“Movimentismo”, Estado e Luta pela Hegemonia: Notas sobre BH
Por Sérgio Danilo Miranda Rocha*
É no âmbito do Novo Projeto Nacional e seu desenvolvimento que se põe efetivamente a questão da sociedade civil. Fora daí, ela não faz muito sentido ou, tem um sentido estreito limitado.
Publicado 09/12/2013 17:21 | Editado 04/03/2020 16:49
Precisamos de uma perspectiva que não só valorize a sociedade civil e celebre seu crescente protagonismo, mas também colabore para politizá-la, libertando-as das amarras reducionistas e repressivas dos interesses particulares, aproximando-a do universo mais rico e generoso dos interesses gerais, da hegemonia, em uma palavra, do Estado.
Não é difícil constatar que estamos hoje sedados por uma sedução: a de que, diante da alardeada “falência” da política, tudo melhoria se jogássemos as fichas na ativação da pureza associativa dos movimentos sociais e das formas mais espontâneas ou “naturais”de expressão da vida comunitária. O ativismo civil funcionaria, assim, como uma espécie de fonte geradora de energia com a qual se neutralizariam as maldades do sistema político.
Por detrás de tudo, uma visão dicotômica das relações entre Estado e sociedade civil que em vez de serem vistas como estruturadas por uma conexão materialista de unidade e distinção, como diria, dentre outros, Gramsci, ganhariam a imagem de uma disjunção, de uma separação, de uma ausência de comunicação. Sataniza-se o espaço político para dar livre curso a uma hipotética natureza virtuosa da sociedade civil.
A sociedade civil que emerge dessa visão é despolitizada: não dispõe como um espaço de organização de subjetividade, no qual pode ocorrer a elevação política dos interesses corporativos ou, em outros termos, “uma prática”, a passagem dos interesses do plano “egoístico-passional”para o plano “político”, fato que, por sua vez, pressupõe a configuração dos grupos sociais como sujeitos de pensamento, vontade e ação, capacitados para se universalizarem, ou seja, saírem de si, se candidatarem à direção do corpo social.
Gramsci diria que os sujeitos sociais candidatam- se à dominação e à hegemonia na medida em que “se tornam Estado”. Sem Estado ( sem uma ligação com o Estado e sem uma perspectiva de Estado), não há sociedade civil digna de atenção: sem Estado não pode haver hegemonia.
Nenhuma sociedade civil é imediatamente política. Sendo o mundo das reivindicações, dos particularismos, da defesa muitas vezes egoísta e encarniçada de interesses parciais, sua dimensão política precisa ser construída. O choque, o confronto e as lutas entre os diferentes grupos, projetos e interesses funcionam como os modais decisivos da sua politização. É dessa forma – ou seja, como espaço político – que a sociedade civil vincula-se ao espaço público democrático e pode funcionar como base de uma disputa hegemônica e de uma oposição efetivamente emancipadora, progressista e democrática às estratégias de dominação referenciadas pelo rentismo e o cosmopolitismo.
Os anos 80 e 90 o voto democrático e progressista de uma aliança ampla de camadas de classes trabalhadoras e setores médios possibilitou uma variada gama de vitórias; mas sedados pela ilusão; dos interesses progressistas e democráticos, “permanentes”, “intrínsecos” dos setores médios e que só a partir deles é que se polarizam a opinião publica democrática da cidade, tal ilusão fabricada teve um corte em todo o país em 2006, mas em 2010 se inaugura um novo tempo político em Belo Horizonte.
O desafio concreto é partir desta realidade em curso, sem nostalgias paralizadoras, que nas condições do tempo presente tem um polo de força em “um campo heterogêneo e distendido” e a partir dele espraiar um novo pacto progressista para todos os níveis e setores da cidade.
Tal movimento é um único capaz de ser caixa de ressonância de interesses democráticos orientado por um rumo progressivo de renovação da cultura política da nossa cidade, confrontando os particularismos e arroubos niilistas encobertos com ilusórias saltos metafísicos na dinâmica concreta da luta por um novo rumo avançado para Belo Horizonte.
*Sérgio Danilo Miranda Rocha é Historiador, Secretário Geral da Sessão Mineira da Fundação Maurício Grabois e Secretário de Formação do PCdoB Minas.