Camponeses latino-americanos denunciam violações à CIDH

Cansados dos constantes conflitos, ataques e violações a seus direitos, camponeses latino-americanos representados pelo Centro de Estudos Legais e Sociais (Cels) e pela Coordenadora Latino-americana de Organizações do Campo (Cloc) foram à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em Washington, na última semana, para apresentar o estudo "Situação dos direitos econômicos, sociais e culturais (Desc) de camponeses na América Latina".

O documento denuncia a privatização de sementes, o acúmulo de terras, o uso abusivo de produtos químicos na agricultura e as investidas de empresas multinacionais contra a população camponesa, com o apoio de governos.

Em audiência realizada na sede da Organização dos Estados Americanos (OEA) as organizações rurais também denunciaram a criminalização do setor e defenderam a reforma agrária integral a fim de se alcançar uma verdadeira soberania alimentar com o uso de sementes nativas. Eles afirmaram que a violação de direitos humanos contra as populações camponesas da América Latina e Caribe é "padrão comum do continente” e tem "relação direta com as corporações transnacionais e o modelo de agricultura industrial”.

Segundo Diego Montón, integrante do Movimento Nacional Campesino Indígena (MNCI), quem participou da audiência em Washington, as sementes nativas cultivadas por gerações camponesas há anos, agora são alvos da ganância dos empresários que querem patenteá-las como se eles fossem os donos dessas criações da natureza. Ele também alertou sobre a intenção de o governo argentino criar uma lei que restringe o uso de sementes nativas, em claro favorecimento às sementes transgênicas produzidas por grandes transnacionais como a Monsanto, líder mundial do mercado de sementes geneticamente modificadas e de produtos agrotóxicos.

Para o camponês, a agricultura industrial apenas converte a comida em especulação financeira e promove a privatização e mercantilização dos alimentos. Montón ressaltou ainda que os povos têm direito à soberania alimentar, ou seja, a decidir qual é o seu sistema alimentar, e lembrou que são os camponeses, "com apenas um quarto das terras agrícolas”, os responsáveis pela produção de alimentos de "70% da população”.

O uso abusivo de agrotóxicos, que causa danos à saúde dos consumidores e, principalmente das populações do entorno das plantações, o êxodo rural, os agrocombustíveis e outras práticas que ferem a prática da agricultura saudável também foram denunciadas para a CIDH. "A agricultura industrial é este novo modelo tecnológico que as corporações transnacionais impulsionam, baseado no uso de sementes transgênicas, grandes quantidades de agrotóxicos e maquinarias, cujo principal objetivo é o lucro a partir da mercantilização dos alimentos, e sua incorporação nas dinâmicas especulativas dos mercados financeiros. Este tipo de agricultura e suas derivações, é o que se denomina ‘agronegócios’”, explica o informe, acrescentando que muitos conflitos e violações surgem do confronto entre indústria e camponeses.

Em virtude disso, o Cels e a Via Campesina solicitaram a CIDH reconhecer o campesinato como um ator social relevante na hora de analisar a situação dos direitos humanos na região e a incorporação permanente das problemáticas camponesas em sua agenda de trabalho. Pediram ainda a geração de canais de diálogo contínuo com comunidades camponesas da América Latina e Caribe, a possibilidade de fazer diagnósticos sobre a situação dos direitos à alimentação e ao território que permitam fazer recomendações aos Estados, e uma análise sobre o papel das empresas transnacionais na violação dos direitos fundamentais dos camponeses, já que a violência no setor chama a atenção, sobretudo, em Honduras, Paraguai e Colômbia.

Fonte: Adital