Países europeus submetem-se ao direito bancário dos Estados Unidos

Alemanha, Reino Unido, França e Bélgica são os Estados da União Europeia que já aceitaram aplicar no seu território uma lei norte-americana alegadamente contra a fraude fiscal e que permite a afirmação do direito dos Estados Unidos da América sobre o direito europeu no espaço da União.

Por Pilar Camacho, de Bruxelas para o Jornalistas sem Fronteiras

EUA lobbies grupos de pressão - DailyTech

Em causa está a lei norte-americana designada Foreign Account Tax Compliance Act (Facta, Ato de Conformidade de Impostos de Conta Estrangeira) que, ao ser aceite por governos europeus, impõe aos estabelecimentos financeiros dessas nações o envio, para os Estados Unidos, de dados pessoais dos seus clientes com nacionalidade norte-americana.

“Não está em causa a luta contra a fraude fiscal, nem nada semelhante, como agora alegam puristas do respeito pelas obrigações fiscais, muitos dos quais só agora descobriram essa vocação”, afirma Louis Martin, advogado belga. “O problema é o respeito pelo princípio da soberania e, em termos genéricos, o respeito pela lei”, acrescenta.

Martin sublinha que a aplicação dessa lei em territórios de países europeus viola as leis nacionais sobre proteção de dados pessoais e também uma Diretiva Europeia de 1995 relacionada com a “proteção de pessoas físicas quanto ao tratamento de dados de caráter pessoal e à livre circulação desses dados”.

“Como se percebe”, afirma Louis Martin, “a prática de países da União Europeia ao submeter-se a leis de uma nação estrangeira, neste caso os Estados Unidos, não viola apenas leis desses países, mas também leis europeias”.

Existem já várias situações em que os dados dos cidadãos europeus não são defendidos da apropriação pelos Estados Unidos, como por exemplo as informações bancárias através do sistema BIC/Swift e também o acesso norte-americano aos elementos pessoais constantes das listas de passageiros aéreos que saiam de aeroportos europeus.

Segundo a opinião do jurista belga, estas práticas legislativas não suprimem as leis europeias, mas suspendem-nas.

“Por estes comportamentos podemos ver o que se prepara através do chamado acordo de comércio livre entre a União Europeia e os Estados Unidos” (TTIP), afirma María Concha Martínez, assessora no Parlamento Europeu. “Com leis europeias suspensas, na prática, ficaremos indefesos perante produtos norte-americanos de qualidade duvidosa para a saúde pública, como é o caso dos transgênicos, carne e derivados de animais alimentados com essas matérias geneticamente modificadas”, acrescentou.

“Leis europeias que nasceram de tanta discussão e elaboração de estudos no sentido de defender os cidadãos podem agora ser ultrapassadas e invalidadas à revelia desses mesmos cidadãos”, segundo María Concha Martínez.

Fonte: Jornalistas sem Fronteiras