi evidente durante este mês, quando sete soldados egípcios foram raptados por salafistas (linha do sunismo islâmico que se divide entre os que empregam a violência para fins religiosos e os que a condenam), o que causou o fechamento da passagem de Rafah por cinco dias. A passagem só foi reaberta depois da liberação dos reféns.

Durante o ano passado, a passagem também foi fechada por 20 dias quando salafistas baseados em Gaza foram acusados de participar de um ataque terrorista contra um posto do Exército do Egito, com o resultado de 16 soldados mortos durante o mês do Ramadã (nono mês do calendário islâmico dedicado à reflexão espiritual). A acusação foi negada por todos os grupos palestinos.

O primeiro-ministro de Gaza, Ismail Haniyeh, que também é o vice-líder do Birô Político do Hamas, pediu ao Egito que reavalie os Acordos de Camp David (o fim da década de 1970, entre Israel e o Egito), construa “uma estratégia abrangente relacionada ao Sinai” e adote uma nova política nova para a passagem terrestre do Sinai.

Em um discurso de 24 de maio, em Gaza, Haniyeh pediu ao Egito para “reavaliar mas não necessariamente cancelar os Acordos de Camp David, especialmente com relação aos artigos sobre segurança dos acordos, enquanto avançando na discussão de temas urgentes pelos políticos egípcios”.

Além disso, agências de segurança do Egito e alguns partidos de oposição acusam o Hamas de afetar a segurança do Sinai e contribuir para espalhar a instabilidade, o que aumentou com a revolução egípcia e com a derrubada do regime anterior, do ex-presidente Hosni Mubarak. O Hamas, por outro lado, está lutando de forma diligente por manter-se fora da mídia egípcia, enquanto acusa os jornais de incitamento contra si sem uma causa devida.

Seleção administrativa para travessia

Qualquer palestino que queira atravessar a fronteira para o Egito precisa completar um longo procedimento antes de começar a sua viagem. Ele começa com o registro no Ministério do Interior de Gaza, onde seu nome é posto em uma lista de passageiros e número do ônibus que ele tomará é especificado. Depois, deve ir para a área aberta de espera, na passagem de Rafah, cedo pela manhã, no dia em que pretende viajar. Lá os passageiros são alocados em diferentes ônibus.

Depois, o viajante irá à sala de passageiros, onde estamparão o seu passaporte depois de ele pagar as taxas. A seguir, ele volta para o ônibus e espera até que o motorista receba permissão para ir até o portão egípcio da passagem. Depois de cruzar para o lado do Egito, o viajante passa por uma vistoria de segurança, e então entra para o saguão de entrada para esperar a permissão para entrar no território egípcio.

Enquanto espera no saguão, do lado palestino da passagem, Abu Said disse que chegou à área aberta de espera às 06h00 da manhã. Às 16h00, ele ainda estava esperando que o lado palestino desse permissão para ele entrar no Egito.

Abu Said disse ao portal Al-Monitor: “Viajei hoje com a minha esposa e a mãe dela, para que a minha esposa fizesse uma cirurgia no Hospital Nasser, depois de recebermos a transferência do Ministério da Saúde palestino. Começamos a nos preparar para a viagem há quase um mês”.

As autoridades egípcias impuseram restrições ao movimento de viajantes palestinos através da passagem, particularmente homens entre os 18 e os 40 anos de idade, que precisam obter permissões securitárias extras das agências de segurança egípcias. O Egito também limita a viagem através dos territórios egípcios àqueles que dizem precisar de tratamento médico ou que pretendam viajar para o estrangeiro, requerendo deles também vistos de entrada para os países de destino.

A Administração Geral das Passagens e Fronteiras contabilizou a partida de cerca de 210.000 viajantes palestinos através da passage de Rafah em 2012, em comparação com mais de 130.000 em 2011 e quase 86.000 em 2010. Além disso, as autoridades de Rafah negaram a passagem de 26.000 viajantes em 2012, em comparação com 8.000 em 2011 e 12.000 em 2010, alguns por questões de segurança e outros, a maioria homens jovens, porque não tinham todos os documentos necessários para a travessia.

Meios alternativos para atravessar a fronteira

Através da fronteira egípcia-palestina há diversos túneis usados para transportar alimentos, animais de criação, automóveis, combustível e materiais de construção, assim como indivíduos impedidos pelas autoridades egípcias de atravessar por Rafah.

Em seu discurso, Haniyeh comentou sobre a abdução dos soldados egípcios no Sinai dizendo que “os desenvolvimentos foram acompanhados conforme as nossas responsabilidades como vizinhos e irmãos, e o nosso governo entende as preocupações do Egito com a segurança”. Ele ainda enalteceu um “Egito pós-revolucionário” e disse que “muitos aspectos positivos caracterizaram o Egito desde a revolução. Numerosos sucessos foram alcançados com relação à causa palestina e a Gaza, entre eles o acordo para a troca de prisioneiros, assim como desenvolvimentos relacionados à abertura da passagem de Rafah. O Egito também deixou a sua posição clara com relação à última guerra conduzida contra o povo palestino de Gaza, e facilitou o desenvolvimento e a construção” no território.

Entretanto, de tempos em tempos as forças armadas do Egito conduzem campanhas contra os túneis espalhados pela fronteira, e até destroem alguns deles, o que tem impactos negativos para o envio de bens para Gaza e leva a um aumento do preço dos materiais de construção e de combustível contrabandeados.

Todos os incidentes securitários que acontecem no deserto do Sinai, onde perambulam jihadistas salafistas (extremistas religiosos que usam métodos violentos), são respondidos pela mídia egípcia com acusações diretas, alegando o envolvimento do Hamas. Como resultado, Haniyeh pediu a adoção de uma estratégia abrangente no Sinai para governar a relação com o Egito nesta matéria.

Fonte: Al-Monitor
Tradução: Moara Crivelente, da redação do Vermelho