Allysson Lemos : A luta latino-americana contra o imperialismo
Pretendo neste texto fazer algumas breves contribuições ao debate da nova luta pelo socialismo na América Latina feito na tese do Congresso do PCdoB.
Publicado 01/08/2013 09:48 | Editado 13/12/2019 03:30
Ressalto este aspecto do debate por entender que além da notável sobrevida que os países latino- americanos possuem neste período de crise econômica do sistema capitalista, as forças de esquerda também demonstram grande amadurecimento tanto do ponto de vista político e ideológico, como de seus lastros sociais, resistindo e avançando contra as forças reacionárias.
Este amadurecimento certamente diz respeito às grandes lutas feitas contra as ditaduras apoiadas pelo imperialismo e nas lutas contra o neoliberalismo. Tal fato tem distinguido a luta política na América Latina de outras regiões, onde as opções à direita têm se imposto eleição após eleição.
No entanto, apesar da tese reconhecer as singularidades de cada processo, a tese não as identifica, e ao fazê-lo, pretende reuní-las na chave da luta anti-imperialista através do desenvolvimento. Creio que as iniciativas como o banco comum, o fortalecimento das relações comerciais através do Mersocul são movimentações fundamentais, porém devemos entender o debate da integração da América Latina em nível ainda mais elevado.
No nosso continente surge a oportunidade de construção de um novo padrão civilizatório e isso exige entender as diversas dimensões da luta (econômica, política, mas também cultural) e como elas se relacionam. Além de desenvolver as forças produtivas, derrotar as forças reacionárias no sentido de conduzir a uma direção da classe trabalhadora, precisamos propor também uma alternativa no campo dos valores à sociedade de consumo imposta pelas grandes potências capitalistas. Afinal a dominação imperialista funciona também em todos estes aspectos.
Este entendimento é a razão do sucesso da vitória do Movimiento al Socialismo (MAS) e de Evo Morales na Bolívia. Em contraposição à esquerda tradicional da Bolívia, que sob a visão de uma aliança tática com os setores burgueses nacionalistas defendiam a integração do índio à vida nacional (Garcia Linera), que na prática significava a transformação do indígena em camponês, abandonando-se seu modo de viver e tornando-se um cidadão boliviano, o MAS e sua base social passaram a defender a junção do discurso étnico com o discurso de classe. Assim, o indígena das comunidades tradicionais e os cocaleros passam a ser representados como os “indígena-originário-camponeses”.
Ou seja, só o aprofundamento do programa revolucionário no aspecto do reconhecimento identitário do povo boliviano como indígena e camponês permitiu uma ampla coalizão popular, que se uniu contra o neoliberalismo. A pauta que era contra as mazelas trabalhistas e pela retomada dos recursos naturais das mãos do capital consolidou-se com a lei do “vivir bien”, que diz respeito às tradições culturais dos povos bolivianos e é contra a sociedade de consumo. Este debate se espalha principalmente nos países andinos.
Longe de reivindicar uma cópia deste modelo ao Brasil, chamo a atenção para a necessidade de se reivindicar uma identidade latino-americana que nos aproxime destes povos e nos distancie dos valores da sociedade de consumo. A nossa visão de desenvolvimento deve ter essa perspectiva humana, na qual entender como nosso povo assimila os discursos políticos e a partir de então defender pautas que desenvolvam suas potencialidades assume caráter fundamental.
Parece-me que iniciativas que mexam nos programas escolares, fazendo com que desde a mais tenra idade se conheça melhor a história do continente, contrastando o eurocêntrico ensino de História que vemos hoje, que construam uma universidade que não só forme mão-de-obra para o mercado de trabalho, mas que forme cidadãos críticos e que influencie na formação de uma identidade contra- hegemônica, assim como a divulgação da produção científica e artística do continente sejam fundamentais na luta anti- imperialista. Esta deve ser a lógica do desenvolvimento que devemos construir, evitando a cooptação cultural imposta pela burguesia.
Allysson Lemos Gama da Silva é militante do PCdoB- RJ.