Conferência das Cidades do RS escolhe 83 delegados

O deputado estadual Raul Carrion, que representa a Unale (União dos Legislativos e Legisladores Estadual) no Conselho das Cidades, é conselheiro estadual e membro da comissão organizadora da 5ª Coferência Nacional das Cidades, participou neste final de semana dos debates realizados em Porto Alegre.

Carrion foi escolhido como um dos 83 delegados gaúchos da Conferência Nacional, que acontece em novembro, em Brasília. Durante o encontro, foi construído um texto base da conferência e o Plano Estadual de Habitação de Interesse Social (Pehis).

A discussão girou em torno dos quatro eixos temáticos da proposta: participação e controle social no Sistema Nacional de Desenvolvimento Urbano (SNDU); Fundo Nacional de Desenvolvimento Urbano (FNDU); instrumentos e políticas de integração intersetorial e territorial, e políticas de incentivo à implementação de promoção da função social da propriedade.

Confira artigo que Carrion preparou para o evento:

A INADIÁVEL REFORMA URBANA

No Brasil, milhões de homens e mulheres, expulsos do campo pelo latifúndio improdutivo, são lançados a cada ano na periferia das grandes cidades. Aí vivem com dificuldade de ter acesso a um trabalho digno e em condições precárias de habitação, saúde e educação.

Os governos neoliberais de Collor e FHC, que leiloaram as riquezas da nação, liquidaram com os direitos dos trabalhadores, arruinaram milhões de pequenos produtores e ampliaram o desemprego, agravaram ainda mais a miséria e a marginalização da maioria da população da periferia dos grandes centros urbanos.

Segundo o último censo, atualmente 84,4% da população – 160 milhões de brasileiros – vivem nas cidades, onde faltam moradias dignas para 17 milhões de famílias, sendo 5 milhões de déficit quantitativo (falta absoluta de moradia) e 12 milhões de déficit qualitativo (habitações inadequadas), segundo dados, de 2008, da Fundação João Pinheiro. A maioria sem esgoto, água tratada, luz e/ou recolhimento de lixo. Desse déficit, 90% está concentrado nas famílias com renda até 3 salários mínimos e 96,6% com renda até 5 salários mínimos, para as quais não existe qualquer possibilidade de solução via mercado imobiliário. No nosso Estado, o déficit quantitativo supera as 220 mil unidades e o déficit qualitativo é de mais de 600 mil unidades.

Assim como o latifúndio impera no campo – onde 1,7% dos proprietários possuem 52% das terras cultiváveis – nas cidades um punhado de especuladores monopoliza as terras urbanas. São os chamados vazios urbanos, mantidos sem uso, à espera de valorização pelos investimentos públicos (água, luz, esgotos, pavimentação, serviços públicos em geral), pagos pelo conjunto da população.

A consequência dessa monopolização das terras urbanas é o seu encarecimento em proporções fantásticas. O que se intensificou ainda mais com os enormes investimentos feitos pelos governos Lula e Dilma em habitação popular e com a explosão imobiliária gerada no país.

Assim, nas últimas décadas o custo da terra saltou de 10 a 15% do preço total da moradia para 30 a 40%. O preço exorbitante da terra urbana inviabiliza aos trabalhadores a aquisição de um terreno para a autoconstrução de sua moradia e onera enormemente os custos dos projetos públicos de habitação popular. Quanto ao mercado imobiliário privado, tem capacidade de produzir moradias (sem subsídios), apenas para famílias com renda superior a 10 salários mínimos (18% da população total e 0,6% do déficit habitacional do país), não atingindo sequer a maioria da classe média. Não tem, portanto, condições de produzir moradia para a população de baixa renda.

O resultado é a ocupação irregular e desordenada pelas camadas empobrecidas das terras ociosas públicas e privadas, inclusive áreas de preservação, nascentes dos rios e áreas de risco, comprometendo a qualidade ambiental e as condições de vida da maioria da população.

Some-se a isso a falência do BNH e do Sistema Nacional de Habitação, em 1986 – deixando o país durante 17 anos carente de qualquer política habitacional, o uso dos recursos do FGTS para a construção de imóveis de luxo ou para tapar rombos financeiros do governo federal, a liquidação da COHAB/RS pelo governo Britto, e teremos a explicação para o enorme déficit habitacional no Brasil e no Rio Grande do Sul. Essa situação só começou a ser enfrentada de forma mais ampla com a criação do Ministério das Cidades, em 2003, pelo governo Lula.

É preciso ter claro que essa terrível e injusta realidade urbana reproduz a lógica da sociedade capitalista e o chamado “livre mercado”. Uma lógica excludente e concentradora de renda, que desmente o discurso liberal ou neoliberal de que as “forças do mercado” são capazes de levar a uma sociedade equilibrada e justa. Ao contrário, o mercado capitalista nasce, ele mesmo, da desigualdade entre os que produzem e os que se apropriam, e reproduz de forma ampliada essa desigualdade.

Por isso, impõe-se a intervenção do Poder Público no sentido de regular o mercado fundiário e imobiliário, destinar recursos subsidiados para o saneamento básico e a produção de moradias para as camadas mais pobres da população e exigir o cumprimento da função social da propriedade – consagrada no artigo 182 da Constituição Federal e regulamentada no Estatuto da Cidade – que prevê, para as terras que não estejam cumprindo sua função social, o parcelamento e a edificação compulsórias, o IPTU progressivo no tempo e a desapropriação com títulos da dívida pública.

Ao lado dos graves problemas habitacionais e de saneamento, convivemos com uma grave crise do sistema de transporte público em nossas cidades – onde impera um modelo de transportes baseado no veículo individual –, causando enormes congestionamentos e perda de tempo nos deslocamentos (principalmente dos trabalhadores, que vivem nas periferias), altos índices de mortalidade por acidentes de trânsito – mais de 40 mil mortos, ao ano, e 120 mil vítimas com sequelas permanentes – e aumento da poluição. A preferência irracional pelo transporte individual faz com que dos 30 milhões de veículos existentes no país, 25 milhões sejam automóveis e apenas 120 mil sejam ônibus. E as altas tarifas obrigam hoje mais de 50 milhões de brasileiros a se deslocarem a pé nas grandes cidades.

Fica cada vez mais claro que a solução para a crescente deterioração dos grandes centros urbanos no Brasil é mais política do que técnica ou administrativa. O que se propõe é a aplicação de políticas que enfrentem a especulação imobiliária, exijam o cumprimento da função social do solo urbano, priorizem o transporte coletivo frente ao transporte individual e combatam a degradação ambiental.

Mas, a Reforma Urbana que queremos só se tornará realidade através da mobilização, organização e consciência daqueles que são os maiores interessados em mudar essa situação: os milhões de sem-teto, ocupantes, inquilinos, moradores das periferias das nossas cidades que lutam pelo sagrado direito de morar com dignidade, ter acesso aos serviços públicos essenciais e a um transporte público barato e de qualidade.

Por uma exitosa 5ª Conferência Estadual das Cidades, que contribua para fazer realidade seu lema:

REFORMA URBANA JÁ!
QUEM MUDA AS CIDADES SOMOS NÓS!

Deputado Estadual Raul Carrion