Série da TV Brasil mostra que 1964 foi um golpe na democracia

Foi há 50 anos, mas as marcas do golpe militar, que deu na ditadura de 1964 a 1984, seguem vivas na memória – e na pele – de muitos brasileiros. O cerco político sofrido pelo então presidente da República, João Goulart (Jango), e detalhes da repressão, na cidade e no campo, foram contados pelo programa Caminhos da Reportagem, da TV Brasil, nesta quinta-feira, no primeiro episódio da série "1964 – Um Golpe na Democracia".

O filho de Jango, João Vicente Goulart, falou sobre o dia que mudou os rumos do país, sob a perspectiva de um garoto de sete anos à época. “Nós saímos às pressas da Granja do Torto, havia muita movimentação, muitas pessoas entravam e saíam, muita circulação de informações”. Foram as últimas horas de João Vicente e de seu pai no Brasil. “Dormimos uma noite numa fazenda, no Rio Grande do Sul (…) no outro dia, o avião grande da Presidência da República foi embora, e de manhã chegou um aviãozinho, que nos levou até o Uruguai, com o piloto particular do papai”.

A mudança de rumos no Brasil era acompanhada de perto pelos Estados Unidos, que tinham medo de um levante comunista na América do Sul. Apoiando o golpe militar, navios estadunidenses estavam na costa brasileira, caso fosse necessária uma intervenção. “O envio da frota, estima-se que tenha sido a maior movimentação no Hemisfério Sul desde a 2ª Guerra. Foi para desestimular qualquer tipo de reação”, explicou o historiador Virgílio Arraes.

A reportagem do programa também ouviu ex-militantes da época, militares, e mostrou que a repressão estendeu-se além das cidades. No campo, cidadãos que lutavam pela reforma agrária e pelos direitos dos trabalhadores, como Pedro Fazendeiro e Margarida Maria Alves, foram calados com violência. “Em Sapé [interior da Paraíba], muitas vezes a casa da gente era cercada de madrugada. O Exército dava batida. Quando a gente abria as portas, a casa estava cercada”, contou Josineide Araújo, filha de Fazendeiro.

Arimatéria Alves, filho da camponesa Margarida Maria Alves, assassinada em 1983, que inspirou a Marcha das Margaridas, disse que a mãe recebia ameaças constantes. “Ela recebia muitas ameaças de morte. Uma vez meu pai me disse que minha mãe estava muito triste (…) e perguntou para ela 'Filhinha, o que você tem?' Ela disse 'Filhinho, eu vou morrer. Eu só não sei o dia e nem a hora, mas eu vou morrer'”. A Marcha das Margaridas continua a luta por melhores condições de vida e trabalho para as mulheres do campo.

No auge da repressão, até mesmo militares foram vítimas. Ao Caminhos da Reportagem, o ex-militar da Força Aérea Brasileira (FAB), José Bezerra, contou que foi torturado, internado e compulsoriamente reformado depois de se opor ao tratamento que vira o estudante Stuart Angel, até hoje considerado desaparecido político, sofrer na mão dos colegas.

“Eu fiquei doente depois, tentei manter um período de trabalho. Em um determinado dia fui encontrado em um sanatório de Correias, em Petrópolis. Eu estava no hospital, era de manhã cedo e eu não sabia como tinha ido parar lá. E tem um detalhe: outros militares que se opunham a essa tirania foram internados como doentes mentais”.

Os dois próximos episódios da série "1964 – Um Golpe na Democracia" serão exibidos nos dias 27 de março e 3 de abril, e vão contar como a ditadura influenciou as artes no Brasil e quais foram as heranças do golpe.

Fonte: Agência Brasil