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Allysson Lemos : A luta latino-americana contra o imperialismo

Pretendo neste texto fazer algumas breves contribuições ao debate da nova luta pelo socialismo na América Latina feito na tese do Congresso do PCdoB.

Ressalto este aspecto do debate por entender que além da notável sobrevida que os países latino- americanos possuem  neste período de crise econômica do sistema capitalista, as forças de esquerda também demonstram grande amadurecimento tanto do ponto de vista político e ideológico, como de seus lastros sociais, resistindo e avançando contra as forças reacionárias.

Este amadurecimento certamente diz respeito às grandes lutas feitas contra as ditaduras apoiadas pelo imperialismo e nas lutas contra o neoliberalismo. Tal fato tem distinguido a luta política na América Latina de outras regiões, onde as opções à direita têm se imposto eleição após eleição.

No entanto, apesar da tese reconhecer as singularidades de cada processo, a tese não as identifica, e ao fazê-lo, pretende reuní-las na chave da luta anti-imperialista através do desenvolvimento. Creio que as iniciativas como o banco comum, o fortalecimento das relações comerciais através do Mersocul são movimentações fundamentais, porém devemos entender o debate da integração da América Latina em nível ainda mais elevado.

No nosso continente surge a oportunidade de construção de um novo padrão civilizatório e isso exige entender as diversas dimensões da luta (econômica, política, mas também cultural) e como elas se relacionam. Além de desenvolver as forças produtivas, derrotar as forças reacionárias no sentido de conduzir a uma direção da classe trabalhadora, precisamos propor também uma alternativa no campo dos valores à sociedade de consumo imposta pelas grandes potências capitalistas. Afinal a dominação imperialista funciona também em todos estes aspectos.

Este entendimento é a razão do sucesso da vitória do Movimiento al Socialismo (MAS) e de Evo Morales na Bolívia. Em contraposição à esquerda tradicional da Bolívia, que sob a visão de uma aliança tática com os setores burgueses nacionalistas defendiam a integração do índio à vida nacional (Garcia Linera), que na prática significava a transformação do indígena em camponês, abandonando-se seu modo de viver e tornando-se um cidadão boliviano, o MAS e sua base social passaram a defender a junção do discurso étnico com o discurso de classe. Assim, o indígena das comunidades tradicionais e os cocaleros passam a ser representados como os “indígena-originário-camponeses”.

Ou seja, só  o aprofundamento do programa revolucionário no aspecto do reconhecimento identitário do povo boliviano como indígena e camponês permitiu uma ampla coalizão popular, que se uniu contra o neoliberalismo. A pauta que era contra as mazelas trabalhistas e pela retomada dos recursos naturais das mãos do capital consolidou-se com a lei do “vivir bien”, que diz respeito às tradições culturais dos povos bolivianos e é contra a sociedade de consumo. Este debate se espalha principalmente nos países andinos.

Longe de reivindicar uma cópia deste modelo ao Brasil, chamo a atenção para a necessidade de se reivindicar uma identidade latino-americana que nos aproxime destes povos e nos distancie dos valores da sociedade de consumo. A nossa visão de desenvolvimento deve ter essa perspectiva humana, na qual entender como nosso povo assimila os discursos políticos e a partir de então defender pautas que desenvolvam suas potencialidades assume caráter fundamental.

Parece-me que iniciativas que mexam nos programas escolares, fazendo com que desde a mais tenra idade se conheça melhor a história do continente, contrastando o eurocêntrico ensino de História que vemos hoje, que construam uma universidade que não só forme mão-de-obra para o mercado de trabalho, mas que forme cidadãos críticos e que influencie na formação de uma identidade contra- hegemônica, assim como a divulgação da produção científica e artística do continente sejam fundamentais na luta anti- imperialista. Esta deve ser a lógica do desenvolvimento que devemos construir, evitando a cooptação cultural imposta pela burguesia.

Allysson Lemos Gama da Silva é militante do PCdoB- RJ.