Flávio Sampaio: "o hip hop é o futuro da dança"

 Flávio Sampaio, coordenador do Porto da Dança, núcleo de formação do Centro Dragão do Mar de Arte e Cultura, fala sobre o projeto e sobre o potencial de Fortaleza como polo de referência de formação no Brasil.

Quando implantado, no início de 1999, o Colégio de Dança do Ceará representava o desejo de uma classe ávida por formação. Dirigido por Flávio Sampaio, à época bailarino do Theatro Municipal do Rio de Janeiro, o projeto seguiu até 2002, quando perdeu fôlego, mas não sem antes formar uma importante leva de intérpretes e coreógrafos que hoje atuam dentro e fora do País.

Onze anos depois, após criar e desenvolver em sua cidade natal, Paracuru, a Escola e a Companhia de Dança que são referências nacionais, Flávio retorna ao mesmo Centro Dragão do Mar que fomentou o antigo Colégio. Coordenador do programa de Dança do Porto Iracema das Artes, Flávio diz que tem um desafio pela frente, mas que está ansioso com o que pretende realizar.

Na última quarta, 16, estudantes e coreógrafos estiveram presentes na inauguração do Porto da Dança. O laboratório tem a finalidade de atender jovens entre 12 e 16 anos e destina-se também às comunidades do entorno do centro cultural. Outra atividade é o lançamento de mais uma turma do Curso Técnico em Dança, que segue na parceria IACC (Instituto de Arte e Cultura do Ceará), Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial) e Secult (Secretaria da Cultura do Estado); e inicia as aulas no próximo dia 28. Na entrevista a seguir, Flávio dá mais informações sobre o laboratório e diz por que acredita que o hip hop é o futuro da dança.

Como você avalia a atual formação em dança no Ceará?

Hoje somos referência nacional e por um fato bem simples: o Colégio de Dança estabeleceu uma maneira nova de ensino, que é o módulo à distância, com professores vindos de fora, onde avançamos muito. E esses avanços, a classe não pode perder. Hoje temos uma formação de base, uma formação técnica e uma faculdade. Agora se a gente não prestar atenção na produção, tudo isto se perde.

 Você tem contato com os egressos do Colégio de Dança?

A escola de dança mais linda que acho é da Funceb (Fundação Cultural do Estado da Bahia), de Salvador. Eles pegaram a negritude deles e meteram bronca. É lindo. Sabe quem está à frente? A Janahina Santos, daqui, que foi do Colégio de Dança. Temos também o Alysson (Amâncio) ali no Cariri, lindamente. Tudo isto é uma reverberação do Colégio de Dança. Existem outros artistas excelentes, que foram formados pelo Colégio e que hoje estão se perdendo, fazendo outras coisas porque não têm onde e como fazer, como circular, como levar ao público. Você viu o público da Bienal de Dança (na abertura, sexta, 18). Público nós temos. Nós só precisamos de um local para levá-los. Quero deixar isso claro porque assim que acabar a Bienal, vou procurar conversar com a classe toda. Tenho um projeto que se chama… É um Laboratório, mas eu não gosto de chamar de laboratório não, acho um nome muito pomposo.

No que consiste o projeto?

Flávio – Na quarta-feira, quando o Paulo Linhares (diretor do IACC) apresentou a Escola, ele falou de fazermos aqui um Centro Coreográfico. A ideia é oferecer um local físico onde a dança pode se encontrar para criar, para trocar, para ser feliz. E esse local precisa ser construído ontem. É uma ideia muito bacana e não é de todo cara. Estive na França visitando os Centros Coreográficos, que são uma boa referência, mas o que penso para o Ceará não tem nada a ver com eles. E a gente quer criar uma escola de danças urbanas. Claro que curso de hip hop tem um monte pelo país, mas queremos criar uma escola de formação e de pensamento, porque hip hop não é só uma dança, é uma ideologia.

Fortaleza vive um momento de efervescência do hip hop.

O movimento é grande e a gente quer, inclusive, reunir o pessoal do entorno (do Dragão do Mar), porque acho que o centro cultural é muito afastado do entorno. Arte e vida precisam se reencontrar. A Bete (Jaguaribe) está eufórica com este novo projeto. O Paulo (Linhares) também. É tudo que a gente quer: trazer a garotada pra escola e meter bronca. Agora a gente entraria com a formação com bastante calma, porque as danças urbanas levam um corpo que é muito especial. Então esta formação deve oferecer mais substância, sem tirar o que eles têm. Pelo contrário, sempre somando. Já me perguntaram aqui no Ceará qual é o futuro da dança. E eu disse: o hip hop.

Como você enxerga este estilo de dança?

O hip hop tem muitas coincidências com o balé clássico: nasceram de movimentos sociais – lógico que o balé clássico na nobreza e o hip hop veio do povo -, mas eles têm uma técnica formatada, uma linguagem de passos, uma linguagem estética, uma pedagogia desenvolvida. Então é o futuro. Muito mais do que a dança moderna, que alguns criadores começaram, fizeram o maior burburinho e quando a gente olha hoje, cadê? Quando a gente vê por aí esses grupos de hip hop é extasiante, uma coisa elétrica. O hip hop é, sem duvida, o seguimento cultural que mais cresceu no País.

A Bienal está pensando em sintonia com você, porque realiza na sexta, 25, uma conversa sobre Composição coreográfica em dança contemporânea a partir das danças urbanas.

Exatamente, estamos pensando a mesma coisa. Inclusive soube deste encontro. Muito legal. Só que eles estão pensando em algo mais coreográfico. Eu penso como formação. Partindo mais da base, como criar aquilo com mais essência, com mais potência, como fazer aquilo de forma mais profissional. É um desafio, mas o hip hop está no mundo inteiro, porque se adapta muito bem à cultura do lugar. Ele não é mais só uma coisa americana. É como o balé, que de francês não tem mais nada. É universal, você se apropria daquilo e faz do seu jeito. E o hip hop é isso. Outro dia encontrei com o Calé Alencar e perguntei como seria o encontro do hip hop com o maracatu. E ele disse: vamos fazer!

SERVIÇO

Mesa redonda com Rafael Guarato (“As danças urbanas e a cena contemporânea”) e Vanilton Lakka (“Danças urbanas e dança cênica”). Mediação de Paulo Caldas.
Quando: Sexta, 25, às 16 horas
Onde: Vila das Artes.
Outras informações: 3219 1959

Parabach – espetáculo da Paracuru Cia. de Dança
Quando: Sábado, 26, às 20 horas
Onde: Praça principal de Paracuru

Fonte: O POVO