Movimento de moradia faz acampamento e cobra ação da prefeitura

Trezentas famílias com renda mensal de até três salários mínimos, moradoras da capital paulista, boa parte em locais precários na região de Heliópolis e Ipiranga, na Zona Sul. Eles estão acampados desde a noite de domingo (14) no Viaduto do Chá, em frente à sede da prefeitura, Centro, para reivindicar desapropriações, alvará de construção e auxílio aluguel. Eles exigem falar com o prefeito Fernando Haddad (PT) e os prazos para a entrega das 55 mil unidades habitacionais do município.



Cerca de 300 famílias acampadas no Viaduto do Chá, centro/fotos: Deborah Moreira

Em visita a uma obra, em Paraisópolis, nesta segunda-feira (15), o prefeito reinterou o diálogo. “Tenho reuniões frequentes com movimentos por moradia. Semana passada estive reunido com 10 lideranças de movimentos e esse grupo, em particular, não estava representado. Mas estou aberto a me reunir sempre que precisar para explicar que não vou poder destinar 55 mil moradias só para entidades organizadas”, disse Haddad.

Ele também ratificou a meta de construir as 55 mil moradias até 2016 e que já estão sendo construídas 17 mil (casas) e que, até o final de julho, novos terrenos serão doados para a Caixa Econômica Federal para outras 3 mil novas unidades.

“Só que até agora nada nos foi informado. Estivemos acampados aqui no início de maio e agora novamente porque a situação em nada mudou. E só saímos daqui com a data marcada para entrega das habitações. Duas assessoras estiveram aqui e nos pediram para desmontar acampamento para que as negociações sejam feitas. Também já houve informação de que o Haddad vem até aqui falar com a gente. Mas, pra nós o que interessa é ver a proposta concreta”, declarou Paulo Roberto Nunes Viana, liderança do Movimento Moradia Casa Dez. A prefeitura não confirmou as informações.

De acordo com o movimento, três terrenos particulares já estão prontos para a desapropriação, mas aguardam as providências da administração pública. Um deles é onde funcionava o Hospital Psiquiátrico Charcot, no km 12 da Rodovia Anchieta, Vila Liviero, Zona Sul, desativado em 2008 após denúncias de maus tratos ao internos. De acordo com Paulo Roberto, devem pelo menos R$ 5 milhões em IPTU, além de dívidas com a Sabesp, por exemplo. Outro imóvel fica na rua Francisco Pedroso, na mesma região, que soma pelo menos R$ 15 milhões de dívida com o município. Um terceiro local é um galpão no Jardim Primavera, região de Interlagos, que já foi desapropriado e incorporado como zona de interesse social. Seu proprietário quer negociar o recebimento do valor da desapropriação, iniciada há dois meses. Mas até agora não recebeu nenhum valor. O Vermelho não conseguiu contato com nenhum dos proprietários.

O advogado do movimento, Perez Agripino Luiz, contou ao Vermelho que os sem-teto têm três reivindicações: “Além da desapropriação dos terrenos, também exigimos o alvará para o projeto Aratimbó da CDHU [Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano] e Caixa Econômica Federal, que há um ano aguarda a autorização do município para construção. Além disso, também exigimos o pagamento de bolsa-aluguel para quem está aguardando uma solução”.

O advogado detalhou que foram protocolados, desde abril, pedidos para novos auxílio aluguel para mais 1.500 famílias, que vivem na casa de parentes, conhecidos ou em lugares precários. Como o casal Larissa Cristina Fernandes Porfírio dos Santos, 20 anos, e Heitor Augusto Porfírio dos Santos, 30. Juntamente com as duas filhas, de 6 meses e de 3 anos, moram em um quarto e sala na Vila Santa Catarina, Zona Sul da cidade, com uma renda mensal de R$ 1.100, pagando um aluguel de R$ 450. Ela está desempregada e tem dificuldades por não encontrar vaga em creches da região. Ele, mantém as despesas instalando rastreadores automotivos. Mesmo com a falta de estrutura, eles afirmaram que não deixarão o local até obterem a bolsa-aluguel.


Larissa e a filha mais nova no acampamento

“Vale a pena ficar. A gente precisa desse dinheiro para sobreviver. Mesmo com as dificuldades e com esse sol forte dentro das barracas, a gente vai ficar”, contou Larissa, que para manter a higiene das filhas levaria as duas de volta para a casa, na zona sul, para dar banho e trocar de roupa.

A ação

O acampamento com cerca de 30 barracas foi erguido em poucos minutos na noite de domingo. No centro, foi instalada a cozinha comunitária, que serve café da manhã, almoço, café da tarde e jantar. No horário de almoço desta segunda, cinco mulheres ajudaram a cozinhar arroz, feijão e salsicha para cerca de 300 pessoas presentes. “Nem todos estão aqui agora, porque alguns foram trabalhar. Estamos nos revezando, mas esse número de refeição alta é porque ainda deu para alimentar alguns moradores de rua”, explicou a promotora de vendas Claudete de Assis Lima, 35, voluntária da cozinha.

Ainda terminando de almoçar, uma promotora de eventos baiana, de 32 anos, que pediu para não se identificar, contou que está acampada com outras duas pessoas na mesma barraca para conseguir o auxílio aluguel, que é de R$ 450, pagos por 30 meses. “Moro em pensão com meu filho, onde pago R$ 500, e desde que voltei para o Brasil, há dois anos, não tenho conseguido nada. E pior, tenho um ex-marido que está tentando tirar meu filho e levar embora”, contou ela ao Vermelho que tem receio de sofrer ameaça do ex-marido.

Há 5 anos, a promotora de eventos que com os bicos em Buffet consegue cerca de R$ 800, ao mês, foi morar em Madrid, Espanha, onde conheceu um romeno, com quem se casou e teve um filho. De acordo com seu relato, sofreu violência doméstica inúmeras vezes e acabou voltando para o Brasil com o filho. “Ele veio atrás de mim aqui [no Brasil] e quer a guarda para levá-lo embora. Como estou nessa situação [sem trabalho fixo] fica me ameaçando. Por isso preciso de um lugar meu para morar”, completou.

Deborah Moreira
Da redação do Vermelho